Polícia pôs atirador de elite para abater presos no Carandiru, diz testemunha
Policiais marretavam presos enquanto os obrigavam a gritar “Deus cria, a Rota mata e viva o [Batalhão de] Choque”, diz sobrevivente do massacre que aconteceu em 1992
Wanderley Preite Sobrinho - iG São Paulo
Segunda testemunha ouvida no primeiro dia de julgamento do caso do Carandiru, o sobrevivente Marco Antonio de Moura afirmou ao juiz José Augusto Marzagão que precisou se fingir de morto para não acabar executado pelos policiais que invadiram o Pavilhão 9 para conter uma “briga de gangue”, e não uma rebelião, como afirma a defesa dos soldados. Moura deu “graças a Deus” por se lembrar de contar sobre o helicóptero de onde um atirador de elite metrabalhava quem saia com vida do pavilhão.
Condenado a 5 anos e quatro meses, Moura estava detido na sala 19 do Pavilhão 9, mas visitava um colega no quarto andar quando começou o acerto de contas entre Coelho e Barba, “líderes de quadrilhas rivais”, que duelavam com facas na “rua 10”.
Julgamento dos 26 policiais militares acusados de envolvimento no Massacre do Carandiru, realizado no Fórum da Barra Funda, na zona oeste de São Paulo. Foto: Tércio Teixeira/Futura Press
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Por volta das 14h30, “funcionários novos que nunca viram briga de preso”, acionaram o alarme. “Quando vi a policia chegar, pensei: 'vou apanhar pra caramba'.”
Quando a invasão aconteceu, “os presos correram uns para as celas dos outros”. Ele afirmou que, enquanto os policiais efetuavam os disparos, 30 pessoas se espremiam em uma cela onde cabiam quatro. “Eu estava no fundo. Uma bala que matou um colega acertou o meu pé. Levei 12 pontos, mas me fingi de morto”, disse. “Naquela cela, dez foram atingidos e oito morreram.”
Segundo Moura, que tentou se esconder no telhado, foi abatido por um atirador de elite. “Graças a Deus que eu me lembrei de contar: tinha um policial dentro de um helicóptero com uma metralhadora em um tripé. As balas batiam nas ventanas. Eu ia subir no telhado, mas desisti. Todos que subiram foram abatidos.”
Corredor polonês
Aos gritos de “Deus cria, a Rota mata e viva o [Batalhão de] Choque”, Moura se lembra de como precisou se rastejar pelo corredor polonês, formado por policiais militares. “Eles contavam 'um, dois' e davam uma marretada em alguém”, recorda-se. “Eu fui o segundo. O terceiro não teve a mesma sorte que eu.”
Socorrido pelo conhecido médico Drauzio Varela, Moura ficou internado por 30 dias. “Dei sorte. O doutor disse que raspou o tendão. Quase fiquei deficiente". Ao todo, 23 testemunhas serão ouvidas durante o processo - 14 de acusação e outras nove de defesa.
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