Julio García
Da BBC Mundo
Integrantes do grupo Combatentes pela Paz, formado por israelenses e palestinos, pedem o "fim da guerra"
A ofensiva de Israel na Faixa de Gaza, que em pouco mais de duas semanas tirou a vida de cerca de 700 palestinos e ao menos 30 soldados israelenses, é condenada por muitos na comunidade internacional. Mas também há dentro do país quem se oponha à operação.
Estas pessoas formam uma parte minoritária e bastante diversificada da sociedade israelense, segundo especialistas.
Um sinal do descontentamento de um segmento da comunidade judia com a postura de seu governo é um vídeo que se popularizou na internet nos últimos dias. Nele, um jovem judeu americano que protesta em defesa dos palestinos e critica o papel dos Estados Unidos no conflito é preso pela polícia.
O vídeo foi feito há alguns anos, mas a mensagem ainda se mantém válida e reflete o sentimento de judeus que repudiam as ações israelenses contra os palestinos.
Ainda que não necessariamente apoiem o Hamas, o grupo palestino engajado em combates com Israel, estes ativistas argumentam que não há provas de que o movimento seja culpado pela morte dos três adolescentes israelenses que serviu de estopim para o recente conflito.
'Ocupação'
Uma das organizações críticas a Israel é a Rompendo o Silêncio, formada por soldados israelenses decepcionados com sua experiência. Seu porta-voz, Eran Efrati, um ex-soldado de 29 anos que vive em Jerusalém, considera um "massacre" a campanha de seu país em Gaza.
Para ele, "há um cerco de mais de dez anos a Gaza e uma ocupação de mais de 65 anos". "Estamos oprimindo seres humanos e, claro, devemos esperar resistência", afirmou.
Manifestantes dizem que não há provas de culpa do Hamas na morte de três israelenses
Criado em 2009, o grupo Shministim é formado por estudantes do último ano do ensino médio que se opõem não apenas às ações israelenses contra Gaza, mas também ao serviço militar obrigatório, que deve ser cumprido quando se completa 18 anos.
Com a atual crise em Gaza, o governo israelense convocou 75 mil reservistas. Os membros do grupo não querem fazer parte do que definem como um "Exército de ocupação".
"O Hamas é um movimento de resistência. Como qualquer povo ocupado, os palestinos resistem, às vezes com violência, a uma ocupação muito violenta", disse à BBC Maya Wind, que pertenceu a esse grupo e esteve presa em 2010 por se negar a prestar o serviço militar.
Wind ressalta que não concorda com o Hamas. "Não gosto deles por várias razões, mas reconheço que haverá resistência enquanto houver ocupação."
Por outro lado, pondera que o Hamas não foi a causa da ocupação, e sim a sua consequência. "Quando a ocupação terminar, o Hamas acabará."
Hai Ashkenazi, membro do grupo Combatentes pela paz - integrado por israelenses e palestinos que se reúnem uma vez por mês - disse à BBC que o "Hamas é um movimento muçulmano extremista, mas há movimentos ainda mais extremistas".
"Muitos em Israel pensam que é preciso aniquilar o Hamas, mas pode surgir algo pior, como a al Qaeda", afirmou.
"Acredito que devemos dialogar com o Hamas. Acho que eles aceitariam o cessar-fogo e, ainda que não aceitem Israel como país, teríamos uma trégua de dez ou 20 anos, o que seria muito bom."
Pouca influência
Para o coordenador do Instituto Nacional de Estudos de Segurança, em Tel Aviv, Yehuda Ben Meir, os grupos que se opõem à ação em Gaza "são muito pequenos".
"Duvido que representem sequer 5% da população, se tanto", disse ele à BBC.
Ben Meir, coautor de um artigo sobre a opinião pública israelense no tema dos palestinos, afirma que "segundo todos os estudos feitos e as pesquisas mais recentes, mais de 90% da população judia de Israel apoiam a estratégia militar do governo e mais de 80% apoiam a invasão por terra".
Artistas em Tel Aviv, um dos principais alvos dos foguetes do Hamas, também protestaram contra invasão
Ainda assim, destacou Ben Meir, sendo Israel uma sociedade democrática e plural, os grupos tidos como de "extrema esquerda" são livres para se manifestar.
Mas nem todos que se opõem à estratégia de Israel estão à esquerda. Também há um grupo de judeus ultraortodoxos, chamado Neturei Karta (Guardiões da Cidade).
São antissionistas, por assim dizer, que se opõem à existência do Estado israelense por razões religiosas: eles acreditam que, até a vinda do Messias, estão proibidos de ter seu próprio Estado.
Assim como outros grupos de oposição, eles rechaçam o serviço militar obrigatório.
Segundo Ben Meir, "representam uma porcentagem insignificante, de menos de 1% da população".
"Há duas pequenas comunidades em Nova York, nos Estados Unidos, e em Toronto, no Canadá, e talvez 2 mil ou 3 mil pessoas em Israel."
Diferentes visões
Se os grupos que se opões às ações israelenses em Gaza são pouco numerosos, eles apresentam uma variedade de soluções que acreditam ser adequadas para resolver o conflito.
"Temos que abrir a fronteiras, permitir que as pessoas trabalhem, consigam alimentos e outras mercadorias", diz o ex-soldado Eran Efrati. "(Precisamos) dar a eles o controle de seu mar, de entrar e sair à vontade, e então poderíamos esperar algum tipo de processo de paz."
Sydney Levy, da organização americana Voz Judía pela Paz, avalia que "o mais importante obviamente é um cessar-fogo".
"Mas isso não é suficiente. Precisamos acabar com a ocupação israelense em Gaza, libertar os presos políticos e criar condições básicas para a igualdade e para os direitos humanos."
Levy está de acordo com o governo do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu quanto ao direito de Israel de defender seus cidadãos, mas acrescenta que "os palestinos também" estão no mesmo direito.
Nem todos os israelenses apoiam a ação de seu país, mas eles são minoria
Glyn Secker, diretor do grupo britânico Judeus pela Justiça para os Palestinos disse à BBC que a possibilidade de existirem dois Estados, um israelense e outro palestino, é aceita por 67% da população de Israel.
"Claro que existem discussões difíceis sobre os limites destes dois Estados, mas há uma base para um acordo negociado", afirmou.
Já Maya Wind acredita que a solução de dois estados não é viável.
"A Cisjordânia já tem um milhão de colonos judeus e ninguém os tirará de lá. Enquanto isso, cerca de 20% da população israelense são palestinos com cidadania: é impossível separá-los", argumenta.
"O que buscamos é uma democracia de verdade, na qual palestinos e israelenses tenham os mesmos direitos e cidadania em um Estado unificado."
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