Rav Yisroel Goldstein dando uma entrevista defronte ao Beit Chabad de Poway no domingo. (Denis Poroy/Associated Press) |
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Eu
não sei porque Deus poupou minha vida na minha sinagoga em Poway,
California. Tudo o que posso fazer é fazer com que esse tempo emprestado
seja importante.
Por Yisroel Goldstein
O Sr. Goldstein é o rabino de Chabad of Poway, Califórnia.
29 de abril de 2019
Poway-Calif.- Hoje deveria ter sido o dia do meu enterro.
Eu
estava me preparando para falar a minha prédica no Shabat pela manhã,
sábado, que também foi o último dia de Pessach, a festa da nossa
liberdade, quando ouvi um forte estrondo no saguão da minha sinagoga.
Eu
pensei que uma mesa tinha caído ou talvez até mesmo, Deus me livre, que
minha querida amiga Lori Gilbert Kaye tivesse tropeçado e caído. Apenas
alguns momentos antes eu cumprimentara Lori; ela veio para a sinagoga
para dizer o Yizkor, a oração de luto, por sua falecida mãe.
Fui ao saguão para ver como ela estava. O que eu vi nesses segundos vai me assombrar pelo resto dos meus dias.
Eu vi Lori sangrando no chão. E eu vi o terrorista que a assassinou.
Este
terrorista era um adolescente. Ele estava parado ali com um grande rifle
nas mãos. E agora ele o estava apontando para mim. Por um motivo: por
que sou judeu.
Ele
começou a atirar. Meu dedo indicador direito foi arrancado. Outra bala
atingiu meu dedo indicador esquerdo, que começou a jorrar sangue.
Após o
massacre em Pittsburgh, tivemos um treinamento comunitário. Agora aquele
treinamento fez a diferença. De alguma forma, meu cérebro dirigiu meu
corpo para o salão da sinagoga, onde as crianças, incluindo dois dos
meus netos, estavam brincando. Eu corri em direção a eles gritando:
“Saiam! Saiam daqui!” Eu agarrei o máximo de crianças que pude com
minhas mãos ensanguentadas e as empurrei para fora do prédio.
Um dos
nossos congregantes naquele dia, Almog Peretz, um veterano das Forças de
Defesa de Israel, correu atrás de mim para ajudar a levar as crianças
para a segurança e levou uma bala na perna. Sua sobrinha de oito anos,
Noya Dahan, também foi ferida com alguns estilhaços no pé. Então um
milagre incrível ocorreu: a arma do terrorista ficou emperrada. Dois
outros fiéis heróicos - um veterano do Exército americano chamado Oscar
Stewart e um agente da patrulha de fronteira chamado Jonathan Morales -
correram em direção ao terrorista e ele fugiu.
As
ambulâncias ainda não haviam chegado. Todos nos reunimos do lado de
fora. Não me lembro de tudo o que disse à minha comunidade, mas
lembro-me de citar uma passagem da liturgia do Sêder de Pessach: “Em
cada geração eles se levantam contra nós para nos destruir; e o Santo,
bendito seja Ele, nos salva de suas mãos”. E eu me lembro de gritar as
palavras “Am Yisrael Chai! O povo de Israel vive!” Eu já disse essa
frase centenas de vezes em minha vida. Mas nunca senti a verdade disso
de forma mais pungente do que naquele momento.
Eu sou
um homem religioso. Eu acredito que tudo acontece por um motivo. Eu não
sei porque Deus me poupou a vida. Eu não sei porque eu tive que
testemunhar cenas de um pogrom no condado de San Diego como as que meus
avós vivenciaram na Polônia. Eu não sei porque uma parte do meu corpo
foi tirada de mim. Não sei por que tive que ver minha boa amiga, uma
mulher que personificava o valor judaico de chessed (bondade), ser
perseguida e morta em sua casa de oração. Eu não sei porque eu tive que
assistir o amável marido de Lori, um médico, desmaiar enquanto ele
tentava ressuscitá-la. E também ver então a sua filha única, Hannah,
chorar e soluçar em agonia quando ela encontrou os dois pais desmaiados
no chão.
Eu não conheço os planos de Deus. Tudo o que posso fazer é tentar encontrar sentido e significado em tudo o que aconteceu. E usar esse tempo de vida que me foi emprestado por Deus para tornar minha vida mais significativa.
Eu
costumava cantar uma canção para meus filhos, uma canção que meu pai
cantou para mim quando eu era criança: "Hashem está aqui", eu cantava,
usando um nome hebraico para Deus, apontando com o dedo indicador
direito para o céu. "Hashem está lá", eu cantava, apontando para a
direita e para a esquerda. "Hashem está realmente em toda parte". Esse
dedo que eu usaria para apontar a onipresença de Deus foi tirado de mim.
Eu rezo
para que meu dedo perdido sirva como um lembrete constante para mim. Um
lembrete de que todo ser humano é criado à imagem de Deus; um lembrete
de que faço parte de um povo que sobreviveu à pior destruição e sempre
irá perdurar; um lembrete de que meus ancestrais deram suas vidas para
que eu possa viver em liberdade na América; e um lembrete, acima de
tudo, para nunca, nunca, jamais, ter medo de ser judeu.
A partir
daqui, vou ser mais destemido. Vou ficar ainda mais orgulhoso de andar
pela rua usando meu tsitsit e kipá, reconhecendo a presença de Deus. E
vou usar minha voz até ficar rouco para pedir aos meus queridos judeus
que pratiquem o judaísmo. Que acendam velas antes do Shabat. Que afixem
uma mezuza no batente direito de suas portas. Que façam mais atos de
bondade e caridade. E que apareçam na sinagoga - especialmente no Shabat
que vem.
Eu sou
um orgulhoso emissário de Chabad-Lubavitch, um movimento de Judaísmo
Hassídico. Nosso líder, o grande Rebe Menachem Mendel Schneerson,
notoriamente ensinou que um pouco de luz expulsa muita escuridão. É por
isso que os rabinos de Chabad viajam por todo o mundo para estabelecer
comunidades judaicas: tenho colegas em Katmandu e Gana, assim como em
Paris e Sydney. Acreditamos que ajudar qualquer ser humano a despertar
sua centelha divina é um passo para retificar e melhorar esse mundo
destroçado pelo mal e aproximar a redenção da humanidade. É por isso que
há 33 anos minha esposa e eu viemos a este canto da Califórnia para
construir uma casa de luz.
Porque
somos obviamente judeus, identificáveis pelos nossos chapéus pretos e
barbas, isso também significou que alguns de nós já foram alvos antes.
Onze anos atrás, meus colegas Rabi Gavriel e Rivka Holtzberg, que
dirigiam o Chabad de Mumbai, na Índia, foram assassinados com quatro de
seus convidados. Eles foram alvos do grupo terrorista Lashkar-e-Taiba
porque eram judeus. E, ao longo dos anos, várias pessoas que conheço
foram assediadas e agredidas por bandidos no bairro onde cresci, em
Crown Heights, no Brooklyn, em incidentes que normalmente não são
noticiados pela imprensa.
Em seu
vil manifesto, o terrorista que disparou contra minha sinagoga chamou
meu povo, o povo judeu, de uma “raça esquálida e parasitária”. Não.
Somos um povo divinamente ordenado a trazer a luz de Deus para o mundo.
O mesmo
ocorre em relação a este país (os Estados Unidos). A América é uma nação
única e especial na história do mundo. Nunca antes um país foi fundado
baseado nos ideais de que todas as pessoas são criadas à imagem de Deus e
que todas as pessoas merecem ser livres e ter liberdade. Nós lutamos
uma guerra para tornar essa promessa real.
E acredito que podemos torná-lo real novamente. Isso é o que eu prometo fazer com o meu tempo emprestado.
Yisroel Goldstein é o rabino de Chabad de Poway.
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Perfil
- I.A.S.
- Advogado - Nascido em 1949, na Ilha de SC/BR - Ateu - Adepto do Humanismo e da Ecologia - Residente em Ratones - Florianópolis/SC/BR
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quinta-feira, 2 de maio de 2019
Convicção judaica
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