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segunda-feira, 25 de dezembro de 2017

Madeireiros avançam sobre o Riozinho do Anfrísio




Madeireiros avançam sobre o Riozinho do Anfrísio

Mais de 200 quilômetros de estradas foram abertos ilegalmente na Reserva Extrativista (Resex) Riozinho do Anfrísio, no Pará, para extração de madeira em 2017. Extrativistas que vivem na região denunciam o avanço do saque madeireiro em áreas intocadas - locais ricos em recursos naturais, como a copaíba e com indícios de presença de indígenas isolados.

Neste ano mais de 200 quilômetros de estradas para retirada de madeira ilegal foram abertas na Reserva Extrativista Riozinho do Anfrísio (PA), 277% a mais que em 2016




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Mais de 200 quilômetros de estradas foram abertos ilegalmente na Reserva Extrativista (Resex) Riozinho do Anfrísio, no Pará, para extração de madeira em 2017. Extrativistas que vivem na região denunciam o avanço do saque madeireiro em áreas intocadas - locais ricos em recursos naturais, como a copaíba e com indícios de presença de indígenas isolados. A exploração das madeiras de lei tem avançado sobre o território, provocando graves conflitos sociais e intimidando a população.

O roubo de madeira na região não é novidade, mas o aumento extensivo das estradas que escoam o produto preocupa os moradores, parceiros e poder público. O monitoramento realizado pela Rede de Monitoramento Territorial do Xingu, em parceria com os beiradeiros, como são conhecidos os ribeirinhos que vivem às margens dos rios da Terra do Meio, detectou um aumento de 277% em comparação com o ano passado, em que foram abertos 53 quilômetros de estradas.

Baseado em informações de campo, imagens de satélite e sobrevôos, o ISA estima que mais de 23 mil metros cúbicos de madeira de altíssimo valor podem ter saído da Resex em 2017, que, uma vez processados, podem render mais de R$ 208 milhões.

O saque madeireiro avança sobre uma área de extraordinária biodiversidade, protegida e utilizada pelos ribeirinhos de forma sustentável. "O patrimônio que está sendo espoliado é de um valor incalculável", aponta Juan Doblas, assessor do ISA.

"O pessoal está dizendo que não é bom furar copaíba naquele determinado trecho, porque pode encontrar com madeireiro, que se você subir [o rio] não vai se dar bem", conta um morador da Resex que não pode ser identificado. Dados de radar mostram que as estradas foram além do igarapé do Najazal, na porção leste da reserva, cada vez mais próximas das localidades dos beiradeiros.

O aumento do saque acompanha a dinâmica do desmatamento. Em um ano, entre 2016 e 2017, foram desmatados 159 hectares de floresta, aumento de 33% em relação ao período anterior. "Existem quadrilhas organizadas de corte seletivo de madeira ali", alerta Paulo Carneiro, diretor do departamento de Criação e Manejo de Unidades de Conservação (Diman) do ICMBio.

O caminho da madeira

O monitoramento mostra que os ramais madeireiros tem um destino: as serrarias próximas ao Projeto de Assentamento (PA) Areia, no município de Trairão, a 130 quilômetros da Resex. Se anos atrás a população do PA vivia à mercê da grilagem de terras - por conta do descaso do poder público em garantir seus direitos - hoje enfrenta, pelos mesmos motivos, a intensificação dos madeireiros na região.

Em 2005, Luiz Carlos Tremonte e Marcos Sato, então proprietários das madeireiras Lamex Export e Amazônia Florestal respectivamente, propuseram uma parceria com a associação de moradores do Areia em um plano de manejo madeireiro comunitário. Os moradores esperaram por anos a aprovação do plano para começarem a trabalhar na área, até que em 2008 descobriram que quase a totalidade da madeira autorizada para exploração já havia sido formalmente retirada.

Em análises de 2009, no entanto, não foi detectado nenhum indício de exploração no perímetro aprovado para o manejo, mas 11.538 metros cúbicos de madeira foram registrados como provenientes desta área. Ou seja, apesar de madeira alguma ter sido retirada da região licenciada, mais de 11 mil m3 foram transportados com documentos que garantiam que a origem das toras era da área prevista no plano de manejo do PA Areia.

Fontes afirmaram que a madeira era proveniente das áreas protegidas próximas da região: Floresta Nacional do Trairão, Parque Nacional Jamanxim e Resex Riozinho do Anfrísio. A madeira saía em tora pelo assentamento. Parte dela era serrada e laminada na Amexport, de Tremonte, e outra parte na Amazônia Floresta, de Sato. [Leia mais sobre o caso do PA Areia no livro Dono é quem desmata]

Ipê na mira
A beleza da floração do ipê amarelo facilita sua identificação e exploração ilegal. Uma vez localizada, os madeireiros cortam a mata em busca dessa e de outras espécies, deixando um rastro de degradação. O alto valor agregado do ipê, cujo metro cúbico está acima de US$ 2 mil, viabiliza a sua exploração a grandes distâncias dentro de áreas protegidas, colocando em risco a floresta e as pessoas que ali vivem.

Ainda que o caso tenha desencadeado em uma série de investigações que culminaram na diminuição do saque de madeira, os madeireiros encontraram vias para se reorganizarem. Hoje, a análise de imagens de satélite de alta resolução e testemunhas locais indicam que o Areia voltou a ser o destino das estradas abertas na Resex Riozinho do Anfrísio.

Doblas acredita que o mecanismo de "esquentar" a madeira retirada ilegalmente usando planos de manejo fraudados é o que respalda o saque levado à cabo atualmente. "O combate à atividade criminosa começa, portanto, pela suspensão dos planos de manejo nas proximidades das áreas protegidas e a sua posterior liberação após vistoria", aponta.

Resistência e articulação

Localizado entre as bacias do rio Xingu e Tapajós, o Riozinho do Anfrísio foi palco de intensos conflitos fundiários. Após resistência e pressão dos ribeirinhos e seus parceiros, a Resex foi homologada em novembro de 2004 - a primeira de uma série de áreas protegidas criadas na região, que formam o mosaico da Terra do Meio.


A articulação dos beiradeiros e a construção de cadeias de valor de produtos da floresta (como a castanha, copaíba, babaçu e a borracha da seringa), associados ao monitoramento e ações de fiscalização no território arrefeceram a grilagem de terras e barraram, por um período de tempo, a extração ilegal de madeira.

Os moradores pedem fiscalizações efetivas dos órgãos responsáveis, Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais (Ibama) e ICMBio, e a instalação de uma base permanente na reserva. "Não adianta fazer uma ação de fiscalização por ano. Os madeireiros vão embora e logo voltam. Isso quando não vaza informação e o Ibama chega lá e não encontra ninguém", comenta outro beiradeiro, que não quer ser identificado.

A Associação dos Moradores do Riozinho do Anfrísio (Amora) encara a situação com preocupação e afirmou seu compromisso de trabalhar junto aos órgãos de fiscalização para combater a extração ilegal de madeira na região.

Ainda que a presença de grupos infratores seja conhecida de longa data, Carneiro explica que não é possível manter uma base fixa da instituição, por dificuldades de acesso. Frente ao avanço do saque madeireiro, o diretor do Diman se comprometeu a dialogar com as lideranças da Resex para identificar as áreas prioritárias e tentar estruturar uma base temporárias nos pontos mais críticos durante o período da seca - em que a exploração se intensifica. "Nós vamos adaptar o nosso planejamento a essa demanda de ter uma base fixa na região", disse.

Mosaico da Terra do Meio
O Riozinho do Anfrísio faz parte do mosaico de áreas protegidas da Terra do Meio, conjunto de Unidades de Conservação e Terras Indígenas entre os rios Xingu e Iriri. Com 8,5 milhões de hectares de extensão, o mosaico abriga uma enorme diversidade socioambiental e é um importante elemento de proteção do território, que sofre intensa pressão de desmatamento, retirada de madeira ilegal, construção de estradas e hidrelétricas.
Isabel Harari

Fonte: PRAVDA RU BR

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