Opinião
O
dia 25 de maio de 2017 ficou marcado como o aniversário de cinco anos
da Lei 12.651/2012, conhecida como Novo Código Florestal. Esse “novo”
código veio em substituição a Lei 4.771/1965[1], que por sua vez
instituía o nosso tradicional Código Florestal Brasileiro.
Na época da instituição do Código Florestal original, falar em sustentabilidade não era tão comum quanto nos dias atuais. O momento social e político era outro, basta lembrar que a referida lei foi promulgada por Castello Branco.
As relações do homem com o meio ambiente estão em constante evolução, e dependem de variáveis econômicas, ecológicas e sociais. Nesses mais de 50 anos, muitas leis e muitos entendimentos jurisprudenciais foram alterados, sendo que se tornou essencial a elaboração de um novo marco legal que trouxesse maior segurança jurídica ao país, implementando novos institutos, sobretudo tecnológicos, que não estavam ao nosso alcance em outras épocas.
Essa pauta ambiental foi ganhando corpo na década de 90, quando as preocupações com o aquecimento global, o efeito estufa, o derretimento das calotas polares, o desaparecimento de espécies de animais e o desmatamento ambiental tiveram a atenção popular que sempre mereceram.
Desta forma, em 2012, depois de anos de debate (tanto no âmbito do Congresso Nacional como em diversos Órgãos ambientais), o Brasil aprovou o seu novo Código Florestal, trazendo novos institutos, consolidando a legislação ambiental, e atualizando as normas para se adaptarem às necessidades que o país passou a possuir. É interessante frisar que, além de ter servido ao propósito acima, a nova lei serviu também de resposta aos nossos observadores internacionais, uma vez que o Brasil se tornou vitrine ambiental em virtude da nossa ampla preservação, e teve grande atenção no ano de 2012 em virtude da realização da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Natural, conhecida também como Rio+20.
Entre os institutos que ganharam destaque com a Lei 12.651, podemos citar o Cadastro Ambiental Rural (CAR), as Cotas de Reserva Ambiental (CRA), o Programa de Regularização Ambiental (PRA), e o Pagamento por Serviços Ambientais (PSA). Além disso, a lei cuidou de resguardar o direito adquirido daqueles proprietários que averbaram suas reservas legais de acordo com a lei vigente à época, criando a figura da área rural consolidada, fundamental para o funcionamento da legislação e para a segurança jurídica.
O CAR foi definido como um registro público eletrônico de âmbito nacional, obrigatório para todos os imóveis rurais, com a finalidade de integrar as informações ambientais das propriedades e posses rurais. Até 30 de abril de 2017[2], já foram cadastrados, mais de 4.1 milhões de imóveis rurais, totalizando uma área de 407.999.690 hectares inseridos na base de dados do sistema. Ou seja, o trabalho de mapeamento da cobertura vegetal e da atividade rural no Brasil ficou muito facilitado, pois as informações são fornecidas pelo próprio proprietário. De certa forma, o sistema se assemelha ao Imposto de Renda, onde as informações são fornecidas diretamente pelo contribuinte, o que não o isenta de fiscalização e eventual autuação em caso de infrações.
O CAR foi bem-sucedido, estando em sua fase final de implantação, passando-se agora ao início da implementação dos Programas de Regularização Ambiental naquelas propriedades que possuem passivo ambiental a ser recomposto.
Apesar disso, ainda existem algumas dificuldades jurídicas à implementação do PRA, ao exemplo do Estado de São Paulo, onde o programa está suspenso por força de decisão judicial desde maio de 2016, uma vez que o Ministério Público Federal questiona sua legalidade.
Mesmo passando por intensos debates e anos de amadurecimento, o Código Florestal de 2012 sofre críticas, tanto por parte de ambientalistas como por parte do setor do agronegócio. Uns dizem que houve retrocesso ambiental, o que seria vedado pela Constituição, e outros dizem que o Código é muito rígido na proteção ambiental, o que engessa o desenvolvimento do país e impede a competição em pé de igualdade com o mercado americano e chinês, por exemplo. Afirmam, ainda, que nossa previsão de Reserva Legal de 80% em áreas de florestas em bioma amazônico não possui paralelo em nenhum outro país, e que tamanha limitação violaria o direito de usufruto da propriedade particular.
No entanto, o fortalecimento da democracia demanda a assunção dos riscos da tomada de decisão. Se é certo que a vinculação constitucional deve assegurar certas garantias nesse processo, é correto também que ela não pode levar a uma despolitização dos assuntos mais relevantes, nem passar a ilusão de que, recorrendo-se ao Judiciário, é possível proteger a coletividade do risco decisório.
A única certeza que ambos os lados possuem é que as discussões precisam de um ponto final, e esse ponto só será dado pelo Supremo Tribunal Federal. Hoje, o ministro Fux é relator de diversos processos que tratam da constitucionalidade do Código Florestal, entre elas as ADIs 4.901, 4.902, 4.903 e 4.937. Em contrapartida dessas Ações questionatórias, foi ajuizada também uma Ação Declaratória de Constitucionalidade, sob o 42 no STF, que busca exatamente o que o nome sugere, a declaração de constitucionalidade do novo Código Florestal. Apesar de um pedido liminar pela constitucionalidade da norma, o referido pedido ainda não apreciado pelo ministro Fux, que deve levar todos os processos mencionados juntos a julgamento nos próximos meses.
Assim, o bolo do aniversário de cinco anos do Novo Código Florestal é agridoce: o CAR superou as expectativas, e a consolidação das leis ambientais foi festejada, no entanto, diversos institutos estão sendo questionados pelo Ministério Público Federal, atrasando a implementação da norma e causando insegurança jurídica. Resta saber se a instância máxima do Poder Judiciário, que já foi provocada, se posicionará a favor da norma aprovada pelos representantes do povo, ou contra ela.
[1] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L4771.htm
[2] http://www.florestal.gov.br/numeros-do-car
Na época da instituição do Código Florestal original, falar em sustentabilidade não era tão comum quanto nos dias atuais. O momento social e político era outro, basta lembrar que a referida lei foi promulgada por Castello Branco.
As relações do homem com o meio ambiente estão em constante evolução, e dependem de variáveis econômicas, ecológicas e sociais. Nesses mais de 50 anos, muitas leis e muitos entendimentos jurisprudenciais foram alterados, sendo que se tornou essencial a elaboração de um novo marco legal que trouxesse maior segurança jurídica ao país, implementando novos institutos, sobretudo tecnológicos, que não estavam ao nosso alcance em outras épocas.
Essa pauta ambiental foi ganhando corpo na década de 90, quando as preocupações com o aquecimento global, o efeito estufa, o derretimento das calotas polares, o desaparecimento de espécies de animais e o desmatamento ambiental tiveram a atenção popular que sempre mereceram.
Desta forma, em 2012, depois de anos de debate (tanto no âmbito do Congresso Nacional como em diversos Órgãos ambientais), o Brasil aprovou o seu novo Código Florestal, trazendo novos institutos, consolidando a legislação ambiental, e atualizando as normas para se adaptarem às necessidades que o país passou a possuir. É interessante frisar que, além de ter servido ao propósito acima, a nova lei serviu também de resposta aos nossos observadores internacionais, uma vez que o Brasil se tornou vitrine ambiental em virtude da nossa ampla preservação, e teve grande atenção no ano de 2012 em virtude da realização da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Natural, conhecida também como Rio+20.
Entre os institutos que ganharam destaque com a Lei 12.651, podemos citar o Cadastro Ambiental Rural (CAR), as Cotas de Reserva Ambiental (CRA), o Programa de Regularização Ambiental (PRA), e o Pagamento por Serviços Ambientais (PSA). Além disso, a lei cuidou de resguardar o direito adquirido daqueles proprietários que averbaram suas reservas legais de acordo com a lei vigente à época, criando a figura da área rural consolidada, fundamental para o funcionamento da legislação e para a segurança jurídica.
O CAR foi definido como um registro público eletrônico de âmbito nacional, obrigatório para todos os imóveis rurais, com a finalidade de integrar as informações ambientais das propriedades e posses rurais. Até 30 de abril de 2017[2], já foram cadastrados, mais de 4.1 milhões de imóveis rurais, totalizando uma área de 407.999.690 hectares inseridos na base de dados do sistema. Ou seja, o trabalho de mapeamento da cobertura vegetal e da atividade rural no Brasil ficou muito facilitado, pois as informações são fornecidas pelo próprio proprietário. De certa forma, o sistema se assemelha ao Imposto de Renda, onde as informações são fornecidas diretamente pelo contribuinte, o que não o isenta de fiscalização e eventual autuação em caso de infrações.
O CAR foi bem-sucedido, estando em sua fase final de implantação, passando-se agora ao início da implementação dos Programas de Regularização Ambiental naquelas propriedades que possuem passivo ambiental a ser recomposto.
Apesar disso, ainda existem algumas dificuldades jurídicas à implementação do PRA, ao exemplo do Estado de São Paulo, onde o programa está suspenso por força de decisão judicial desde maio de 2016, uma vez que o Ministério Público Federal questiona sua legalidade.
Mesmo passando por intensos debates e anos de amadurecimento, o Código Florestal de 2012 sofre críticas, tanto por parte de ambientalistas como por parte do setor do agronegócio. Uns dizem que houve retrocesso ambiental, o que seria vedado pela Constituição, e outros dizem que o Código é muito rígido na proteção ambiental, o que engessa o desenvolvimento do país e impede a competição em pé de igualdade com o mercado americano e chinês, por exemplo. Afirmam, ainda, que nossa previsão de Reserva Legal de 80% em áreas de florestas em bioma amazônico não possui paralelo em nenhum outro país, e que tamanha limitação violaria o direito de usufruto da propriedade particular.
No entanto, o fortalecimento da democracia demanda a assunção dos riscos da tomada de decisão. Se é certo que a vinculação constitucional deve assegurar certas garantias nesse processo, é correto também que ela não pode levar a uma despolitização dos assuntos mais relevantes, nem passar a ilusão de que, recorrendo-se ao Judiciário, é possível proteger a coletividade do risco decisório.
A única certeza que ambos os lados possuem é que as discussões precisam de um ponto final, e esse ponto só será dado pelo Supremo Tribunal Federal. Hoje, o ministro Fux é relator de diversos processos que tratam da constitucionalidade do Código Florestal, entre elas as ADIs 4.901, 4.902, 4.903 e 4.937. Em contrapartida dessas Ações questionatórias, foi ajuizada também uma Ação Declaratória de Constitucionalidade, sob o 42 no STF, que busca exatamente o que o nome sugere, a declaração de constitucionalidade do novo Código Florestal. Apesar de um pedido liminar pela constitucionalidade da norma, o referido pedido ainda não apreciado pelo ministro Fux, que deve levar todos os processos mencionados juntos a julgamento nos próximos meses.
Assim, o bolo do aniversário de cinco anos do Novo Código Florestal é agridoce: o CAR superou as expectativas, e a consolidação das leis ambientais foi festejada, no entanto, diversos institutos estão sendo questionados pelo Ministério Público Federal, atrasando a implementação da norma e causando insegurança jurídica. Resta saber se a instância máxima do Poder Judiciário, que já foi provocada, se posicionará a favor da norma aprovada pelos representantes do povo, ou contra ela.
[1] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L4771.htm
[2] http://www.florestal.gov.br/numeros-do-car
Vicente Gomes da Silva é procurador federal aposentado e ex-procurador geral do Ibama.
Fabio M. Ferreira é advogado especialista em direito ambiental pela UFPR e sócio da Ferraz Advogados.
Revista Consultor Jurídico, 4 de junho de 2017, 7h30
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