Os gafanhotos eram chamados “cavalos-do-diabo”.
ENEDINO BATISTA RIBEIRO – Gavião-de-penacho – IHGSC + ALESC/Fpolis-SC/1990, vol. 1, p. 318/319, discorreu sobre o assunto, apontando os tatus como predadores do inseto:
Quanto às caçadas de tatu, certa vez aconteceu uma coisa interessante. Eu gostava muito da carne desses animais, e minha querida mãe, então, adorava-a; além disso era recomendada pelos médicos por ser branca, muito leve e de fácil digestão.
Pois muito bem.
Uma noite fui à caça dos tatus com vários companheiros. Tivemos sorte: matamos um grande tatu capoeira e um militão. Na véspera tinha-se abatido sobre os campos e as plantações de Lages uma “nuvem” formidável de gafanhotos , levando de roldão a verdura encontrada em sua passagem.
Pela manhã, a comadre Selvina, indo escalar os tatus, teve a “triste ideia” de me chamar lá no arroio onde destripava os tatus para me mostrar como seus estômagos estavam arrebentando de cheios: era uma massa incontável de gafanhotos, que os tatus tinham ingerido; os insetos gosmosos, já meio digeridos, tinham um aspecto nojentíssimo; já me deu ânsia de vômito ali mesmo; nunca mais pude comer carne de tatu. Quando vejo essa caça na mesa, logo me lembro daquela asquerosa geléia de gafanhotos, e não posso comer.
O interessante é que, chegando em casa, e mostrando os tatus à minha mãe, contei-lhe a “porcaria” dos gafanhotos, para que ela resolvesse se comia ou não aquele bicho “porco”.
- Uai, meu filho! Que isso tem de nojento? Gafanhoto era até comida de São João Batista! Agora é que eu vou comer os tatus com gosto, bem salgadinhos e cebolados. Muito obrigada pelo presente!
Cruzes! Virei a cara e cuspi pro lado. Deixa lá que minha mãe tinha carradas de razão. Todavia, nunca mais fiz as pazes com carne de tatu.
- JACQUES LE GOFF e JEAN-CLAUDE SCHMITT – Dicionário temático do Ocidente medieval – EDUSC/Bauru-SP/2002, Vol. I, p. 65, afirmam que “o universo dos invertebrados pouco chamou a atenção, exceto alguns flagelos visíveis, por exemplo, as grandes invasões de gafanhotos dos séculos VI, IX (em 873), XII e XIV ou o popular de parasitas prejudiciais à agricultura (gorgulhos). O conhecimento das formigas, cupins, moscas ou cochonilhas não incitava a estudar os anófeles, vetores então desconhecidos de febres e malárias, e ainda menos as minhocas, cujo papel nos campos era inteiramente desconhecido”.
O gafanhoto, em hebraico é “ARBÊ, cfe. ALAN UNTERMAN - Dicionário Judaico de Lendas e Tradições - Jorge Zahar Editor/RJ/1992, p. 104: (...) Algumas subespécies de gafanhoto são kosher e podem ser comidas de acordo com as leis dietéticas judaicas, mas na prática só as comem os judeus originários de países onde se estabeleceu a tradição, como o Marrocos e o Iêmen. Os ovos de gafanhoto são mencionados no Talmud como remédio popular para dor de ouvido, assim como a flor da ABOBREIRA.
- JABOATAM - Novo orbe seráfico brasílico (...) - Tip. Brasiliense/RJ/1858, vol. 1, p. 200:
Saõ as Roças, ou Mandiocas, o comum sustento de todos os que vivem no Brazil; e naquellas partes do Maranhaõ muy infestadas da immundicie dos gafanhotos, mais, ou menos, conforme as Estaçoens do tempo, e mudança deste, produz a terra infinidade desta praga, que levantando-se dos lugares, em que se criaõ, em nuvens espessas, onde se assenta hum exercito destes, queimaõ, e arrazaõ sem reparo, em muy poucas horas, toda a lavoura, sobre que cahem.
Assolaraõ estes naquelle anno todas as Roças dos Tupynambazes rebeldes, e naõ convertidos, deixando intactas, e sem offensa as dos ja reduzidos, e Catholicos, com a circunstancia notavel, que circulando os ares aquelles volantes exercitos, passavaõ pelas lavouras dos Gentios ja convertidos, sem as offenderem, e hiaõ fazer assento, e destruir a dos Rebeldes, e Pagaõs. Este prodigio notado, como tal, por todos os Indios, porque he gente em grande maneira crédulla em similhantes casos, a que elles chamaõ agouros, foy hum despertador fortissimo para que muitos daquelles se convertessem á Fé, e ficassem os que ja o estavaõ mais confirmados (português da época).
- (...) Adeney de Freitas Bueno, da Embrapa, diz que o crescimento excessivo da população de gafanhotos é estimulado pelo clima quente e seco associado a um desequilíbrio ambiental provocado pelo uso excessivo e incorreto de agrotóxicos nas lavouras.
Segundo ele, o manejo incorreto de inseticidas destrói agentes que são controladores naturais do crescimento de insetos e da proliferação de pragas. Esses agentes naturais são, por exemplo, os sapos, pássaros, bactérias e fungos.
“Há fungos, por exemplo, que são responsáveis por causarem doenças que matam os percevejos e gafanhotos. E, quando você usa incorretamente os agrotóxicos, você destrói todos esses microrganismos que seriam importantes para controlar, naturalmente, o crescimento da população de insetos”.
“É como o nosso organismo. Se você tomar muito antibiótico, você destrói bactérias que são importantes para o nosso organismo”. (...)
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