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quinta-feira, 16 de janeiro de 2020

SOBRE A PENA DE MORTE, QUE A POLÍCIA ESTÁ A APLICAR, INDEPENDENTEMENTE DE DEVIDO PROCESSO LEGAL E JULGAMENTO JUSTO, EM GOVERNOS COMO O DO RJ

Excertos da obra de FRANKLIN TÁVORA - O Cabeleira:

 (...) a pena de morte; que as idades e as luzes têm demonstrado não ser mais que um crime jurídico, de feito não corrige nem moraliza. 
O que ela faz é enegrecer os códigos que em suas páginas a estampam, por mais liberais e sábios que sejam como é o nosso; é abater o poder que a aplica; é escandalizar, consternar e envilecer as populações em cujo seio se efetua.
A justiça executou o Cabeleira por crimes que tiveram sua principal origem na ignorância e na pobreza.
Mas o responsável de males semelhantes não será primeiro que todos a sociedade que não cumpre o dever de difundir a instrução, fonte da moral, e de organizar o trabalho, fonte da riqueza?

Se a sociedade não tem em caso nenhum o direito de aplicar a pena de morte a ninguém, muito menos tem o de aplicá-la aos réus ignorantes e pobres, isto é, àqueles que cometem o delito sem pleno conhecimento do mal, e obrigados muitas vezes da necessidade. 
O Cabeleira pode acaso comparar-se em culpabilidade a Lapomerais, médico ilustrado, ou a esse negociante alemão ou americano, Tomás ou Thompson, que, com intuito de enriquecer do dia para a noite, ocasionou com a perda do paquete Moselle a morte de oitenta, e os ferimentos de cem passageiros?
Condena-se à forca o escravo que mata o senhor, sem se atender a que, rebaixado pela condição servil, paciente do açoite diário, coberto de andrajos, quase sempre faminto, sobrecarregado com trabalhos excessivos, semelhante criatura é mais própria para cego instrumento do desespero, do que competente para o exercício da razão. Ainda em 28 de abril do corrente ano, em uma cidade da província das Alagoas um destes infelizes padeceu o suplício capital. Por honra da civilização, um dos primeiros órgãos da imprensa do Norte, o Diário de Pernambuco lavrou contra essa covardia jurídica o seguinte protesto: «Registramos este acontecimento com a mágoa que sói causar àqueles que amam a pátria e a humanidade a continuação entre nós da bárbara pena de morte, que infamando, nem ao menos corrige».
Arrastam os delinqüentes à barra dos tribunais ou ao pé dos juizes para serem interrogados sobre as    circunstâncias dos crimes que cometeram. Não devia ser assim. O interrogatório principal devia ter por objeto os precedentes do culpado, o grau da sua instrução literária, a sua educação, os seus teres.
À pobreza, que é na realidade uma desgraça, deve a sociedade atribuir o maior número dos crimes que pune e dos erros e faltas que não se julga com o direito de punir. A pobreza nunca foi nem será jamais um elemento de elevação; ela foi e será sempre um elemento de degradação social.
A riqueza, meu amigo, é um dos primeiros bens da vida.
Quando ela resulta de um trabalho honesto, e servido por uma ambição nobre e ponderada, não podem dela redundar males. Ao reverso, de uma riqueza assim adquirida, provêm quase sempre benefícios não só para aqueles que a possuem, mas também para a sociedade.
Quanto mais medito sobre este assunto, mais me parece que o evangelho que ensina a pobreza voluntária, considerada pela moderna ciência um absurdo econômico, e um impossível social, é antes um código de moral prática sujeito à revisão da sabedoria dos tempos, do que o corpo de leis de uma religião imutável. A prova de que não estou em erro, eu a vou achar no exemplo que nos dão os atuais ministros do evangelho, os quais, muito diferentes dos pescadores da Galiléia e da Samaria que, descalços
e humildes, o ensinaram gratuitamente a todas as gentes, empregam hoje todos os meios de tornar-se ricos e poderosos, e não desestimam a opulência, começando pelos que ocupam os primeiros lugares na hierarquia eclesiástica.
Não sirvam estas verdades de consternação aos pobres.
Sirvam-lhe antes dê estímulo para que trabalhem, cultivem a terra, as indústrias, as artes, e possam, por seu próprio esforço, vir a ser independentes e felizes.

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