Sean Nevins | Mint Press News | Washington - 18/07/2015 - 06h00
Presidenciáveis como Jill Stein, candidata pelo Partido Verde norte-americano, buscam convencer eleitores com novas propostas e mudar sistema que privilegia democratas e republicanos, que se revezam na Casa Branca desde 1854
Miljøpartiet De Grønne / Flickr CC
Jill Stein, candidata pelo Partido Verde à Presidência dos Estados Unidos em 2012, volta à disputa em 2016
A eleição presidencial nos Estados Unidos está se mostrando algo entediante para a população norte-americana, com as dinastias Bush – representada por Jeb, no Partido Republicano – e Clinton – representada por Hillary, no Partido Democrata – se preparando para assumir as rédeas do sistema capitalista corporativo do país. Muitos acreditam que este quadro gerará apenas a ilusão da escolha, em um duopólio que oferece bem pouco em termos de mudanças realmente significativas.
"Precisamos de alguém que desafie este sistema; não com a expectativa de que um terceiro candidato ganhe a eleição, mas de que ajude a mudar o curso do debate", diz Rocky Anderson, que foi prefeito de Salt Lake City, no estado de Utah, de 2000 a 2008, e candidato presidencial em 2012 pelo Justice Party (Partido da Justiça). O objetivo declarado então por seu partido era remover a influência corporativa sobre a política e colocar em foco debates sobre temas importantes como o complexo militar-industrial, a tortura e o sistema carcerário dos EUA.
Anderson diz que não será candidato nas eleições programadas para novembro de 2016, mas salientou que mais candidatos são essenciais, pois quando há um movimento político genuíno por trás deles, eles têm o poder de transformar a natureza da corrida presidencial, acredita.
Ele deu como exemplo Theodore Roosevelt e Ross Perot: Roosevelt concorreu à presidência dos EUA em 1912 pelo Partido Progressista, obtendo o segundo lugar, com 27,4% dos votos, e superando o candidato republicano, William Taft – Woodrow Wilson, o candidato democrata, acabou vencendo a eleição. Perot se candidatou como independente em 1992 e pelo Reform Party (Partido da Reforma) em 1996, obtendo 18,9% e 8,4% dos votos, respectivamente.
Anderson argumenta que, mesmo que eles não tenham vencido as eleições, estes candidatos acabaram por se mostrar vencedores, já que suas ideias se tornaram tão populares que os partidos principais acabaram cooptando-as. No caso de Roosevelt, essas ideias acabaram se tornando políticas públicas. "Os candidatos principais perceberam que precisavam adotar políticas como a jornada de trabalho semanal de 40 horas, o fim do trabalho infantil e a criação de aposentadorias", disse.
Quanto a quem estará incumbido desta tarefa nas próximas eleições, Anderson diz apoiar Bernie Sanders, senador do estado de Vermont pré-candidato à Presidência, mas diz ter se decepcionado por Sanders concorrer às prévias democratas em lugar de escolher um terceiro partido.
"Dependerá então da candidata Jill Stein e do Partido Verde a conscientização do público e a construção de um movimento de longo prazo", acredita.
Stein é a mais importante dentre as candidaturas de partidos menores concorrendo ao posto no Salão Oval em 2016. A médica e militante das áreas ambiental e de saúde também foi candidata presidencial pelo Partido Verde em 2012.
Outro potencial candidato favorecido por muitos eleitores liberais nos EUA é Gary Johnson, que também concorreu à Presidência em 2012 e foi governador do estado do Novo México entre 1995 e 2003. Não está claro se ele concorrerá no próximo ano.
Gary Johnson, candidato presidencial nos EUA em 2012 pelo Partido da Justiça. Foto: John Cruz / Facebook
Johnson realizou sua campanha tendo como base ideias populares entre os liberais, como a abolição do imposto sobre renda, da tributação de empresas e da Receita Federal, substituindo-as por um imposto federal sobre o consumo, que ele chama de "imposto justo".
Ele também chamou a atenção para as guerras norte-americanas mundo afora e suas consequências desastrosas. Em 2012, Johnson declarou: "Temos que parar com nossas intervenções militares. Temos que parar com os ataques com drones. Temos que parar com políticas que criam centenas de milhões de inimizades para este país, inimizades que não existiriam se não fossem por essas mesmas políticas. É sabido que quando falamos sobre ajudar outros países, trata-se de apoiar ditadores que estão do nosso lado".
A posição de Johnson, que também inclui a oposição ao cerceamento das liberdades civis, à vigilância estatal e à militarização da política, pode ser apoiada também pelo Partido Verde. No entanto, os dois partidos divergem com relação à política econômica.
O Partido Verde tem um projeto econômico e ambiental, chamado "Green New Deal" [“Novo Acordo Verde”, em tradução livre], que propõe uma transição integral para energias renováveis até 2030.
A candidata Jill Stein explica a motivação do projeto: "Nós temos uma emergência climática e uma emergência econômica". Ela disse que as duas crises estão relacionadas e precisam ser tratadas conjuntamente, ou não serão resolvidas.
O "New Deal Verde" é uma referência aos programas sociais e econômicos iniciados pelo então presidente Franklin D. Roosevelt entre 1933 e 1938, que ajudaram os EUA a se recuperar da quebra da bolsa em 1929 e da Grande Depressão. É um plano de quatro etapas que propõe um programa de criação integral de empregos em todo o país, uma transição para atividades econômicas ecologicamente sustentáveis e o desenvolvimento de uma nova infraestrutura, com baixas taxas de emissão de carbono, além da aprovação, reformulação e invalidação de diversas leis, a fim de criar um país mais democrático.
O plano alega que 25 milhões de empregos podem ser criados por meio de um programa federal que garanta "um cargo com salário mínimo para cada americano que deseje e esteja apto a trabalhar". O programa defende os direitos trabalhistas, um sistema de saúde público, um sistema educacional público livre de mensalidades, residências a custo acessível e impostos justos.
Para Stein, a transição proposta para uma economia verde depende de um governo que invista em soluções ambientalmente corretas para os problemas climáticos, como a poluição e a dependência excessiva de combustíveis fósseis, que já se demonstrou um incentivo a guerras para países dependentes do petróleo, como é o caso dos EUA.
"A ideia é que, implementando o New Deal Verde, nós não apenas reacenderíamos a economia, como também resolveríamos a crise climática, o que por sua vez torna as guerras por petróleo obsoletas, já que a principal motivação da política externa norte-americana hoje é a busca por novas fontes de energia, além da dominação econômica e militar do planeta, o que é um paradigma insustentável", diz Stein.
Shannon Kringen / Flickr CC
Kshama Sawant, vereadora de Seattle pelo partido Alternativa Socialista, durante campanha em março de 2014
Ela também afirma que sua plataforma aborda a questão dos direitos humanos e o movimento Black Lives Matter [“As Vidas das Pessoas Negras Importam”, em tradução livre], incluindo a questão do racismo e dos grupos de supremacia branca, com os quais o movimento lida atualmente.
"O que o Black Lives Matter faz é insistir que olhemos para a totalidade do problema", diz Stein, complementando: "Não é tão complexo resolver isso".
Quanto aos altos índices de violência policial que se tornaram públicos ao longo dos últimos anos, em razão das mortes de pessoas negras desarmadas pelas mãos da polícia norte-americana, Stein defende soluções de curto prazo para aliviar alguns dos problemas entre a polícia e as comunidades locais.
"Precisamos que as comunidades tenham o poder de controlar sua polícia", diz Stein. "Temos que ter comissões cidadãs de controle, que seriam comissões de avaliação da polícia integradas por cidadãos, e realizar investigações em forças policiais que comecem a demonstrar violência e racismo".
Segundo Stein, soluções de longo prazo incluiriam trabalhar por justiça econômica, criação de escolas de qualidade em todas as regiões urbanas, garantir o acesso à saúde pública e a preservação dos direitos humanos, e abolir a guerra às drogas, o estado prisional e a linha-direta escola-prisão para a juventude pobre e negra.
Embora muitas destas reformas possam parecer ótimas para uma ampla gama de eleitores norte-americanos, um candidato de um terceiro partido nunca foi eleito para o maior cargo executivo do país. Millard Fillmore foi a última pessoa a ocupar o Salão Oval que não era nem democrata, nem republicano. Mas seu mandato, que durou entre 1850 a 1853, não foi muito representativo de um terceiro partido: Fillmore era membro do Whig Party, antecessor do Partido Republicano.
A eleição de 2012 teve como resultado menos de 1% de votos tanto para o Partido Verde (Green Party), quanto para o Partido da Justiça (Justice Party) e para o Partido Libertário (Libertarian Party), o que levanta dúvidas sobre se o apoio a um candidato de tais partidos é uma postura racional.
"Acho que há certo pessimismo e derrotismo entre alguns ativistas, que pensam que a enorme quantidade de dinheiro de que nossos oponentes dispõem torna nossos esforços irrelevantes", diz Philip Locker, diretor da campanha de Kshama Sawant, vereadora de Seattle, e porta-voz da Alternativa Socialista.
A Alternativa Socialista (Socialist Alternative) é um partido político marxista que conseguiu eleger Sawant como vereadora de Seattle em 2013. Ela foi a primeira socialista independente eleita em uma cidade grande norte-americana após muitas décadas, e a primeira a ocupar um cargo na Câmara Municipal de Seattle há mais de um século.
Segundo Locker, para um candidato de um partido alternativo vencer uma eleição, o ponto-chave é construir um movimento representativo de suas origens, que no caso de Sawant eram os trabalhadores de Seattle.
Ele afirma que há grandes obstáculos estruturais para um candidato da esquerda, já que a sociedade favorece políticos patrocinados pela classe alta e pelas grandes corporações, cujo auxílio vem principalmente na forma de doações financeiras.
No entanto, diz ele, "é possível conseguir uma quantidade significativa de dinheiro se os trabalhadores forem inspirados pela campanha e se convencerem de que ela é do interesse deles. Organizamos uma campanha que envolveu 400 pessoas. Recebemos doações de cerca de 1.500 pessoas e juntamos 160 mil dólares sem aceitar um único centavo de qualquer empresa grande".
Richard Conlin, o candidato oponente, gastou 260 mil, diz Locker.
"Não seríamos capazes de juntar mais dinheiro do que nossos adversários, mas conseguimos o suficiente para financiar uma campanha robusta e transmitir nossa mensagem para a maioria dos trabalhadores, que eram nosso público", conta.
Um componente importante da campanha foi a imprensa. Locker enfatiza que Sawant foi negligenciada pela mídia, inclusive pela mídia independente, até ter conseguido obter o apoio que impossibilitou que continuasse sendo ignorada. "Ela nunca teria feito nenhum progresso se dependêssemos da generosidade da imprensa", diz.
Um dos poucos veículos que apoiaram Sawant foi um jornal semanal alternativo de Seattle chamado The Stranger. Locker defende, entretanto, que é preciso muito mais do que o apoio de um semanário alternativo.
Ele propõe que o movimento operário e organizações progressistas criem seus próprios veículos midiáticos independentes, tratando das questões pertinentes aos trabalhadores e de movimentos progressistas. "Fundamentalmente, este é o ponto de vista que nós, como socialistas, temos. Democratizar a mídia significa que tem de haver veículos de imprensa que representem os interesses dos 99%", diz Locker.
A candidata do Partido Verde, Jill Stein, tem uma opinião semelhante à de Locker no que diz respeito à atenção midiática à campanha. "Desde muito cedo em nossa campanha estamos sendo acompanhados por veículos de mídia independente para os quais precisamos provar nosso potencial. Eles precisaram ver o que éramos capazes de fazer e o que nos orientava para que percebessem que éramos a opção certa", diz ela.
Connie Ma / Flickr CC
Debate presidencial alternativo em 2012: Jill Stein (Partido Verde), Rocky Anderson (Partido da Justiça), Virgil Goode (Partido da Constituição) e Gary Johnson (Partido Libertário)
Os candidatos presidenciais alternativos criticam problemas estruturais no sistema político norte-americano que precisam ser tratados. Jill Stein, Gary Johnson – possível candidato dos libertários – e outros se uniram em uma causa judicial contra o sistema bipartidário.
O processo contra a Comissão Eleitoral Federal busca abrir os debates entre candidatos presidenciais para os demais partidos. Os requerentes alegam que a Comissão sobre Debates Presidenciais, que limita o número de candidatos permitidos no evento, não está sendo regulada adequadamente pelo órgão.
O processo afirma: "É pouco provável que o povo norte-americano tenha a chance de eleger um candidato independente, já que o sistema político está calibrado em favor de democratas e republicanos. Os dois principais partidos criaram uma série de regras antidemocráticas que impedem que os norte-americanos sejam informados sobre candidatos que eles podem vir a preferir em detrimento dos candidatos destes dois partidos".
"Nós precisamos lutar a batalha eleitoral tanto quanto batalhas baseadas em problemas específicos. Se não fizermos isso, todo o nosso trabalho nas ruas, na comunidade, nas escolas, nos locais de trabalho, pode ser apagado em um piscar de olhos", diz Stein.
Tradução: Henrique Mendes
Matéria original publicada no site norte-americano Mint Press News, via OPERA MUNDI
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