| Processo: | Agravo de Instrumento nº 2011.014663-0 |
| Relator: | Luiz Cézar Medeiros |
| Data: | 13/01/2012 |
Agravo de Instrumento n. 2011.014663-0, da Capital
Relator: Des. Luiz Cézar Medeiros
ADMINISTRATIVO
- AÇÃO CIVIL PÚBLICA - IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA - INDÍCIOS
SUFICIENTES A JUSTIFICAR O RECEBIMENTO DA PETIÇÃO DA INICIAL -
SUPREMACIA DO INTERESSE PÚBLICO
"O Superior
Tribunal de Justiça tem firme posicionamento no sentido de que,
existindo indícios de cometimento de atos enquadrados na Lei de
Improbidade Administrativa, a petição inicial deve ser recebida, ainda
que fundamentadamente, pois, na fase inicial prevista no art. 17, §§ 7º,
8º e 9º, da Lei n. 8.429/92, vale o princípio do in dubio pro
societate, a fim de possibilitar o maior resguardo do interesse público" (AgRg no AREsp n. 3030, Min. Mauro Campbell Marques).
Vistos,
relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento n.
2011.014663-0, da comarca da Capital (Unidade da Fazenda Pública), em
que é agravante Augusto Cesar Hinckel, e agravado o Ministério Público
do Estado de Santa Catarina:
A Terceira Câmara de Direito Público decidiu, por votação unânime, negar provimento ao recurso. Custas na forma da lei.
Participaram
do julgamento, realizado no dia 29 de novembro de 2011, os
Excelentíssimos Senhores Desembargador Luiz Cézar Medeiros,
Desembargador Pedro Manoel Abreu e Desembargador Carlos Adilson Silva.
Florianópolis, 30 de novembro de 2011.
Luiz Cézar Medeiros
Presidente e relator
RELATÓRIO
Augusto
Cesar Hinckel interpôs agravo de instrumento em face da decisão
proferida pelo Juízo da Unidade da Fazenda Pública da Comarca da
Capital, nos autos da Ação Civil Pública n. 023.10.018242-1, que, ao
identificar a existência de indícios suficientes da prática de ato de
improbidade administrativa, recebeu a petição inicial.
Na busca pela reforma da decisão, em síntese, sustentou: a) "da
simples leitura da exordial não é possível extrair a presença de culpa
ou mesmo má-fé do Agravante porquanto todo o processo de inexigibilidade
de licitação para a contratação da empresa Beyondpar foi amparada por
parecer jurídico (fato este incontroverso) emanado pela Assessoria
Jurídica da Secretaria Municipal de Turismo, o que comprova a boa-fé do
ora Agravante" (fl. 6); b) "incontroverso, também, que toda a
negociação com a empresa Beyondpar (detentora dos direitos do Maestro
Andréa Bocelli no Brasil), conforme reiteradamente anunciado na
exordial, foi realizada pelo então Secretário Municipal de Turismo,
Cultura e Esportes (Sr. Mário Roberto Cavallazzi) e pelo Secretário
Adjunto (Sr. Aloysio Machado Filho), o que demostra, sem sombra de
embargos, a ausência da participação do ora Agravante nas referidas
negociações" (fl. 6); c) "inexiste nos autos qualquer indício de
má-fé ou dolo por parte do Agravante que, conforme descrito na exordial e
afirmado pela decisão agravada, foi somente o responsável pela abertura
e gerenciamento de conta bancária na qual seria destinado o dinheiro
advindo do Governo do Estado para custeio do show do Maestro Andréa
Bocelli" (fl. 8); d) "prova do aqui alegado é o fato do Tribunal
de Contas do Estado de Santa Catarina, no processo LCC-09/00654848, que
tratou do assunto referente ao contrato firmado para o Show do Maestro Italiano Andrea Bocelli,
ter concluído pela responsabilidade exclusiva dos Réus Aloysio Machado
Filho e Maria Roberto Cavallazzi, isentando o ora Agravante e o Prefeito
Municipal, Sr. Dário Elias Berger, de qualquer culpa na contratação e pagamentos feito a empresa Beyondpar, conforme se colhe da Decisão n. 4735/2010" (fl. 8); e) "as formas de pagamento não foram estipuladas pelo ora Agravante, tampouco pelo Prefeito Municipal, Sr. Dário Elias Berger, mas sim pela empresa contratada e pelos Srs. Mário Roberto Cavallazzi e Sr. Aloysio Machado Filho" (fl. 15).
O almejado efeito suspensivo restou indeferido pela decisão de fls. 2.348 a 2.353.
O agravado deixou transcorrer in albis o prazo para o oferecimento de contraminuta (fl. 2358).
A douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parece da lavra do Doutor Paulo Cezar Ramos de Oliveira, manifestou-se "pelo conhecimento e total desprovimento do recurso interposto por Augusto Cesar Hinckel, mantendo-se in totum a decisão hostilizada, por seus próprios e judiciosos fundamentos" (fl. 2365).
VOTO
1 De acordo com o previsto no art. 17, § 8º, da Lei n. 8.429/92, somente é possível a rejeição, ab initio, da petição inicial, se o Juiz estiver "convencido da inexistência de ato de improbidade administrativa, da improcedência da ação ou da inadequação da via eleita".
Justamente diante da redação do aventado preceito legal, "o Superior Tribunal de Justiça tem firme posicionamento no sentido de que, existindo indícios de cometimento de atos enquadrados na Lei de Improbidade Administrativa, a petição inicial deve ser recebida, ainda que fundamentadamente, pois, na fase inicial prevista no art. 17, §§ 7º, 8º e 9º, da Lei n. 8.429/92, vale o princípio do in dubio pro societate, a fim de possibilitar o maior resguardo do interesse público" [grifou-se] (AgRg no AREsp n. 3030, Min. Mauro Campbell Marques, j. 9.5.2011).
Passa-se, pois, à análise da existência, in casu, de indícios suficientes a justificar o recebimento da pretensão deduzida em juízo pelo representante do parquet,
já que o agravante, em linhas gerais, sustenta a ausência de culpa,
dolo e mesmo de má-fé nos atos a eles reputados na petição inicial.
1.1 O Ministério Público do Estado de Santa Catarina ajuizou "ação civil pública por atos de improbidade administrativa com requerimento de indisponibilidade de bens" contra Dário Elias Berger,
Augusto Cézar Hinckel, ora agravante, Mário Roberto Cavallazzi, Aloysio
Machado Filho, Daniela Gomes Silva Santos Secco, Ricardo Botelho
Valente, Waldemar Stefan Barroso e Beyondpar Assessoria e Marketing
Ltda., almejando a declaração da "nulidade do Procedimento de
Inexigibilidade de Licitação n. 385/SMAP/DLC/2009 e, consequentemente,
do Contrato n. 942/SETUR/2009, com a condenação dos requeridos" "nas
sanções previstas no inciso II do art. 12 da Lei n. 8.429/92, ou,
subsidiariamente, nas penas do inciso III do mesmo dispositivo, nas
despesas processuais e demais verbas de sucumbência" (fls. 104 e 105).
O objeto do procedimento de inexigibilidade de licitação foi o show do
tenor italiano Andrea Bocelli, que seria realizado no final do mês de
dezembro de 2009.
O Parquet fundamentou sua
pretensão posta em juízo nos seguintes fatos: a) o Município de
Florianópolis, em 28.8.2009, representado pelo então Secretário de
Turismo, Mário Roberto Cavallazzi, teria contratado sem licitação a
empresa Beyondpar para a realização e produção do espetáculo de Andrea
Bocelli e Orquestra, que seria realizado na Avenida Beira-Mar Norte, em
única apresentação, entre os dias 21 de novembro a 31 de dezembro de
2009; b) os requeridos Mário Cavallazzi, Aloysio Machado Filho e Daniela
Secco teriam justificado a contratação direta da Beyondpar no fato de
esta deter a exclusividade para promover o show do tenor, com fundamento
no art. 25, III, da Lei n. 8.666/93, enquanto o Ministério Público
aduziu ser irreal a dita exclusividade afirmada pelos sócios da
Beyondpar; c) "além de não atestar a exclusividade exigida em lei
para se admitir a contratação sem licitação, os agentes públicos Mário
Roberto Cavallazzi, Aloysio Machado Filho e Daniela Secco aceitaram como
válido e existente um contrato redigido em língua inglesa e que
continha somente a assinatura dos contratantes", ou seja, "intencionalmente,
cientes da ilegalidade, todos deram causa a uma contratação sem
licitação no valor de três milhões de reais com base em um documento não
assinado, acerca do qual não se asseguraram sobre a sua real existência
e, ainda, que não demonstrava em absoluto a condição de empresária
exclusiva na qual se fundamentou a inexigibilidade de licitação" (fl. 77); d) "o
Município de Florianópolis não detinha e nem deteve posteriormente o
documento válido - assinado pelas partes -, que somente foi remetido ao
Ministério Público pela empresa Beyondpar. Com isso, além de
inadmissível a contratação da empresa naqueles termos, o pagamento das
parcelas do contrato era inaceitável, o que, mesmo assim, foi autorizado
pelos demandados Dário Elias Berger e Augusto Hinckel" (fl. 77); e) "a
ausência de comprovação do agenciamento exclusivo do cantor italiano
pela Beyondpar demonstra, mais uma vez, a prévia vontade que tinha o
requerido Mário Roberto Cavallazzi de privilegiar a empresa - com o que
anuíram os demandados Dário Elias Berger,
Augusto Cézar Hinckel, Daniela Secco e Aloysio Machado Filho -
permitindo que o Município de Florianópolis firmasse compromisso
extremamente oneroso sem a plena garantia do cumprimento dos requisitos
legais" (fl. 79); f) apesar de expressamente previsto no contrato,
que o desembolso da primeira parcela devida pelo ente municipal
dar-se-ia após a formalização do contrato com o artista, o respectivo
pagamento foi efetuado antecipadamente sem que o referido contrato fosse
apresentado; g) houve o "surpreendente repasse de R$ 200.000,00
(duzentos mil reais) antes de 1º.10.2009 - data da suposta assinatura do
contrato com o cantor - e como forma de antecipação de pagamento, sem
qualquer fundamento razoável, em flagrante desrespeito ao art. 65, II,
'c', da Lei n. 8.666/93" (fl. 80); h) "totalizou-se o ilegal e indevido repasse de R$ 2.500.000,00 (dois milhões e quinhentos mil reais) à empresa Beyondpar" (fl. 81); i) "no
contrato não há previsão de devolução das parcelas pagas no caso de
descumprimento das obrigações assumidas (Cláusula Sétima, fls.
139/1401-IC), nem mesmo a prestação de garantia, conforme orienta o art.
56 da Lei n. 8.666/93" (fl. 81).
O autor
sustentou ainda que Aloysio Machado Filho, na qualidade de Secretário
Adjunto de Turismo, teria elaborado o Termo de Inexigibilidade de
Licitação n. 385/SAMP/DLC/2009. Asseverou que a falsa condição de
empresária exclusiva da Beyondpar teria sido garantida por Daniela Secco
[então assessora jurídica da Secretaria de Turismo], afiançada por
Mário Cavallazzi e reafirmada por Aloysio Machado Filho.
Arrematou
que Mário Roberto Cavallazzi, Aloysio Machado Filho e Daniela Secco
teriam sido responsáveis pela contratação da empresa, enquanto Dário Elias Berger e Augusto Cesar Hinckel, ora agravante, teriam sido os ordenadores das despesas.
Relatou, outrossim, que, apesar de ter-se adiantado irregularmente o pagamento de dois milhões e quinhentos mil reais, "poucos
dias antes da data prevista para o show, o requerido Mário Roberto
Cavallazzi expediu Ofício n. 813/09 à empresa Beyondpar informando que, 'por
determinação judicial, a Prefeitura de Florianópolis estaria impedida
de efetuar pagamentos vincendos à empresa responsável pela montagem e
operacionalização das estruturas de palco, camarins, área vip e todo o backstage necessário ao atendimento das especificações técnicas exigidas pelo maestro' " (fl. 82).
Afirmou
o Ministério Público, contudo, que a determinação judicial referida
diria respeito à Ação Cautelar n. 023.09.079742-9, a qual teria suspenso
os pagamentos decorrentes do Contrato n. 1056/2009 à empresa Palco Sul
Eventos Ltda. (fls. 372/381-IC) (fls. 82 e 83). Aditou, ainda, que a
Palco Sul informou-lhe não ter sido contratada pelo Município de
Florianópolis para realizar a construção, montagem e desmontagem de
palco para qualquer evento ou para o show do tenor italiano Andrea
Bocelli.
O autor aduziu que constaria do contrato da Beyondpar que esta é quem seria a "responsável
pela montagem do palco e dos camarins, em virtude de exigência
contratual especificada pela empresa Pentagon Music Management Limited", que representaria os interesses do artista (fl. 83).
Acrescentou que "o
então Secretário Municipal de Turismo, ao atribuir falsamente ao
próprio Município a responsabilidade pela execução do palco e
argumentando a impossibilidade de fazê-lo, pretendeu mais uma vez
beneficiar a empresa, desonerando-a da obrigação pactuada, livrando-a de
possível ressarcimento dos valores até então pagos. E mais! Tal
conclusão mostra-se evidente quando observado que a Beyondpar já havia
descumprido o contrato na data da pretensa comunicação do show
(19.12.2009), pois nem sequer havia dado início à montagem do palco,
enquanto o prazo era de vinte dias antes do evento (Cláusula 3.2, fl.
138-IC), agendado para 28.12.2009" (fls. 84 e 85).
O
prejuízo também seria vultoso, porquanto conforme o disposto na
cláusula sétima do Contrato de Apoio Financeiro entabulado com o Estado
de Santa Catarina, "o Município de Florianópolis é, de fato, o
verdadeiro prejudicado com a conduta ímproba dos Demandados, pois,
apesar de não retirar os dois milhões e quinhentos mil reais de seus
cofres, é obrigado, por previsão contratual, a devolver os valores
recebidos do erário estadual" (fl. 86).
Quanto aos gastos, assim manifestou-se o autor: "a
documentação, recebida em 22.1.2010 (fls. 246/250-IC), foi organizada
no Anexo 2 do Inquérito Civil e submetida à análise pelo Setor de Apoio
Técnico - Perícias, Cálculos e Auditorias (SEAUD) do Ministério Público,
que assim concluiu: '[...] o total de despesas relacionadas ao show
foi de R$ 3.000.925,93, sendo R$ 1.778.931,09 comprovadas, R$
700.301,58 não comprovadas, e R$ 521.720,26 ainda não realizadas' (fl. 330-IC)" (fl. 87).
Concluiu o Parquet:
"Cabe
questionar, também: o gasto de mais de quinhentos mil reais para
transportar o cantor lírico para uma única apresentação pública respeita
o interesse público e a probidade administrativa? Esse valor poderia
ser mais bem aproveitado para promover de outras maneiras o Turismo, a
Cultura e o Esporte no Município?
"Com as
respostas, aliás, chega-se à lógica conclusão de que - além de ilegal,
imoral e praticada com desvio de finalidade - a contratação de três
milhões de reais promovida pelo então Secretário Municipal de Turismo,
Cultura e Esporte - e abraçada pelos demais Demandados - foi inoportuna e
inconveniente, existindo, com o único fim de privilegiar interesses
particulares" (fl. 92).
Diante dos fatos narrados,
entendeu o autor que as condutas descritas na petição inicial,
inclusive aquelas reputadas ao agravante, são enquadráveis no art. 10, caput,
e incs. I, VIII e XII, da Lei n. 8.429/92, o que justificaria o
recebimento da petição inicial com o regular processamento do feito e a
consequente condenação dos demandados nas sanções previstas no inc. II
do art. 12 do referido diploma legal.
1.2 A
análise, em cognição sumária, acerca dos documentos acostados à petição
inicial da presente ação civil pública e a presença de indícios de
ilegalidade já foi realizada por este Órgão Fracionário por ocasião do
julgamento do Agravo de Instrumento n. 2010.025172-5. Na oportunidade,
sustentei:
"3 Da análise dos documentos constantes dos autos, verifica-se, em ordem cronológica, que: a) em 6.8.2009
a Pentagon Music Management Limited - agência que representa Andrea
Bocelli em eventos internacionais - por meio de carta, declarou que a
partir dessa data a Beyondpar era o único parceiro e responsável por
toda a produção do show do artista a se realizar em dezembro de 2009 em
Florianópolis, bem como para continuar com o projeto necessitaria de um
adiantamento mínimo de um milhão de dólares (fls. 182 e 397); b) foi
juntada às fls. 403 a 439 a tradução pública do pré-contrato referido na
carta e celebrado entre a Beyondpar e a Pentagon. Constaria neste
documento que o contrato dataria de 1º.7.2009; vigeria entre 1º.7.2009 e 31.12.2009; c) em 27.8.2009
foi expedido Termo de Inexigibilidade de Licitação para produção do
show de Andrea Bocelli no valor de R$ 3.000.000,00 (fls. 260 a 267), que
foi publicado no dia seguinte no Diário Oficial do Município (fls. 62 e 63); d) em 28.8.2009,
foi celebrado contrato entre o Município de Florianópolis e a Beyondpar
para a realização da apresentação de Andrea Bocelli (fls. 195 a 200);
e) em 31.8.2009, o Secretário Municipal de Turismo pleiteou ao
Secretário de Estado da Cultura, Turismo e Esporte a liberação de R$
3.000.000,00 a serem aplicados no planejamento e na consecução do Show
Internacional do Maestro Andrea Bocelli - Natal 2009 (fl. 127); f) em 11.9.2009
foi publicado no Diário Oficial do Município o extrato do contrato
celebrado com a Beyondpar para a realização do referido evento (fl. 64);
g) o contrato de apoio financeiro firmado entre o Município de
Florianópolis e o Estado de Santa Catarina foi celebrado em 24.9.2009
(fls. 167 a 172) e seu extrato foi publicado no Diário Oficial do
Estado em 25.9.2009 (fl. 201); h) há empenho no valor de R$ 2.500.000,00
juntado às fls. 173 e 174); i) há tradução pública do contrato firmado
entre a Beyondpar e Andrea Bocelli para a realização de show em
Florianópolis em 28.12.2009 às fls. 208 a 225.
"O
primeiro pagamento efetuado à Beyondpar foi efetuado após a celebração
do contrato do Município de Florianópolis com ela, no valor de duzentos
mil reais em 18.9.2009 (fl. 292) e pouco antes da contratação direta da
empresa com Andrea Bocelli (1º.10.2009 - fls. 208 a 225).
"Está
claro, portanto, que de fato somente a Beyondpar poderia promover no
Brasil no período de 1º.7.2009 a 31.12.2009 o show de Andrea Bocelli.
Essa exclusividade, contudo, adveio como consectário contratual,
relacionado tão somente ao show a ser realizado em Florianópolis em
dezembro de 2009. Da leitura do pacto, depreende-se com facilidade que o
seu objeto é uma única apresentação de Andrea Bocelli, em show público
no Brasil em dezembro de 2009, conforme consta expressamente nas
considerações iniciais, item C do pré-contrato traduzido à fl. 403.
"Eis
a razão da exclusividade concedida à Beyondpar pelos seis meses
anteriores à data prevista para o show. Considere-se que essa avença é
razoável, uma vez que seria um risco grande para o empresário investir
num evento dessa magnitude sem a garantia de que somente ele teria o
direito de promover o show até a data estipulada. Se assim não fosse, a
realização da mesma apresentação próximo da data por ele ajustada
poderia diminuir-lhe o faturamento ou até comprometer o sucesso de seu
evento.
"Ademais, em face dos gastos que envolvem a
produção relacionada à apresentação de um artista reconhecido
internacionalmente, não seria aceitável que a Beyondpar arcasse com
todas as despesas de viagem para que outro promotor realizasse o mesmo
evento com custos reduzidos, pelo fato de toda a equipe do artista já se
encontrar no país. É possível ponderar que essa seja uma das razões
pelas quais, durante o período estipulado no pré-contrato, seja
concedida a exclusividade de promoção do show de Andrea Bocelli à
Beyondpar.
"Frise-se, porém, que essa situação em
específico não justifica a inexigibilidade de licitação. Atentando à
cronologia dos fatos, por ora não há como se refutar a possibilidade de a
Beyondpar ter iniciado as negociações com a agente de Andrea Bocelli
motivada exclusivamente no interesse de o Município de Florianópolis
promover o show do artista em dezembro de 2009.
"Não
foi demonstrado a contento, portanto, pelo menos em sede de cognição
sumária, que a exclusividade na contratação do artista não estaria
relacionada ao interesse do Município de Florianópolis. Não há como
sustentar, por conseguinte, que a exclusividade estipulada em contrato
com a Pentagon seja suficiente para a inexigibilidade da licitação.
"A
aparência que se tem por ora, é de que ao invés de se abrir licitação
para a contratação de promotores que pudessem trazer Andrea Bocelli ao
Brasil, o Município de Florianópolis iniciou os contatos informalmente e
formalizou o contrato depois de já ter decidido com qual empresa iria
pactuar a produção do evento. Talvez por esse motivo é que no momento em
que foram iniciados os procedimentos administrativos necessários a
Beyondpar já detinha a exclusividade para a realização do evento em
questão.
"Ressalte-se que para fundamentar
esse entendimento, tem-se a inquestionável cronologia dos fatos.
Veja-se: as negociações entre a Beyondpar e Pentagon para a realização
de um show PÚBLICO em Florianópolis em dezembro de 2009 iniciou-se em meados de junho de 2009 (minuta do pré-contrato da Beyondpar com a Pentagon data de 1º.7.2009); foi formalizado em 6.8.2009 (conforme carta remetida pela Pentagon pleiteando adiantamento), sendo que em seguida (27 e 28.8.2009)
o ente municipal expediu Termo de Inexigibilidade de Licitação e também
entabulou contrato com a Beyondpar para promover o show de Andrea
Bocelli.
"Destaque-se, por fim, que diante desses robustos indícios, caberia à empresa ou ao ente municipal demonstrar de que outra forma poderia a promotora ter conhecimento do interesse do Município de Florianópolis em promover um show PÚBLICO especificamente com Andrea Bocelli e exatamente
em dezembro de 2009, conforme consta do pré-contrato datado de
1º.7.2009, celebrado pouco antes da abertura do procedimento de
inexigibilidade de licitação. Caberia aos requeridos o ônus de comprovar
tão grande coincidência, porquanto os indícios fundados nos expressos
termos dos pactos juntados aos autos demonstram claramente a existência
de pré-negociação antes da abertura do procedimento administrativo
pertinente.
"3.1 Ademais, se isso não
bastasse, há de se considerar que o levantamento contábil aferido pelo
Ministério Público aponta a disparidade de gastos não comprovados de R$
700.301,58 (fls. 41 e 42).
Assim, a
ausência de comprovação da aplicação do valor adiantado pelo ente
municipal em despesas para a execução do objeto do contrato é mais um
fundamento a subsidiar o deferimento de indisponibilidade dos bens dos
requeridos" (grifou-se).
Nota-se, pois,
conforme o exaustivamente explicitado no supramencionado julgado, a
existência de fortes indícios de ilegalidade e de afronta aos princípios
que norteiam a Administração Pública a referendar o recebimento da
petição inicial, mesmo em relação ao agravante.
Afinal,
na forma alegada pelo próprio insurgente - fato que se tornou,
portanto, incontroverso nos autos -, dúvidas não há de que ele foi um
dos responsáveis pela abertura e gerenciamento da conta bancária na qual
seriam destinados os valores provenientes do Governo do Estado de Santa
Catarina. Está, pois, diretamente ligado com os fatos narrados na
petição inicial e reputados por ilegais.
Ademais,
mesmo que se pudesse cogitar acerca da ausência de participação do
insurgente nas pré-negociações com a empresa Beyondpar, isso não tem o
condão de simplesmente afastar, de plano, a sujeição do recorrente na
presente ação civil pública, porquanto, nos termos das condutas
descritas no supramencionado art. 10 da Lei n. 8.429/92, o simples fato
de o réu "permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça ilicitamente"
[grifou-se] (art. 10, inc. XII) já é o suficiente para configurar o ato
de improbidade administrativa a justificar o prosseguimento do feito.
Claro que, na esteira do entendimento consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça, considera-se "indispensável,
para a caracterização de improbidade, que a conduta do agente seja
dolosa, para a tipificação das condutas descritas nos artigos 9º e 11 da
Lei 8.429/92, ou pelo mesmo eivada de culpa grave, nas do artigo 10" ´[grifou-se] (AIA n. 30/AM, Min. Teori Albino Zavascki, j. 21.9.2011).
Deve-se,
contudo, possibilitar ao demandante, diante do farto suporte probatório
inicialmente acostado à petição inicial, a plena comprovação do
aventado elemento subjetivo da conduta do agente durante o regular
processamento do feito, de modo a configurar a prática de atos de
improbidade administrativa.
Nesse passo, andou bem o Magistrado a quo ao receber a petição inicial.
2 Ante o exposto, nego provimento ao recurso.
Gabinete Des. Luiz Cézar Medeiros
Fonte: PORTAL DO TJ/SC
Fonte: PORTAL DO TJ/SC
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