Cúpula da diplomacia recebe acima do teto, segundo levantamento do GLOBO com base em dados oficiais
FRANCISCO LEALI
ANDRÉ DE SOUZA
BRASÍLIA — Oito meses após o governo divulgar os salários do funcionalismo federal, o Itamaraty liberou sexta-feira à noite a consulta aos vencimentos dos diplomatas que estão no exterior. Levantamento feito pelo GLOBO a partir dos dados divulgados mostra que toda a cúpula da diplomacia brasileira recebe salário maior do que a presidente da República.
A Constituição estabelece que o teto dos servidores públicos deve ser o de um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), hoje equivalente a R$ 26.723,13, mesmo valor recebido pela presidente Dilma Rousseff. No total, são pelos menos 132 diplomatas nessa situação. Mas o número pode ser maior porque o levantamento considerou apenas os ministros de primeira classe do Itamaraty e que, no exterior, atuam como embaixadores ou comandam escritórios em organismos internacionais e chefiam consulados-gerais. O mais alto salário é de R$ 58,9 mil pagos em janeiro deste ano ao embaixador Paulo Americo Veiga Wolowski, que está em Brazzaville, capital da República do Congo.
Outros doze diplomatas brasileiros receberam mais do que R$ 50 mil em janeiro. São embaixadores brasileiros em países como Iraque, Japão e Angola. O mais baixo salário da lista de 132 embaixadores lotados no exterior é de R$ 31,8 mil, pago ao representante do Brasil no consulado-geral em Buenos Aires.
Para montar o ranking dos mais altos salários da diplomacia brasileira no exterior foram considerados no cálculo tanto o salário bruto básico como as verbas indenizatórias informadas pelo Itamaraty no portal da transparência da Controladoria Geral da União (CGU). Segundo a própria CGU, no caso dos diplomatas no exterior, a verba indenizatória inclui o pagamento de valores referentes a representação no exterior e também ao “fator de correção cambial”. Esse fator varia de acordo com o posto ocupado pelo diplomata, seguindo o custo de vida na cidade onde está lotado. O GLOBO não incluiu na conta férias recebidas por alguns dos embaixadores, benefício legal que não é limitado pelo teto constitucional.
Se fosse considerado apenas o salário bruto pago em dólar, dos 132 diplomatas que estão no topo da pirâmide salarial do Itamaraty 28 ainda teriam rendimento acima do que ganha a presidente da República. O mais alto deles foi pago ao embaixador Ánuar Nahes, que está no Iraque. No caso do embaixador Paulo Americo Veiga Wolowski, o maior vencimento da diplomacia em janeiro, o salário básico em dólar foi de US$ 15,2 mil (R$ 31 mil). Somados a outros US$ 13,6 mil, a título de verba indenizatória, ele chegou ao salário final de R$ 58,9 mil.
Em novembro do ano passado, o Tribunal de Contas da União (TCU) deu prazo de um mês para que o Itamaraty divulgasse a remuneração dos servidores em atividade em outros países. Também determinou que os salários superiores ao teto constitucional fossem cortados. No mês seguinte, porém, após um recurso proposto pelo ministro das Relações Exteriores, Antonio Patriota, o TCU revogou sua própria decisão.
Patriota alegou falha técnica do TCU no processo e teve o pedido atendido. Só em janeiro deste ano, após reportagem do GLOBO expondo o caso, o Itamaraty se comprometeu a divulgar, até o fim de fevereiro, a remuneração dos servidores que trabalham fora do país. No processo que tramita no TCU, os auditores cobram explicação sobre o “fator de correção cambial”, mecanismo que eleva os vencimentos da diplomacia que atua no exterior.
Desde a noite de sexta-feira passou a ser possível consultar no Portal da Transparência a remuneração em dólar de 2.161 servidores públicos em atividade no exterior. Eles integram o Ministério das Relações Exteriores, o Departamento da Polícia Federal, a Receita Federal e o Ministério da Agricultura. Os dados se referem ao mês de janeiro.
Os vencimentos dos adidos da Polícia Federal e da Agricultura já tinham sido divulgados pelo GLOBO há uma semana, com base em informações prestadas por esses órgãos, a partir de pedidos formulados seguindo as regras da Lei de Acesso à Informação. Apenas o Itamaraty vinha se negando a divulgar os dados sob alegação de que os liberaria até o final de fevereiro no site da CGU.
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