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segunda-feira, 13 de julho de 2015

CONLUIO NO JUDICIÁRIO - Ministério Público denuncia conluio de empresário, advogado, juíza e delegado


Um esquema de conluio envolvendo um empresário, um advogado, uma juíza e um delegado de Polícia Civil com o objetivo de enriquecer os envolvidos e obter informações sigilosas será analisado pela Justiça. Na trama, que parece saída de um romance policial, todos utilizam de suas funções e relações para beneficiar o empresário, principalmente num contencioso bilionário contra sua ex-mulher e a família dela.

O enredo está descrito em uma denúncia do Ministério Público de Mato Grosso do Sul contra Luiz Eduardo Aurichio Bottura — empresário e político. A denúncia foi recebida nesta terça-feira (7/7) pelo Juízo da Vara de Anaurilândia (MS), onde tudo aconteceu.   
 
Acusado de liderar o esquema, Bottura foi apontado como pré-candidato a governador do MS pelo PTB, em 2013.
Reprodução

Bottura é figura conhecida no Judiciário nacional. Ele é parte em mais de 3 mil ações em diferentes estados e já foi condenado mais de duas centenas de vezes por litigância de má-fé. Dessa vez, é acusado de formar uma quadrilha em conjunto com seu advogado Eduardo Garcia da Silveira Neto, com a juíza Margarida Elisabeth Weiler e com o delegado Juvenal Laurentino Martins. Bottura nega o conluio e diz que a denúncia é inepta.

O Ministério Público aponta que os denunciados cometeram os mais variados crimes, dentre os quais se destacam corrupção ativa e passiva, violação de sigilos funcionais, interceptações ilegais de comunicações telefônicas e telemática, quebras de sigilos bancários e falsidade ideológica.

A denúncia se baseia em um Processo Administrativo Disciplinar que resultou na aposentadoria compulsória da juíza Margarida Elizabeth Weiler, que era titular na vara de Anaurilândia. Segundo as investigações, no início de 2007 Bottura e seu advogado — que mantinha um relacionamento amoroso com a juíza — decidiram montar o esquema. Para isso, ofereceram vantagens indevidas à Margarida Weiler e ao delegado Juvenal Martins, que aceitaram participar do esquema.

"A referida quadrilha possuía divisões de tarefas, cabendo a Eduardo Bottura indicar as medidas que entendia necessárias para a obtenção de seus interesses para o advogado Eduardo Silveira, o qual acionava o delegado de polícia Juvenal Martins e a magistrada Margarida Weiler, de forma a dar suposta legalidade aos atos praticados", explica o documento do MP-MS.

Assim, eles conseguiram, por exemplo, condenar a ex-mulher do empresário, Patrícia Bueno Netto, e seu pai Adalberto Bueno Netto, a pagarem R$ 100 mil para Bottura a título de alimentos. Além disso, a juíza determinou, sem a oitiva dos requeridos, o arrolamento de inúmeros bens, em decisão proferida dois dias depois de a ação ser ajuizada.

Foi por causa dessa ação, inclusive, que o Ministério Público acusou os envolvidos de falsidade ideológica. Para garantir que o processo ficaria em Anaurilândia, Bottura e seu advogado afirmaram que o empresário morava na cidade. No entanto, além do endereço citado não existir, um mês antes de ajuizar a ação o próprio empresário havia afirmado em uma procuração ao seu advogado que morava em Londres, na Inglaterra.

Nessa mesma ação, narra a denúncia, a juíza determinou ainda a quebra de sigilo bancário da família Bueno Netto sem respeitar as exigências previstas na Constituição Federal e na Lei Complementar 105/2001.

No esquema, Bottura também conseguiu acesso a diversas informações sigilosas de seus desafetos. A prática, segundo a denúncia, ocorria da seguinte maneira: o empresário e seu advogado apresentavam uma denúncia sobre um suposto crime na delegacia. O delegado Juvenal Martins instaurava o inquérito e, sem que houvesse um fato específico a ser investigado, pedia à juíza Margarida Weiler a quebra de sigilos telefônico e telemático, além de buscas e apreensões nas empresas dos acusados. 

"Todas essas medidas foram determinadas sem que nenhuma prova existisse no inquérito policial que levasse à compreensão dos supostos 'crimes' alegados ou do envolvimento das pessoas indicadas. Havia, apenas, a petição e os documentos fornecidos unilateralmente por Luiz Eduardo Bottura e Eduardo Silveira", afirma o MP-MS.

Além disso, durante as atividades do grupo, a juíza forneceu sua senha de acesso ao sistema do tribunal a Bottura e a Eduardo Silveira. Com o acesso ao sistema, ambos começaram a despachar em processos de interesse do empresário, cabendo à juíza apenas assinar. Com a senha de servidores, que foram obrigados pela juíza a ceder o acesso, os dois também conseguiram executar materialmente as determinações judiciais, expedindo ofícios, mandados e cartas precatórias.

Assim, para o Ministério Público, ficou comprovado que, no ano de 2007, os denunciados criaram um esquema de favorecimento de decisões judiciais que visavam ao enriquecimento sem causa dos acusados e à obtenção, por parte de Eduardo Bottura, de informações sigilosas de seus desafetos (sua esposa Patrícia Bueno Netto e seu sogro Adalberto Bueno Netto), e de empresas e empresários.

Conta milionária

As investidas de Bottura contra a família Bueno Netto deram resultado à conta bancária do empresário e político. Em um Habeas Corpus impetrado em São Paulo, buscando o trancamento de outra Ação Penal contra ele, Bottura afirma que "coleciona mais de R$ 130 milhões em indenizações" ao longo de sete anos de ações contra os Bueno Netto e seus assessores de imprensa. Apesar disso, ele segue pedindo — e, muitas vezes, conseguindo — gratuidade de Justiça nas ações que promove.

Por divulgar algumas das centenas de condenações que Bottura sofre, a revista eletrônica Consultor Jurídico já virou um dos alvos do empresário. Assim, viu na prática as técnicas adotadas por ele, como usar longas petições iniciais e apontar endereços falsos dos acusados. No caso da ConJur, cujo endereço consta em diversos espaços no site (Rua Wisard, 23, Vila Madalena, São Paulo – SP), Bottura já disse à Justiça que um editor do site seria encontrado em Araçatuba (a 527 km da capital paulista).

Na última decisão favorável à ConJur, a Justiça de São Paulo concluiu que o empresário tem, sozinho, ajudado a Justiça criminal paulista a construir uma jurisprudência. Suas seguidas derrotas nos processos que ajuíza contra desafetos e quem mais ouse noticiar seus lances já são citadas em bloco no Tribunal de Justiça do estado. Ao proferir seu voto no caso, o desembargador Augusto de Siqueira, listou uma série de acórdãos proferidos pelo TJ-SP em casos similares.

Denúncia inepta

Procurado pela ConJur, Bottura nega que houve conluio e diz que será absolvido ou conseguirá trancar a ação em Habeas Corpus. De acordo com o empresário, ele próprio pediu para o Ministério Público apurasse as acusações em 2012.

Na ocasião, Bottura apresentou uma Notícia de Fato alegando que havia sido condenado "pela mídia" por supostamente ter se associado à juíza Margaria Weiler. Bottura então pediu ao MP-MS que fosse instaurado um procedimento oficial para que o caso fosse analisado pelo Judiciário.

No entanto, ao arquivar o pedido de Bottura, o Ministério Público foi categórico: "O pedido feito pelo Requerente de que seja 'instaurado um procedimento oficial para que ele seja condenado ou absolvido pelo Judiciário e não pela mídia', não tem cabimento algum". Segundo o MP-MS Bottura não apresentou um fato que justificasse a investigação.

Com relação a nova denúncia, o empresário diz que esta é inepta. "Não apontando sequer como teria ocorrido o crime de corrupção. O que se pagou? Como? Corrupção sem oferecimento de vantagem alguma?", questiona. Além disso, afirma que entre 2007 e 2010 morou em Anaurilândia e que é casado desde 2008 com uma cidadã natural do município.

Quanto às acusações de quebras de sigilo indevidas, ele afirma que todas foram feitas "com ordem judicial devidamente motivada e com parecer do MPE favorável, inclusive em segunda instância".

Clique aqui para ler a denúncia do MP-MS.
Clique aqui para ler a decisão que recebeu a denúncia.
0800168-68.2015.8.12.0022


Fonte: Revista Consultor Jurídico, 13 de julho de 2015, 14h06

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