Educação infantil, o profundo atraso da América Latina
A despesa pública anual por estudante em formação inicial ronda os 4.500 reais, um terço a menos que a média da OCDE
ISABELLE SCHAEFER Cidade do México 26 ABR 2014 - 15:30 BRT
Uma escola no México durante as férias. / EL PAÍS
O investimento em educação é, sem dúvida, um dos mais rentáveis do mundo. No entanto, a despesa pública em educação infantil por estudante latino-americano é de apenas um terço do investimento feito nas nações desenvolvidas.
No México, a despesa anual em instituições públicas de educação infantil (desde os 3 anos) por estudante foi de 4.970 reais em 2010. Na Argentina foi de 5.441 reais e no Brasil de 4.733 reais, no mesmo ano. Se comparamos, a média da OCDE foi de 14.069 reais em 2010, segundo cálculos da própria organização.
Estas cifras e algumas evidências científicas desanimadoras levaram os especialistas a recomendar que mais recursos sejam dedicados aos primeiros anos de vida porque “as crianças não estão aprendendo muito, e isso ocorre porque entram na escola com atrasos muito grandes”, como é o caso do México, de acordo com Ciro Avitabile, especialista em educação do Banco Mundial.
Esses atrasos –afirma- são de tipo cognitivo, isto é, a capacidade de concentração ou de memorizar palavras por exemplo, e até não-cognitivos, como a capacidade de superar desafios ou ter autocontrole. Os estudos demonstram que até 80% da arquitetura cerebral se desenvolve durante os 1.000 primeiros dias de vida de um ser humano. E nesta etapa é mais fácil fechar as brechas que se evidenciam mais adiante -por exemplo, no colégio- entre crianças ricas e pobres, ou entre crianças da cidade e do campo.
Conscientes desta problemática, os governos da região estão realizando um árduo trabalho de formação infantil que começa praticamente desde antes do nascimento.
Enedelia Maya Castañeda e seus três filhos vivem isso na pele.
A jovem mãe do município de Agua Blanca, no centro do México, participa com entusiasmo das oficinas organizadas pelo Conselho Nacional de Fomento Educativo (CONAFE) sobre a importância de estimular e jogar com as crianças para que aprendam habilidades básicas nos primeiros anos de vida. Nas oficinas onde cantam, jogam ou aprendem números, cores e formas, e também se instrui os pais e mães, cerca de 460.000 crianças, entre elas as que vivem em comunidades rurais ou que estão marginalizadas, são atendidas. O Banco Mundialapoia há vários anos o trabalho do CONAFE.
Mais lucro que na bolsa
Não se trata unicamente do conhecidíssimo senso comum de que se educar é bom para o futuro, mas de que há números relevantes que confirmam que a educação nos primeiros anos de vida é fundamental.
Uma análise do programa Perry de Educação Pré-escolar para famílias com baixos recursos nos EUA encontrou, por exemplo, que investindo 100 dólares na educação de uma criança dentre 0 e 4 anos, o retorno médio oscila entre 7 e 10 dólares anuais (15 e 22 reais), considerando os melhores resultados trabalhistas e uma menor taxa de criminalidade. A mesma quantidade investida na bolsa de valores daria um retorno médio de 6,9 dólares anuais (15,50 reais).
Este raciocínio funciona também quando se compara a educação inicial, não com a bolsa, mas com o investimento em educação primária ou secundária, por exemplo. “De todos os investimentos que podem ser feitos em educação, a educação infantil tem o retorno mais alto”, explica Avitabile.
Os esforços nos primeiros anos de vida significam que estas pessoas terão melhores oportunidades de estudo, acesso a melhores empregos e muitos deles não cairão na violência ou no crime organizado. Trata-se, portanto, de um investimento rentável para as pessoas e para a sociedade.
Desde alguns anos este tema vem recebendo mais atenção. Há vários exemplos na região. Na Argentina: um programa do governo está focado na educação em comunidades rurais, incluindo a educação infantil. Com melhores equipes, infraestrutura e capacitação de docentes nas escolas, as crianças recebem também mais oportunidades.
Além disso, para que todas as mães e seus filhos recebam também o seguimento médico necessário, o programa NACER (Nascer) oferece serviço médico gratuito às crianças até os 6 anos e mães sem seguro. Na Jamaica, por outro lado, um “passaporte” para o desenvolvimento infantil permitirá continuar o desenvolvimento das crianças. Originalmente concebida somente para a saúde, a estratégia consiste em acompanhar o desenvolvimento da criança de sua primeira visita pré-natal até a educação pré-primária. O passaporte conta com contribuições médicas e educativas de profissionais.
No Chile, o sistema Crece Contigo monitora as crianças desde o crescimento pré-natal até que entrem na escola aos 5 anos de idade. No Equador existe o programa Creciendo con nuestras guaguas(Crescendo com nossas crianças) para ensinar aos pais a vigiar os progressos na saúde e nutrição até os cinco anos.
Fonte: http://brasil.elpais.com/
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