de setembro de 2020, 10h43
"A advocacia é uma função que deve ser respeitada em todas as suas prerrogativas e que não devem ser mitigadas ou relativizadas em nome de anseios punitivistas". O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, fez esta observação ao conceder liminar em pedido de habeas corpus para declarar nula a busca e apreensão realizada pela Polícia Federal nos endereços residencial e profissional de um advogado.
O beneficiário do habeas corpus é Hélio Sant’anna e Silva Júnior, ex-delegado da PF. Em dezembro de 2019, ele, o prefeito de Florianópolis, Gean Loureiro, e mais 15 pessoas foram indiciados pela Polícia Federal em investigação que apura o vazamento de informações sobre investigações da própria PF para favorecer políticos e empresários de Santa Catarina.
O advogado Eugênio Carlo Balliano Malavasi alegou no habeas corpus que a vistoria nos endereços de Hélio não contou com a presença de representante da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), conforme exige a Lei 8.906/94 (Estatuto da Advocacia). Segundo ele, o mandado de busca ainda foi "genérico" ao não especificar o que deveria ser recolhido, dando aos agentes discricionariedade (poder de escolha) ilegal.
De acordo com Mendes, a defesa de Hélio demonstrou com documentos que o representante da OAB designado para acompanhar a busca não presenciou de fato a diligência e se recusou, inclusive, a assinar o auto de apreensão. Para o ministro, houve "indícios de ofensa" ao Estatuto da Advocacia, aptos a tornarem nula a ação dos policiais federais. Como consequência, eventuais provas coletadas devem ser desconsideradas.
O prefeito da capital catarinense não quis se manifestar sobre a decisão de Gilmar Mendes. O chefe de gabinete de Gean Loureiro justificou que a Justiça rejeitou a denúncia contra o líder do Executivo e ele deixou de acompanhar os desdobramentos da operação.
Entenda o caso
A ação penal foi ajuizada no Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), com sede em Porto Alegre, devido ao foro privilegiado por prerrogativa de função do prefeito de Florianópolis. Conduzido em junho de 2019 à PF para depor, Gean Loureiro foi liberado no mesmo dia e desabafou na época: "Cometeram a maior injustiça da minha vida comigo e com toda a minha família." Ele ficou afastado do cargo por alguns dias.
As suspeitas contra o prefeito não vingaram para torná-lo réu. Como o vazamento de dados sobre investigações da Polícia Federal seria feito por membros da PF e da Polícia Rodoviária Federal lotados em Santa Catarina, a operação foi conduzida pela Diretoria de Inteligência Policial (DIP), em Brasília. Ela foi batizada de chabu, porque os agentes públicos, em troca de vantagens, usavam esse termo para alertar políticos e empresários.
A busca e apreensão contra Hélio foi autorizada pelo TRF-4. Inicialmente, Malavasi requereu, via habeas corpus, a nulidade da medida ao tribunal regional, tendo o pedido indeferido. Ele entrou com agravo regimental e a corte negou de novo o seu pleito. Sem sucesso, o advogado interpôs recurso especial e depois agravo regimental no Superior Tribunal de Justiça, antes de conseguir a declaração de nulidade no STF.
*Reportagem originalmente publicada no Vade NewsTopo da página
Eduardo Velozo Fuccia é jornalista.
Revista Consultor Jurídico, 3 de setembro de 2020, 10h43
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