10/10/14 10:20
A seguir, trechos do artigo intitulado “Pelo fim da delação premiada”, de autoria do presidente do Instituto de Defesa do Direito de Defesa, advogado Augusto de Arruda Botelho, publicado nesta sexta-feira (10), na Folha:
As ressalvas morais ao comportamento dos alcaguetes escondem um mal que me parece bem maior: acabam por colocar em segundo plano o que realmente está por trás da delação premiada –o sombrio e triste percurso percorrido para se chegar até a decisão do réu de optar por ela.
A delação, ao contrário do que certos “advogados” propagandeiam, não tem sido uma opção voluntária do acusado. A caguetagem, na prática, é uma imposição, uma coação legitimada por juízes e promotores que, antes de oferecerem a “benesse”, impingem ao cidadão uma série de atrocidades.
Antes da delação vem a prisão ilegal, antes da prisão ilegal vem a condução coercitiva ilegal, antes dela, muitas vezes, vem a interceptação telefônica ilegal, e por aí uma série de ilegalidades.
Quando uma prisão (ilegal) finalmente é consumada, aí começa a tortura. Não, aqui não uso uma figura de linguagem. A tortura ocorre, sim, tanto psicológica quanto física. Ameaçam o preso com a prisão (mais ilegal ainda) de seus familiares, ameaçam o preso com transferências arbitrárias de unidade prisional, ameaçam o preso com manchetes de jornal declarando não sei quantos anos ele pegará de cadeia caso não ceda e revele fatos que sabe, ou que muitas vezes não sabe, mas ouviu dizer –ou mesmo supostos fatos que não passam de deslavadas mentiras.
O que chega aos olhos de quem não transita pelo mundo da Justiça criminal é apenas um retrato colorido do resultado da farsa. O criminoso, antes um pária que precisava ser encarcerado em regime de segurança máxima, resolve reavaliar a conduta de sua vida e com isso abrir o bico. Quase como se a prisão servisse como um spa da consciência.
Fonte: http://blogdofred.blogfolha.uol.com.br/
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POR FREDERICO VASCONCELOS10/10/14 07:51
A seguir, trechos de artigo de autoria do criminalista Luiz Flávio Gomes, sob o título “O que é Delação Premiada:
Paulo Roberto Costa, ex-diretor da Petrobras, acaba de fazer um acordo de colaboração premiada (incluindo-se delações) com a Justiça brasileira.
Negociou com delegados e o Ministério Público, confessou vários crimes, delatou pessoas, indicou contas bancárias fora do Brasil, prometeu devolver o dinheiro surrupiado ilicitamente (cerca de R$ 70 milhões) e tudo foi homologado pelo ministro Teori Zavascki, do STF. O que é isso?
É a “plea bargaining” norte-americana, introduzida agora de forma mais sistematizada no ordenamento jurídico brasileiro sob o nome de colaboração premiada (que é a “plea bargaining” brasileira). Dos EUA estamos copiando esse instituto. Do Brasil os EUA estão copiando a desigualdade (de renda e de capital). Norteamericanização e brasilianização do mundo.
Pela lei brasileira, a colaboração pressupõe uma organização criminosa. Para outros crimes, fora do crime organizado, vale a Lei 9.807/99 (Lei de Proteção às Vítimas e Testemunhas). Ou seja: tudo pode no campo criminal terminar em acordo.
A diferença é que na lei do crime organizado o promotor pode inclusive deixar de denunciar o réu colaborador. Essa possibilidade da lei especial deve ser estendida para a lei geral? Se no mais (no crime organizado) pode o promotor abrir mão da ação penal (pode deixar de denunciar), porque no menos isso não seria possível?
Um milhão de questionamentos esse assunto (revolucionário) vai provocar.
(…)
Dentre os pontos controvertidos um merece especial atenção: a negociação criminal, com admissão da culpabilidade, é constitucional?
Note-se que nos juizados criminais o suspeito também faz transação, porém, não admite culpabilidade (continua presumido inocente). Lá vigora o instituto do nolo contendere (não quero litigar, por isso aceito a transação).
Na plea bargaining (original) o réu admite culpabilidade (admite que é culpado). Confessa sua participação no crime e, eventualmente, incrimina outras pessoas (delação premiada). Mas é possível admitir a culpabilidade sem o clássico devido processo legal?
Na original plea bargaining (nos EUA), a negociação se faz entre o promotor do caso e o réu, com presença de advogado. O juiz apenas homologa o acordo. Aqui no Brasil (na Lei do crime organizado – Lei 12.850/13) previu-se a possibilidade de o acordo ser feito entre o delegado, investigado e advogado ou entre o Ministério Público, investigado ou acusado e o advogado (art. 4º, § 6º). O acordo feito pela polícia vale?
(…)
Como afirmamos, são incontáveis as questões controvertidas em torno desse tema. Sobre ele vamos ter que escrever muito, porque parece que a plea bargaining veio para ficar e tende a se alastrar por todo país, quebrando a lógica completamente de todo o sistema processual que vem vigorando no país desde 1988 (a começar pela indisponibilidade da ação penal pública, que está sendo substituída nos casos de Justiça negociada pelo princípio da oportunidade ou discricionariedade regrada).
Fonte: http://blogdofred.blogfolha.uol.com.br/
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