Para Ann Pettifor, que comandou campanha pelo perdão da dívida dos países pobres, esquerda deveria encabeçar campanha por reforma estrutural
A lenta recuperação das economias norte-americana e europeia deve provocar efeitos negativos sobre o Brasil e os países emergentes, que terão de “disputar” investimentos com os mais desenvolvidos. A avaliação é da economista sul-africana Ann Pettifor, diretora das entidades Advocacy International (Advocacia Internacional) e Prime (de consultoria e pesquisas em macroeconomia), ambas com sede em Londres. Em entrevista a Opera Mundi, ela disse acreditar que uma nova crise, impulsionada pelo setor privado, é inevitável, pois falta “vontade política” para promover reformas econômicas estruturais.
“A próxima crise global será uma repetição do que já vivemos. Eu não posso prever quando, mas não está muito distante. Porque nós não aprendemos a lição. (...) O cenário é de instabilidade e os países em desenvolvimento continuam a sofrer os impactos das políticas norte-americanas”, disse.
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Defensora da adoção de medidas de controle de fluxos capitais entre países, Ann Pettifor é uma das mais respeitadas especialistas do Reino Unido, com colunas frequentemente publicadas em veículos como o The Guardian e o Huffington Post UK. Entre o final dos anos 1990 e o fim do ano 2000, ela liderou o movimento chamado “Jubilee 2000”, uma campanha global pelo perdão da dívida dos países pobres. O movimento foi responsável cancelamento de mais de US$ 100 bilhões em dívidas públicas de 35 nações, provocou uma onda de críticas ao G8 e engajou personalidades como o papa João Paulo II, o Dalai Lama, o cantor Bono Vox (líder do U2) e o boxeador Mohammed Ali.
Para a economista, o Brasil tem demonstrado esforços para tentar controlar o fluxo de capitais, mas sem grande sucesso. A consequência disso é que, como outras economias em desenvolvimento, já sofre com o impacto da previsão de retomada da alta dos juros dos Estados Unidos, o que deve ocorrer na medida em que o Federal Reserve (banco central norte-americano) diminua a injeção de estímulos econômicos - hoje na ordem de US$ 85 bilhões mensais.
A perspectiva de desaceleração de ajuda financeira do FED provocou fuga de investimentos dos países emergentes, segundo dados do IIF (Instituto de Finanças Internacional, na sigla em inglês). Os fluxos de capitais nas 30 principais economias em desenvolvimento devem diminuir 12,6% em 2013 em relação a 2012, previu o instituto, e aumentar em 1,4% nos países desenvolvidos.
“O Brasil não tem conseguido controlar o fluxo de capitais para dentro e fora do país. E essa é uma das consequências do fluxo livre: inflação e desvalorização da moeda”, avaliou. “Esse é o dilema. À medida que as taxas de juros subirem nos países do Norte (EUA e Europa), isso será um problema para países como o Brasil”, destacou Ann Pettifor.
Reforma estrutural
Avessa às medidas de austeridade, como as adotadas recentemente pelo primeiro ministro David Cameron no Reino Unido, Ann elogiou as ações do governo brasileiro para incentivo à economia interna, o que acredita ser uma saída para tempos de crise.
Para a economista, porém, os países em desenvolvimento pouco podem fazer enquanto estiverem atrelados aos interesses do setor privado e de bancos. Ela defendeu que a esquerda adote como campanha mudanças estruturais na forma como a economia tem sido conduzida e alertou para o crescimento de movimentos reacionários e de extrema direita na Europa, o que classifica como uma “resposta irracional” à crise.
“É possível mudar a arquitetura financeira global, mas não há vontade política. Crises provocam mudanças estruturais. A crise de 1929 provocou uma reforma profunda. Mas nós não precisamos escolher a crise, nós não precisamos trilhar esse caminho. Basta nossos políticos acabarem com esse ‘caso de amor’ com a globalização”, defendeu. “Com o controle do fluxo de capitais nós podemos retomar o controle.”
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