Experimento com macacos mostra que rejeição em transplante autólogo de neurônios é mínima
CESAR BAIMA (EMAIL)
Neurônios novos: produzidos a partir de células-tronco, neurônios foram implantados no cérebro de macaco, que não rejeitou os novos tecidos Latinstock
RIO - Desde que começaram a ser objeto de experimentos em laboratório há mais de duas décadas, as células-tronco guardam a promessa de revolucionar a medicina. Com o potencial de se tornarem qualquer tecido do corpo, elas teoricamente poderiam ser usadas para fabricar órgãos para transplante, acabando com a espera por doadores, ou para regenerar tecidos danificados por doenças ou traumas, como paralisias devido a acidentes e a morte de neurônios no mal de Parkinson. Agora experimento realizado no Japão trouxe mais para perto da realidade um destes usos. Em testes com macacos, cientistas da Universidade de Kioto mostraram que é possível implantar neurônios derivados de células-tronco no cérebro dos animais sem que seu sistema imunológico reaja destruindo-os, abrindo caminho para um tratamento efetivo do mal de Parkinson em humanos.
Neurônios com mesmo DNA do paciente
Para minimizar a reação do organismo, os pesquisadores liderados por Jun Takahashi usaram as chamadas células-tronco de pluripotência induzida (iPS, na sigla em inglês). Produzidas a partir de células da pele, sangue ou músculos do próprio paciente, as iPS têm o mesmo DNA que ele, o que diminui as chances de resposta imunológica. Conhecido como reprogramação celular, o método para produção das iPS consiste na introdução de quatro genes em células maduras que as forçam a regredir ao estágio de células-tronco. A descoberta rendeu ao cientista japonês Shinya Yamanaka o Prêmio Nobel de Medicina do ano passado.
Estudos anteriores com roedores, no entanto, indicaram que, mesmo tendo o DNA igual ao dos pacientes, em alguns casos os tecidos fabricados com estas células-tronco de pluripotência induzida poderiam ser rejeitados após transplantados. Diante disso, os cientistas japoneses decidiram examinar qual seria a reação do organismo de animais mais próximos do ser humano nestas intervenções, conhecidas como transplantes autólogos. Para tanto, eles primeiro retiraram células de um macaco cinomolgo (Macaca fascicularis) — espécie de primata muito usada nos laboratórios por causa da sua fisiologia semelhante à dos humanos — e as reprogramaram para regredirem ao estágio de células-tronco, isto é, iPS.
Em seguida, os pesquisadores forçaram estas células-tronco a se diferenciarem em neurônios dopaminérgicos, um tipo especializado de célula cerebral que tem a dopamina como seu principal neurotransmissor e cuja morte causa os sintomas dos pacientes de Parkinson, como tremores, rigidez muscular e descontrole dos movimentos. Por fim, eles injetaram estes neurônios no cérebro do próprio macaco cujas células foram usadas para fabricar as iPS, verificando que eles provocaram uma resposta imunológica mínima. Por outro lado, quando os mesmos neurônios foram injetados em outros macacos, em transplantes conhecidos como alogênicos, seus corpos reagiram rejeitando os novos tecidos cerebrais.
Os pesquisadores alertam, no entanto, que ainda será preciso percorrer um longo caminho antes que o tratamento chegue aos consultórios, com mais testes em animais e posteriores ensaios clínicos em seres humanos. Eles também destacam que o experimento envolveu o uso de iPS apenas para a fabricação de novos neurônios de um tipo específico e que ainda restam dúvidas se a reação imunológica dos pacientes será a mesma no caso de transplante de outros tecidos ou órgãos feitos sob medida, como células cardíacas, fígado e pâncreas.
— Mas este experimento nos dá a primeira base para começar os transplantes autólogos, pelo menos de células neurais, em situações clínicas — defende Takahashi, principal autor de artigo sobre a experiência, publicado ontem no periódico científico de acesso aberto “Stem cell reports”.
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