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quarta-feira, 30 de abril de 2014

União político-sindical-empresarial chantageia por bondades às montadoras

indústria, Brasil

Em 2013, as montadoras brasileiras bateram uma alta de quase 10% na produção de unidades sobre 2012, totalizando 3,74 milhões de veículos. Quatro meses depois, uma queda de 2,1% nas vendas do primeiro trimestre já faz o setor correr atrás das bondades do governo.

O roteiro é velho conhecido: o inchaço no comércio em 2013, como em outros anos, sempre é garantido à base de uma ajuda extra, como a que agora se discute.
Às custas do contribuinte, no último ano fiscal a renúncia na arrecadação com o prorrogamento da redução do Imposto sobre Produtos Industrializado (IPI), de abril a dezembro, alcançou R$ 2,2 bilhões. Não que esse dinheiro, no cofres do Tesouro Nacional, necessariamente todo ele seria melhor empregado. O governo gasta mal, outra parte se perde nos ralos da pouca vergonha, mas que ao menos as contrapartidas fossem exigidas – e cobradas.
Tanto é verdade que o pequeno freio no mercado de janeiro a março – sobre o recorde de produção em 2013, reitera-se –, já foi motivo de férias coletivas, suspensão de contrato de trabalho, redução de jornada e folgas programadas sobre a população de mais de 150 mil empregados. Gatilho da chantagem: demissões à frente se nada for feito a favor da indústria.
Como se a única contrapartida que interessa é a manutenção do emprego, ainda que não haja justificativa para demissões, como antes, desde que as empresas se dispusessem a espremer um pouco mais a suas margens. E também diminuíssem o repatriamento de lucros e dividendos às matrizes, que em 2013 chegou a US$ 3,3 bilhões, nada igual aos US$ 5,6 bilhões de 2011, mas novamente em ritmo de elevação na comparação com 2012.
Porém, eis aí um componente político na questão dos postos de trabalho. Com tamanha massa de mão-de-obra direta, mais a agregada na cadeia automobilística com destaque para as empresas de autopeças, além da indireta que gravita em torno do setor, o governo teme a repercussão negativa nas urnas, ainda mais que os índices de emprego são dos poucos motivos que hão para comemorar. Leva-se em conta que a hoje mais pulverizada nacionalmente indústria automotiva ainda tem boa concentração nas cidades do ABC paulista, berço do movimento sindical que deu vida ao PT e ainda o sustenta na região.
Então, esse mesmo lado político-sindical, que ainda mantém o insosso discurso de fachada contra o capital, na falta de coisa melhor a fazer, mancomuna-se com os capitalistas internacionais na chantagem. E passam o chapéu em Brasília para ajudar os símbolos do capitalismo brasileiro desde os tempos de Juscelino Kubitschek, o pai da indústria automobilística nacional. Às custas do contribuinte, é claro, às favas com a ideologia e com o resto da classe trabalhadora de setores não bafejados pela sorte política e que vão minguando.
Reconhece-se que não é de agora essa aliança, muito menos o amém do governo. Vem de longe, de todos os matizes. Brasília sempre se rendeu. Nos últimos 11 anos, no entanto, a situação – amparada por esse suporte político-sindical –, foi longe demais, com a escandalosa ajuda dos governos estaduais que concorrem com terrenos e subsídios para a instalação de fábricas.
A participação das montadoras – 26, com 53 plantas, segundo a Anfavea, entidade setorial –, foi de 12,5% para 18,2% do PIB, de acordo com estudo de Nara Simone Roeche, especialista em políticas industriais para a cadeia automotiva e professora da PUC do Rio Grande do Sul. Nada menos que 45,6% de expansão, na contramão do encolhimento do setor industrial como um todo, que de 27,2% de peso no produto nacional voltou aos patamares de antanho, valendo 13,3%, em cômputo feito pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo. Se os números não são exatamente assim, estão perto disso.
Pari passu, o ganho de eficiência e competitividade, a incorporação de mais tecnologia e melhoria da segurança dos veículos de passeio e de carga aqui produzidos foram sofríveis. Nem os índices de emissão de monóxido de carbono, iguais aos que as mesmas montadoras oferecem nas suas matrizes foram atingidos; até há pouco quase que as montadoras conseguem protelar a exigência de air bags em todas as unidades não fosse a gritaria geral dos órgãos de segurança; e agora as empresas já querem empurrar para a frente colocação de rastreadores.
A lista de contrapartidas corriqueiramente anunciadas e nunca atingidas é enorme.
A desculpa maior dos últimos meses: em paralelo à redução das vendas no mercado brasileiro, a Argentina está deixando de comprar. Ora, que cobrem do governo medidas para destravar as exigências do parceiro, no âmbito do Acordo Automotivo do Mercosul que dá vantagens às montadoras (as mesmas, claro) de lá, que, junto com a crise econômica, empacam as importações de carros do Brasil. Que cobrem também, por exemplo, uma profunda reforma fiscal no País, derrubando custos de produção em cascata.
Quando o mercado ia bem, as multinacionais sobre rodas não reclamavam, relegaram ganhos de competitividade e praticamente saíram dos mercados mais exigentes. Conclusão: cerca de 80% das exportações seguem para o complicado vizinho.
Se o pacote de bondades que pode sair nos próximos dias se restringir às medidas de oxigenação do crédito bancário, como a flexibilização da exigência feita aos bancos de provisionamento de 75% do valor dos financiamentos de prazos mais longos, e, portanto, redução dos juros, menos mal. Não haverá sangramento do erário público. O problema é do consumidor.
A questão é que isso não é garantia de retomada das vendas. E aí a chantagem pode recomeçar em plena safra de eleições. E novos mimos podem ser sacados – ou rediscutidos. Pouco debatido na imprensa foi, há alguns dias, a indecência de se usar o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) para pagar fração dos salários dos funcionários com jornada reduzida, conhecido pelo pomposo anglicanismo de lay-off.
Por sinal, ninguém garante que nos bastidores desse conluio político-sindical com o capital essa proposta indecorosa foi abortada.

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