Perfil

Advogado - Nascido em 1949, na Ilha de SC/BR - Ateu - Adepto do Humanismo e da Ecologia - Residente em Ratones - Florianópolis/SC/BR

Mensagem aos leitores

Benvindo ao universo dos leitores do Izidoro.
Você está convidado a tecer comentários sobre as matérias postadas, os quais serão publicados automaticamente e mantidos neste blog, mesmo que contenham opinião contrária à emitida pelo mantenedor, salvo opiniões extremamente ofensivas, que serão expurgadas, ao critério exclusivo do blogueiro.
Não serão aceitas mensagens destinadas a propaganda comercial ou de serviços, sem que previamente consultado o responsável pelo blog.



quinta-feira, 29 de março de 2012

Decisão do TJ/SC sobre liberdade de expressão

Apelação Cível n. 2010.071999-7, de Seara
Relator: Des. Subst. Jorge Luis Costa Beber
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PRELIMINAR: CERCEAMENTO DE DEFESA. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. INOCORRÊNCIA. ART. 130 DO CPC. ELEMENTOS NOS AUTOS APTOS PARA A FORMAÇÃO DO CONVENCIMENTO DO JUIZ SENTENCIANTE. DESNECESSIDADE DE MAIOR DILAÇÃO PROBATÓRIA.
Tratando-se de pedido de indenização lastreada em prejuízos derivados de afirmações públicas despropositadas e desvestidas de fidelidade, de duas uma: ou a conduta do agente efetivamente ostenta carga para ocasionar um abalo em desfavor da honra objetiva ou subjetiva do autor, e, nesse caso, o dano é in re ipsa, ou seja, derivado do próprio fato ofensivo, evidenciando "ipso facto" o prejuízo moral, ou, ao revés, a conduta anunciada como fundamento fático da causa de pedir não configura ilícito algum, arredando, por consequência, a necessidade da produção de provas para demonstração do abalo experimentado.
MÉRITO. NOTÍCIAS VEICULADAS NA IMPRENSA IMPUTANDO EM DESFAVOR DAS AFIRMAÇÕES FEITAS PELO DEMANDANTE A CAUSA DO EMBARGO RUSSO PARA IMPORTAÇÃO DE CARNE SUÍNA DOS PRODUTORES CATARINENSES. DECLARAÇÕES DOS DEMANDADOS, PRESIDENTE DA REPÚBLICA E MINISTRA DA CASA CIVIL, FEITAS EM DATAS MUITO POSTERIORES ÀS NOTÍCIAS DIFUNDIDAS PELA IMPRENSA. DECLARAÇÕES QUE NÃO MENCIONAM O NOME DO DEMANDANTE, EMERGINDO DOS ÓRGÃOS DE IMPRENSA A SUA VINCULAÇÃO EM RELAÇÃO AOS FATOS REFERIDOS PELOS ACIONADOS. INEXISTÊNCIA DO DEVER DE INDENIZAR. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO.
Não procede o pedido de indenização por danos morais derivados de críticas envolvendo questões de interesse público, intentado por quem exerce cargo de representatividade, máxime quando lançadas após o tema ter sido alvo de intensa exploração pela mídia. Não se pode reconhecer a existência de melindres indenizáveis quando a crítica não ultrapassa os limites constitucionais da liberdade de expressão do pensamento.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2010.071999-7, da comarca de Seara (Vara Única), em que é/são apelante Wolmir de Souza, e apelado Luís Inácio Lula da Silva e outro:
A Câmara Especial Regional de Chapecó decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e negar-lhe provimento. Custas legais.
O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Des. Paulo Roberto Camargo Costa, e dele participou o Exmo. Des. Subst. Guilherme Nunes Born, como revisor.
Chapecó, 07 de fevereiro de 2012.
Jorge Luis Costa Beber
Relator

RELATÓRIO
Wolmir de Souza interpôs recurso de apelação contra sentença que julgou improcedente o pedido de indenização por danos morais formulado contra Luis Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff.
Em compendiado, aduz que à época dos fatos era presidente da Associação Catarinense de Criadores de Suínos e teve sua honra e imagem abaladas em razão de declarações prestadas pelo ex-presidente Lula, justo que, ao comentar o embargo da Rússia à importação da carne suína brasileira, imputou em desfavor do demandante a responsabilidade por tal embaraço.
Assevera que o autor da denúncia em torno da corrupção de agentes russos foi um funcionário do governo federal, ao invés do apelante, e que as matérias jornalísticas publicadas sobre o assunto não apontam tal fato como fundamento para a manutenção do embargo imposto pela Rússia.
À luz dessas considerações, conclui que o réu o acusou de forma infundada como culpado pelo embargo russo, ao passo que não comprovou quais foram os reais motivos para a manutenção do mencionado bloqueio das exportações, gerando em seu desfavor profundo constrangimento, além de vários pedidos de renúncia e afastamento.
Quanto à demandada Dilma Rousseff, insurge-se contra a conclusão exposta pelo Magistrado de primeiro grau, que reconheceu o péssimo estado da cópia da matéria jornalística carreada aos autos, inviabilizando a leitura do seu conteúdo.
Por fim, apresenta insurgência contra o julgamento antecipado da lide, afirmando ter ocorrido cerceamento de defesa ao não ter sido oportunizada a produção de provas com as quais pretendia comprovar as repercussões negativas que experimentou, além de evidenciar que as suas declarações não ocasionaram nenhuma mácula nas relações comerciais entre Brasil e Rússia.
Clamou, ao arremate, pelo reconhecimento da nulidade da sentença, ante o cerceamento de defesa, e, ultrapassada essa temática, pela reforma do édito singular, condenando-se os apelados a pagarem indenização por danos morais.
Apresentadas as contrarrazões, ascenderam os autos a esta Corte.
VOTO
Conheço do reclamo por vislumbrar presentes os requisitos de admissibilidade.
Afasto, de saída, a alegação de nulidade da sentença por cerceamento de defesa, realçando que o Juiz é o destinatário da prova e, por tal razão, tem a prerrogativa de indeferir as que se lhe afigurem desnecessárias à formação do seu convencimento, preservando a celeridade na prestação jurisdicional.
Assim dispõe o art. 130 do CPC:
"Art. 130. Caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias à instrução do processo, indeferindo as diligências inúteis ou meramente protelatórias".
A finalidade da prova testemunhal, como anunciado pelo apelante ao repostar a peça defensiva oferecida pelos réus, tinha por escopo demonstrar os abalos sofridos.
Sucede que, tratando-se de pedido de indenização lastreada em prejuízos derivados de afirmações públicas despropositadas e desvestidas de fidelidade, de duas uma: ou a conduta do agente efetivamente ostenta carga para ocasionar um abalo em desfavor da honra objetiva ou subjetiva do autor, e, nesse caso, o dano é in re ipsa, ou seja, derivado do próprio fato ofensivo, evidenciando "ipso facto" o prejuízo moral, ou, ao revés, a conduta anunciada como fundamento fático da causa de pedir não configura ilícito algum, arredando, por consequência, a necessidade da produção de provas para demonstração do abalo experimentado.
No caso em liça, o ilustre Juiz de Direito Rafael Germer Condé, sopesando a vasta prova documental carreada ao caderno processual, reconheceu a ausência dos elementos configuradores do dever de indenizar lastreado na responsabilidade civil, afastando a necessidade da produção da prova oral requerida, o que apenas retardaria o desfecho do resultado já antevisto.
Em ações dessa natureza, fulcradas muitas vezes em verdadeiras bizarrices, o condutor do feito deve, segundo estimo, após formado o respectivo contraditório, perscrutar pelo seu prudente arbítrio a existência de um mínimo de razoabilidade e sintonia entre os fatos narrados na peça de ingresso e o direito almejado, ou seja, entre o ato supostamente ilícito e a sua eventual repercussão em desfavor do patrimônio moral daquele que se diz ofendido, buscando, desta forma, evitar abusos de toda a sorte, abortando o prosseguimento de uma demanda fatalmente destinada ao insucesso.
E os elementos contidos nos autos, conforme adiante se verá, realmente recomendavam a improcedência da ação, daí por que não vislumbro qualquer cerceamento de defesa em desfavor do apelante.
Com efeito, para bem encaminhar o voto, transcrevo, tal como redigido, excerto da sentença açoitada, que sintetiza com fidelidade os fatos e as matérias jornalísticas em torno das quais os litigantes controvertem:
"O autor afirma em sua inicial que sofreu danos morais pelas declarações prestadas pelos requeridos em matérias jornalísticas, os quais atribuíam a culpa a ele pela demora da retomada da venda da carne suína de Santa Catarina para a Rússia.
Em contrapartida, os requeridos afirmaram ter apenas dado ênfase a matéria publicada no dia 20.02.2006, no Jornal "O Estado de São Paulo", não possuindo ânimo em prejudicar a pessoa do autor.
Inicialmente, cabe frisar que em dezembro de 2005, após comprovada a existência de alguns casos de febre aftosa no Estado de Mato Grosso do Sul, o Governo da Rússia proibiu a importação de carne suína originária do Brasil, sendo que o embargo à carne suína produzida no Estado de Santa Catarina perdurou por mais tempo do que em outros Estados vizinhos, ou seja, apenas no ano de 2007 abriu-se novamente a possibilidade de exportação da carne suína ao pais da Rússia, isso num primeiro momento de forma tímida, pois somente duas empresas tiveram autorização, a Pamplona e a Cargil, decisão que posteriormente fora ampliada aumentando a gama de empresas autorizadas.
Como o embargo a compra da carne suína originária do Estado de Santa Catarina foi mantida pelo Governo Russo por muito mais tempo do que em outros Estados, a imprensa catarinense começou a criticar a atuação do governo federal sobre a resolução de tal problema econômico, momento em que o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou que a manutenção do embargo teria sido motivada pela declaração de um empresário catarinense de que fiscais russos estariam sendo subornados por empresários catarinenses para fazerem "vista grossa" a carne que entrava em seu pais, conforme extrai-se da matéria publicada no Diário Catarinense em 26.10.2006, in verbis:
"(...)
DC – A crise da agricultura se deve muito ao embargo russo à carne suína. Santa Catarina, no ano passado, foi o maior Estado exportador. Não faltou um pouco de empenho do governo federal?
Lula – Obrigado por esta pergunta.
DC – E porque liberaram Rio Grande do Sul, Goiás, Mato Grosso...
Lula – Porque um irresponsável de um empresário em Santa Catarina, que deveria aparecer na imprensa e não aparece, fez uma manchete publicada no jornal O Estado de São Paulo dizendo que não tinha problema de exportação de carne para a Rússia porque eles corrompiam os agentes do governo russo. Certamente, o embaixador da Rússia mandou para o presidente Putin e certamente o presidente Putin ficou indignado como estou agora. Achei uma irresponsabilidade. Encontrei esse empresário em Chapecó e disse isso para ele. Depois tivemos algumas coisas importantes. Na medida em que o Brasil passa a ser um grande exportador de carne, aumenta consideravelmente nossa responsabilidade, seja carne suíno, seja carne de frango, seja carne de boi (...)" (fl. 23).
Na data de 25.10.2006, na emissora de TV RBS, foi exibida duas matérias jornalísticas, filmagens gravadas no CD entregue à escrivã (fl. 182), degravadas às fls. 25 e 26, possuindo o seguinte teor, in litteris:
"(...)
Repórter – a matéria divulgada pelo jornal "O Estado de São Paulo", em fevereiro deste ano foi motivo de desabafo do Presidente Lula a reportagem denúncia um esquema de suborno, agentes russos estariam recebendo propina para autorizar o embarque de carne catarinense mesmo depois do embargo, segundo o presidente em entrevista a Rádio CBN a declaração seria responsável pelo impasse na negociação que quer por fim a sanção.
Presidente Lula – é porque um irresponsável de um empresário de Santa Catarina, que deveria aparecer na imprensa, mas não aparece, um irresponsável de um empresário de Santa Catarina, teve uma manchete publicada no jornal "O Estado de São Paulo", que não tinha problemas de exportação de carne suína para a Rússia porque eles corrompiam os agentes do governo russo, e foi estampado no jornal "O Estado de São Paulo", que certamente o embaixador da Rússia mandou para o presidente Putin. E certamente que o presidente Putin ficou tão indignado quanto eu estou agora" (fl. 25).
"Repórter – Presidente a questão da crise da agricultura tem muito a ver com o embargo da carne suína pela Rússia e esse embargo já foi levantado em relação no Rio Grande do Sul, Mato Grosso, Goiás por que continua em Santa Catarina o governo não se omitiu um pouco neste processo?
Presidente Luiz Inácio Lula da Silva – Não pelo contrário, pelo contrário, eu tive duas vezes com o presidente Putin, n última o Ministro Furlan e eu conversamos uma hora e quarenta minutos com o presidente Putin tive com o primeiro ministro aqui no Brasil, veja o problema é que as pessoas não contam a verdade pra sociedade, eu eu uma vez deparei com a notícia no jornal o Estado de São Paulo com um empresário dizendo que corrompia o governo russo pra vender a carne, obviamente que o governo russo fica zangado com isso e tomou uma atitude dura na conversa que eu tive com o Putin isso foi discutido eu disse presidente Putin o Estado de Santa Catarina, a carne suína é condição sine qua non pra aquele Estado crescer são milhares de pequenos produtores e eu penso que ele vai compreender isso e logo logo nós vamos ter uma liberação total da carne" (fl. 26).
Em discurso realizado em 20.03.2007, na cerimônia de inauguração do complexo industrial da empresa Perdigão na cidade de Mineiros/GO, disse o requerido Luiz Inácio Lula da Silva:
"Eu estava em Chapecó fazendo um debate, uma vez, e o cidadão mais bravo, o que mais xingava o governo – depois me entregaram, no ato, um recorte de jornal – era um cidadão que tinha dado uma declaração, lá em São Paulo, dizendo que não tinha problema com os russos, porque eles corrompiam o governo russo. Aquilo saiu na primeira página do jornal O Estado de São Paulo. Certamente, o embaixador russo recebeu; certamente, mandou para o presidente Putin, e certamente o Putin ficou meio 'putin' com o Brasil. Certamente, ele deve ter falado: 'bom, se estão dizendo que o nosso governo é corrupto, por que eu vou comprar?' Isso foi estampado nas páginas dos jornais. E esse cidadão, que fazia um discurso feroz contra o governo, era a figura mais inocente daquele pedaço da reunião ali, até que eu mostrei a manchete do jornal e disse para ele que o mínimo que eu esperava dele era que ele fizesse uma carta ao presidente da Rússia, pedindo desculpas e dizendo que tinha falado bobagem. Não sei se mandou, mas deveria ter mandado" (fls. 31 e 32).
A matéria jornalística que o requerido várias vezes faz menção publicada no jornal O Estado de São Paulo (fls. 239 e 240), diz respeito a existências de denúncias de pagamento de propinas a agentes russos para liberar a carne embargada, que abaixo passo a transcrevê-la:
"Propina a russos não causa surpresa
Exportador confirma que suborno já é tema de comentários no setor
Kazuo Inoue
ESPECIAL PARA O ESTADO
FLORIANÓPOLIS
A denúncia do pagamento de propinas para contornar o embargo russo à carne brasileira não é novidade para o presidente da Associação Catarinense de Criadores de Suínos (ACCS), Wolmir de Souza.
Em sua edição de domingo, o Estado trouxe denúncia de um agente de comércio exterior, de que exportadores de carne brasileiros estariam subornando funcionários do governo russo para continuar vendendo carne naquele país. A propina, segundo esse agente, seria de US$ 125,00 por tonelada. O esquema, segundo a denúncia, explicaria por que as exportações de carne para a Rússia praticamente dobraram entre dezembro de 2005 e janeiro de 2006, passando de US$ 24,82 para US$ 45,38 milhões.
Souza considera 'muito estranho' o aumento das vendas em janeiro, após o embargo aos produtos brasileiros em 21 de dezembro do ano passado por causa do surto de febre aftosa no Paraná. Segundo ele, a explicação é de que seriam permitidos os embarques dos produtos de animais abatidos antes do embargo, o que abriria caminho para várias manobras, como alterar as datas do abate.
Ele admite que existe uma conversa corrente no setor sobre propinas pagas aos russos para facilitar os negócios, mas não pode acusar ninguém sem provas. Acima dos rumores há o fato de que o consumidor russo gosta muito do produto brasileiro, o que justificaria o interesse em manter aquele mercado abastecido, afirma o presidente da ACCS. Souza esteve na comitiva do governo catarinense que foi a Moscou no mês passado para levar a documentação sobre o status sanitário diferenciado de Santa Catarina, que não registra qualquer caso de aftosa desde 1993 e desde 2000 não vacina mais seu rebanho (...)"
Pois bem, conforme se retira da leitura das matérias jornalísticas acima transcritas, o que ligou o nome do autor às denúncias de supostas propinas pagas aos agentes russos foi a própria edição da empresa jornalística.
Conforme os escritos que repousam às fls. 37/42, denota-se que no dia 20/02/2006 foi publicada no jornal O Estado de São Paulo matéria com o título "Carne para a Rússia paga suborno". Na referida reportagem consta que, segundo um agente de comércio exterior que pediu para não ser identificado, exportadores brasileiros estariam pagando "propina" para funcionários russos a fim de driblar o embargo à importação de carne brasileira decretado em razão dos focos de febre aftosa no país.
E, na edição do dia seguinte (21/02/2006), o referido periódico publicou matéria em que o autor Wolmir de Souza confirma a existência de "conversa corrente no setor sobre propinas pagas aos russos para facilitar os negócios", com a ressalva de que o dirigente não poderia acusar ninguém sem provas.
Foi a partir destas publicações que começaram a circular diversas matérias na imprensa associando a declaração do autor Wolmir ao mal-estar causado no governo russo e que, em tese, estaria prejudicando a exportação de carne suína produzida em Santa Catarina. Isso, aliás, é o que se observa dos diversos registros jornalísticos e do pronunciamento do vereador Ernesto Gomes do Município de Seara, carreados às fls. 45/60, ocorridos no período que medeou entre 19/05/2006 e 16/09/2006.
Sucede que a entrevista do ex-presidente Lula, sobre a qual o autor fundamenta sua pretensão, somente foi concedida em 25/10/2006 à Rede de Televisão RBS, também publicada no jornal Diário Catarinense do dia 26/10/2006.
A interpretação conjugada dos fatos acima expostos revela, irrefutavelmente, que os alegados transtornos experimentados pelo autor não tiveram sua gênese naquilo que declarou o ex-presidente Lula. A cronologia das publicações é clara ao demonstrar que, segundo as matérias veiculadas, já havia grande descontentamento entre os suinocultores do Estado e demais participantes do setor produtivo com a forma com que o demandante tratou a denúncia em torno do anunciado pagamento de propinas aos agentes russos.
Outrossim, em nenhum momento o demandado fez referência ao nome do autor, mencionando apenas "um irresponsável de um empresário em Santa Catarina". Quem, de fato, relacionou o nome do autor com o "empresário em Santa Catarina" foram os próprios veículos da imprensa, com base em tudo o que já havia sido antes divulgado sobre o assunto.
Registre-se, por oportuno, que tanto na edição escrita quanto na matéria televisiva o autor foi ouvido para comentar a entrevista, facultando-se-lhe, portanto, mais de uma oportunidade para negar que as declarações do então Presidente da República se referiam a ele.
O demandante, entretanto, preferiu assentir à relação feita pela imprensa, ou seja, associando a entrevista do réu com o seu nome, utilizando o espaço que lhe foi concedido apenas para expor sua opinião sobre a ineficiência da gestão do Presidente da República em relação ao mercado externo.
Alusivamente à demandada Dilma Rousseff, o apelante limitou-se a transcrever notícia publicada no jornal A Notícia, de 16/08/2007, onde a então Ministra da Casa Civil teria declarado, no curso de uma reunião com o Governador do Estado, que o Governo Federal não iria intervir para ajudar as agroindústrias catarinenses enquanto o autor continuasse na presidência da ACCS ou se retratasse.
No entanto,nos termos do que restou até aqui expendido, tal divulgação não tem o condão de causar os danos alegados pelo demandante, justo que a sua atitude e a sua permanência na direção da ACCS já eram alvo de questionamentos em período muito anterior ao dia da mencionada declaração da Ministra da Casa Civil.
Pertinente realçar que a espécie de cargo ocupado pelo autor, assim como aqueles exercidos pelos réus, exige maior temperança ao receber ou ao formular críticas alheias. O próprio autor, tanto nas oportunidades em que foi ouvido pela imprensa quanto nas petições ofertadas nestes autos, difundiu severas críticas à forma com que o primeiro demandado conduziu o seu governo.
Isto demonstra que o cargo de dirigente, tanto na esfera pública como nas associações que representam setores de produção, congrega em si, pela própria natureza, a possibilidade de ser alvo de críticas ou contrariedades, não havendo espaço para o pedido de indenização quando as manifestações expendidas não estiverem pintadas com as cores da injúria, da calúnia ou da difamação.
A crítica, quando não desborda para o insulto, para enxovalhação, quando não procura incutir fato falso ou criminoso, nada tem de ilegal, sendo perfeitamente legítima no âmbito do direito de opinião ou da livre manifestação, revelando-se ainda mais autorizada no contexto das questões políticas e naquelas de interesse da coletividade ou de determinado segmento.
Verdadeiramente, o que se retira dos autos é que nenhum dos demandados agiu de forma a macular a honra do autor e tampouco se pode atribuir a eles eventuais questionamentos em torno da sua conduta como presidente da Associação Catarinense de Criadores de Suínos.
Como sabido, para que haja o dever de indenizar, é imprescindível a existência de um comportamento ilícito, um dano e a existência de um nexo de causalidade entre o ato cometido e o prejuízo experimentado. É dizer, mesmo que exista um ato ilícito, não havendo liame de ligação entre esse comportamento reprovável e o dano alegado, não haverá a obrigação de reparar.
O nexo causal nada mais é do que o elo de ligação, o elemento lógico-normativo passível de evidenciar que o dano somente ocorreu porque houve por parte do agente imputado um comportamento injusto, contrário ao ordenamento jurídico.
Se não há comportamento ilícito na conduta dos réus, obviamente sequer seria possível estabelecer qualquer relação aos efeitos que o demandante alega ter experimentado, o que afasta por completo a pretensão reparatória aviada.
Desta Corte de Justiça colhe-se o seguinte julgado:
"APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANOS MORAIS. CARTA ENVIADA PARA JORNALISTA. PUBLICAÇÃO DE TRECHOS EM JORNAL. TOM CRÍTICO. PRELIMINAR. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. PROVAS BASTANTES NOS AUTOS. MÉRITO. INAPLICABILIDADE DA LEI DE IMPRENSA. CAUSA DE PEDIR RELATIVA AO REMETENTE DA CARTA. INEXISTÊNCIA DE CONDUTA DOLOSA OU CULPOSA. CRÍTICAS À ATUAÇÃO COMO PESSOA PÚBLICA - ENQUANTO PRESIDENTE DE FEDERAÇÃO DE DESPORTO. NATURAL EXPOSIÇÃO. DIREITO À LIVRE MANIFESTAÇÃO DO PENSAMENTO. ART. 5º, IV E IX DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. DEVER DE INDENIZAR NÃO CONFIGURADO. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO PROVIDO.
- É firme o entendimento de que o julgamento antecipado da lide não significa, necessariamente, cerceamento de defesa, pois é procedimento que se impõe ao juiz quando suficiente a prova já autuada, indeferindo as medidas que entender irrelevantes ou desnecessárias ao deslinde do caso (art. 131, CPC).
- É inegável que aqueles que possuem cargos de direção e liderança estão mais sujeitos a críticas, inerentes ao seu próprio exercício. Desde que tais censuras não desbordem para a esfera íntima do indivíduo - quando, aí sim, implicarão violação da intimidade ou privacidade, sujeitando à reparação moral -, não constituem infração ao direito fundamental à honra e à imagem". (Apelação Cível n. 2008.069982-5, da Capital, Relator Juiz Henry Petry Junior, julgada em 25/08/2009).
Desta forma, não vislumbrando no comportamento dos demandados qualquer exacerbação aos limites constitucionais da liberdade de crítica política e de livre expressão do pensamento, voto pelo desprovimento do apelo.

Nenhum comentário: