O ministro Celso de Mello, decano do STF, faz a leitura do seu voto durante o julgamento do mensalão
Foto: Fellipe Sampaio/SCO/STF/Divulgação
GUSTAVO GANTOIS
Com um voto irrepreensível e calcado em farta jurisprudência, o ministro Celso de Mello, decano do Supremo Tribunal Federal (STF), derrubou os argumentos da defesa de que não existiriam provas contra os réus da ação penal do mensalão. O ministro votou pela condenação de João Paulo Cunha (corrupção passiva, peculato e lavagem de dinheiro), Marcos Valério, Ramon Hollerbach e Cristiano Paz (corrupção ativa, peculato e lavagem de dinheiro) e de Henrique Pizzolato (corrupção passiva, peculato e lavagem de dinheiro).
"Agentes públicos que se deixam corromper, qualquer que seja sua posição na hierarquia do poder, e particulares que corrompem os servidores do Estado, quaisquer que sejam os meios empregados e as vantagens indevidamente oferecidas, prometidas ou até mesmo entregues, sendo irrelevante a destinação que lhes seja dada, quer para satisfazer necessidades pessoais ou soldar dívidas de campanhas, são eles corruptos e corruptores, profanadores da República, os subversivos, os delinquentes e marginais da ética do poder, são os infratores do Erário, que trazem consigo a marca da indignidade", vaticinou o ministro.
Celso de Mello iniciou a análise sobre a conduta de João Paulo Cunha desconstruindo o argumento da defesa de que não teria ato de ofício contra o deputado. O ato de ofício é qualquer prova que aponte favorecimento em troca do pagamento de um benefício. Para o ministro, o ato de ofício, na verdade, representa qualquer ato que se insira nas atribuições do agente estatal.
"O fato é um só. Quem tem o poder e a força do Estado em suas mãos, não tem o direito de exercer, em seu próprio benefício, a autoridade que lhe é conferida pelas leis da República. O peculato é desrespeito aos postulados da moralidade e da legalidade administrativa. Esta Suprema Corte não pode permanecer indiferente a tão graves transgressões", afirmou.
O ministro apenas não admitiu a acusação de lavagem de dinheiro e a segunda imputação de peculato contra João Paulo, pela contratação do jornalista Luiz Costa Pinto como assessor de imprensa da Câmara dos Deputados, por falta de provas. A outra acusação de peculato, pela contratação da SMP&B, foi admitida. Celso de Mello também votou pela condenação por corrupção passiva pelo recebimento de R$ 50 mil da agência de Valério.
No caso do empresário mineiro e de seus sócios, Celso de Mello citou um caso de São Paulo em que um advogado respondeu por corrupção ativa por tentar pagar para um escrivão para que não fosse instaurado um inquérito. Ele disse que o Tribunal de Justiça aceitou a ação, mesmo entendendo que o escrivão não tinha a responsabilidade de instaurar o inquérito.
O ministro também considerou que o ex-diretor do Banco do Brasil Henrique Pizzolato também é culpado pelos crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e peculato. Segundo a denúncia do Ministério Público, Pizzolato beneficiou a agência DNA Propaganda após receber a quantia de R$ 326 mil do valerioduto em espécie e foi omisso ao permitir o repasse de R$ 2,9 milhões para a DNA Propaganda, que seriam de bônus de volume, um incentivo dado a agências de propagada por veículos de comunicação. Além disso, permitiu o repasse de R$ 73,8 milhões do fundo Visanet, que tinha recursos do Banco do Brasil, para a DNA Propaganda.
Luiz Gushiken
Todos os ministros que votaram até agora absolveram o ex-ministro da Secretaria de Comunicação do governo Lula Luiz Gushiken da acusação de peculato. Acusado pelo Ministério Público (MP) por supostos desvios de recursos para favorecer Marcos Valério. De acordo com a denúncia, na gestão de Gushiken na pasta da Comunicação Social, a empresa de publicidade DNA foi favorecida para executar serviços do fundo Visanet.
O próprio MP pediu a absolvição do réu por falta de provas. Gushiken, que está fora da política e enfrente tratamento contra um câncer, foi inocentado pelos ministros Joaquim Barbosa, Ricardo Lewandowski, Rosa Weber, Luiz Fux, Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Cezar Peluso, Gilmar Mendes, Marco Aurélio Mello e Celso de Mello.
O mensalão do PT
Em 2007, o STF aceitou denúncia contra os 40 suspeitos de envolvimento no suposto esquema denunciado em 2005 pelo então deputado federal Roberto Jefferson (PTB) e que ficou conhecido como mensalão. Segundo ele, parlamentares da base aliada recebiam pagamentos periódicos para votar de acordo com os interesses do governo Luiz Inácio Lula da Silva. Após o escândalo, o deputado federal José Dirceu deixou o cargo de chefe da Casa Civil e retornou à Câmara. Acabou sendo cassado pelos colegas e perdeu o direito de concorrer a cargos públicos até 2015.
No relatório da denúncia, a Procuradoria-Geral da República apontou como operadores do núcleo central do esquema José Dirceu, o ex-deputado e ex- presidente do PT José Genoino, o ex-tesoureiro do partido Delúbio Soares, e o ex- secretário-geral Silvio Pereira. Todos foram denunciados por formação de quadrilha. Dirceu, Genoino e Delúbio respondem ainda por corrupção ativa.
Em 2008, Sílvio Pereira assinou acordo com a Procuradoria-Geral da República para não ser mais processado no inquérito sobre o caso. Com isso, ele teria que fazer 750 horas de serviço comunitário em até três anos e deixou de ser um dos 40 réus. José Janene, ex-deputado do PP, morreu em 2010 e também deixou de figurar na denúncia.
O relator apontou também que o núcleo publicitário-financeiro do suposto esquema era composto pelo empresário Marcos Valério e seus sócios (Ramon Cardoso, Cristiano Paz e Rogério Tolentino), além das funcionárias da agência SMP&B Simone Vasconcelos e Geiza Dias. Eles respondem por pelo menos três crimes: formação de quadrilha, corrupção ativa e lavagem de dinheiro.
A então presidente do Banco Rural Kátia Rabello e os diretores José Roberto Salgado, Vinícius Samarane e Ayanna Tenório foram denunciados por formação de quadrilha, gestão fraudulenta e lavagem de dinheiro. O publicitário Duda Mendonça e sua sócia, Zilmar Fernandes, respondem a ações penais por lavagem de dinheiro e evasão de divisas. O ex-ministro da Secretaria de Comunicação (Secom) Luiz Gushiken é processado por peculato. O ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato foi denunciado por peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
O ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha (PT-SP) responde a processo por peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A denúncia inclui ainda parlamentares do PP, PR (ex-PL), PTB e PMDB. Entre eles o próprio delator, Roberto Jefferson.
Em julho de 2011, a Procuradoria-Geral da República, nas alegações finais do processo, pediu que o STF condenasse 36 dos 38 réus restantes. Ficaram de fora o ex-ministro da Comunicação Social Luiz Gushiken e do irmão do ex-tesoureiro do Partido Liberal (PL) Jacinto Lamas, Antônio Lamas, ambos por falta de provas.
Fonte: TERRA
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