Famílias cortam gastos, aceitam trabalho informal e até contemplam mudar de cidade para sobreviver à pior recessão dos últimos tempos
Fábio, Ednalva e a filha do casal na sala de espera do Centro de Apoio ao Trabalhador (CAT).
Sentado em uma das cadeiras do Centro de Apoio ao Trabalhador (CAT), no centro da cidade de São Paulo, Fábio Soares, 41, aguarda a irmã, que mais uma vez participa de um processo seletivo para uma vaga de trabalho. Os dois fazem parte da crescente taxa de desemprego no Brasil e, assim como outros quase dois milhões de brasileiros, perderam seus empregos em 2016. Fábio que era frentista em Aracaju, no Sergipe, foi demitido após o posto de gasolina em que trabalhava passar por uma reestruturação. Para driblar os quase seis meses de desemprego, começou a fazer bicos como mototaxista pelas ruas da capital sergipana, de forma ilegal, já que o serviço não é regulamentado na cidade.
Aproveitando a viagem de visita à irmã - que mora há alguns anos em São Paulo -, distribuiu seu currículo em alguns postos da capital paulista. “O mercado no Nordeste está muito ruim. Aqui, apesar da crise, há mais oportunidades e quero voltar a ser frentista”, conta ao lado da mulher, Ednalva, e da filha recém-nascida, Maria Vitória, de apenas dois meses. Fábio, no entanto, não pretende sair de Aracaju antes de conseguir de fato uma vaga. “Há 15 anos todo mundo vivia esse sonho das grandes metrópoles de vir em busca de um emprego, mas eu gostaria de me mudar para São Paulo se houvesse uma boa oportunidade, já que o custo de vida é muito caro. Precisa valer a pena”, explica.
Ednalva, que é operadora de telemarketing de uma empresa de TV a cabo, é quem tem sustentado a família. Ainda quando estava grávida, teve que reformular alguns planos com a notícia do desemprego do marido. Os dois resolveram sair da casa própria – construída já pensando na chegada de Maria Vitória – e alugá-la para conseguir uma renda extra. Passaram a viver de aluguel, mas em uma casa menor, de custo mais baixo.. “Tivemos que optar por um lugar mais humilde e menorzinho por enquanto. Ainda não sabemos também se vamos conseguir pagar uma babá quando eu voltar a trabalhar ou se o meu marido vai ter de cuidar dela”, conta Ednalva. Caso Fábio consiga um emprego em São Paulo, ela tentaria uma transferência na empresa em que é funcionária. Ainda está dividida sobre qual cidade preferiria viver nos próximos anos, enquanto o marido não esconde seu desejo: “Lá no fundo, sabemos que construir uma nova vida em São Paulo seria o melhor para nossa filha, ela teria muito mais oportunidades de estudo e trabalho”, explica.
Casados há um mês, Helena Passos e Gunnar Passos, ambos de 25 anos, também precisaram alterar os planos para 2017, após Gunnar ter sido demitido, no início deste ano, da empresa de engenharia onde trabalhava fazia quase um ano. O emprego foi o primeiro de carteira assinado do engenheiro. “O nosso plano era dar entrada em um apartamento, mas agora vamos ter que esperar e continuar no aluguel mesmo”, comenta. “A crise está muito complicada, conto nos dedos os amigos que formaram comigo e estão empregados. As obras estão paradas”, explica Gunnar que foi ao CAT dar entrada nos papéis para pedir o seguro-desemprego. O setor de construção civil é um dos que mais padece da recessão que o Brasil atravessa. Para os próximos meses, o plano do engenheiro é trabalhar por conta própria, como freelancer. “As vagas abertas estão pagando pouquíssimo”, explica.
A onda de demissões dos últimos meses fez com que, assim como Gunnar, trabalhadores que perderam seus empregos com carteira assinada passassem a viver de bicos ou como autônomos. O trabalho por conta própria continuou crescendo no ano passado e representou em 2016 um quarto de todas as ocupações nas principais cidades do Brasil, segundo os dados do PNAD contínua.
Após ser demitido, Verli Pinto,começou a prestar serviços de instalações elétricas e de banheiros informalmente. H. M.
Foi o caso de Verli Pinto, de 32 anos. Após perder o emprego de mecânico há mais de um ano, ele começou a prestar serviços de instalações elétricas e de banheiros informalmente. “É um bico, não tenho uma renda fixa com esse trabalho, mas já ajuda bastante”, explica. Desde que foi demitido, Verli precisou ajustar bastante as contas em casa. A mulher dele, Vanda Satles, que trabalha como acompanhante comunitária, conta que eles diminuíram a frequência dos passeios aos fins de semana, cortaram alguns alimentos da lista do supermercado e talvez terão que dispensar, neste ano, o serviço da empregada doméstica que ajuda a cuidar das duas filhas do casal. Os dois foram ao CAT buscar informações para que Verli possa se tornar um Microempreendedor Individual (MEI). “Assim posso começar a investir mais nesse serviços de bico, montar um site e conseguir mais trabalhos. Gostaria de voltar a ser mecânico, mas agora não há ofertas boas”, conta.
Quando a sala de espera do CAT começa a se esvaziar no fim do dia, um rosto com um sorriso tímido se assoma na escada do local. É Zilene Abade, de 40 anos, irmã de Fábio. Depois de passar um ano desempregada, ela foi chamada para ser atendente de uma franquia de cafeteria. “Já estava quase desesperançada, um pouco pela minha idade, já que geralmente preferem empregados mais novos e porque vou precisar de duas conduções para chegar no local. Até isso é fator para excluir um candidato”, conta ela que recebe um abraço do irmão. Fábio sabe que as perspectivas para os desempregados não são as melhores no momento: a taxa de desocupados bateu recorde e atingiu 12,3 milhões de brasileiros no ano que passou. Já leu no jornal e escutou na TV que a retomada do empregos vai começar só no fim do ano ou pior, talvez , só em 2018. Em uma economia incerta como a do Brasil, o novo emprego de Zilene é uma pontinha de esperança nos seus planos.
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