Depois do terraplanismo, “passapanismo” vira tendência com Vaza Jato
Gustavo Freire Barbosa
12 de junho de 2019
Foto: Fellipe Sampaio/SCO/STF
A dúvida é se passapanistas terão fôlego para continuar depois que mais vazamentos revelarem o que muita gente já sabia
“O desprezo por evidências científicas é um item que não costuma faltar na cesta básica da direita populista”. Assim começa a matéria da Folha de S. Paulo assinada por Anna Virgínia Balloussier sobre o espaço que o terraplanismo vem ganhando nos últimos tempos, com direito até a documentário da Netflix.
Não assusta que a teoria de que a Terra é chata venha angariando cada vez mais atenções na esteira do crescimento de forças políticas representadas por nomes como Trump, Bolsonaro, Salvini (Itália), Orbán (Hungria), Erdogan (Turquia) e Kaczyński (Polônia). Já tivemos a oportunidade de apontar como um dos adversários do bolsonarismo é exatamente qualquer coisa que se aproxime de algum avanço civilizatório.
PUBLICIDADE
➤ Leia também:
Resistir a Bolsonaro é um dever civilizatório
Os surtos feudais de Damares, Ernesto Araújo e do próprio Jair, que junto com o ministro Osmar Terra insiste em negar resultados de pesquisas que contrariam as vozes em sua cabeça, não deveriam ser surpresa.
Não por menos, o ataque virulento às universidades pelo ministro da educação ocorre num contexto de negação a obviedades científicas em prol de uma agenda que se ampara essencialmente em terraplanismos – aqui visto como qualidade, categoria ou sinônimo dessa direita bolsonarista desapegada de fatos concretos – que ganham forma em conceitos como “globalismo”, “climatismo” e “ideologia de gênero”. Mark Sargent, o papa das teorias terraplanistas, assume ele próprio que a postura de Trump quanto a temas dessa natureza foi fundamental para que seu rebanho crescesse.
Na onda do terraplanismo, cresce também o “passapanismo”. Antes voltado a passar o pano nas fissuras do bolsonarismo decorrentes do envolvimento do clã com práticas improbas, os passapanistas agora se detêm em sair em defesa da dupla de milicianos judiciais Sérgio Moro e Deltan Dallagnol.
Fernando Frazão/Agência Brasil
Em março de 2005, numa reportagem que publicou no jornal O Globo, a jornalista Vera Araújo usou o termo “milícia” para classificar onze grupos de paramilitares que controlavam quarenta favelas na capital carioca.
Segundo o Houaiss, milícia é o “grupo armado de pessoas, geralmente com formação militar, paramilitar ou policial, que atua à margem da lei em algumas comunidades carentes, pretensamente para combater o crime”.
A similaridade com o modus operandi da dupla é auto-explicável.
Além dos milicianos, o séquito de bolsonaristas vem, de domingo para cá, passando o pano também para os protagonistas das cabeludas conversas divulgadas pelo The Intercept. Os argumentos para safar as peles de Moro e Dallagnol são de um nível de acrobacia capaz de causar inveja mesmo àqueles que insistem em dizer que o ex-juiz foi alçado ao posto de Ministro da Justiça por ter combatido a corrupção.
O principal argumento, além da retórica miliciana de que os fins justificam os meios, é talvez o de que a divulgação das conversas firmadas pelo juiz e pelo procurador foram ilegais e que sua revelação não alteraria a condenação de Lula.
Há ainda o vitimismo alardeado por Dallagnol em suas redes, as tentativas de descredibilizar Glenn Greenwald, idealizador do site, e a indolente interpretação de que os diálogos dizem respeito a conversas de comadre, desimportantes e naturais no cotidiano da atividade judiciária.
Primeiro, nossa Constituição garante o sigilo da fonte para o exercício da atividade jornalística (artigo 5º, XIV). Logo, o The Intercept não tem nenhuma obrigação de revelá-la, pouco interessando se a coleta das informações foi legal ou ilegal.
A insistência nesse ponto revela muito mais a afobação em tirar os holofotes do seu conteúdo, intenção que fica nítida também nos ataques à pessoa de Glenn Greenwald. “Nós não discutimos para provar que o adversário está errado. Discutimos para destruí-lo socialmente, psicologicamente, economicamente”, orienta Olavo de Carvalho em suas aulas. Até a deportação de Greenwald está sendo pedida pelo bolsonarismo lavajatista.
Segundo, em resposta à indagação de um jornalista no Twitter, o Telegram afirmou que não há evidências da ação de um hacker nesse caso.
Gustavo Freire Barbosa
12 de junho de 2019
Foto: Fellipe Sampaio/SCO/STF
A dúvida é se passapanistas terão fôlego para continuar depois que mais vazamentos revelarem o que muita gente já sabia
“O desprezo por evidências científicas é um item que não costuma faltar na cesta básica da direita populista”. Assim começa a matéria da Folha de S. Paulo assinada por Anna Virgínia Balloussier sobre o espaço que o terraplanismo vem ganhando nos últimos tempos, com direito até a documentário da Netflix.
Não assusta que a teoria de que a Terra é chata venha angariando cada vez mais atenções na esteira do crescimento de forças políticas representadas por nomes como Trump, Bolsonaro, Salvini (Itália), Orbán (Hungria), Erdogan (Turquia) e Kaczyński (Polônia). Já tivemos a oportunidade de apontar como um dos adversários do bolsonarismo é exatamente qualquer coisa que se aproxime de algum avanço civilizatório.
PUBLICIDADE
➤ Leia também:
Resistir a Bolsonaro é um dever civilizatório
Os surtos feudais de Damares, Ernesto Araújo e do próprio Jair, que junto com o ministro Osmar Terra insiste em negar resultados de pesquisas que contrariam as vozes em sua cabeça, não deveriam ser surpresa.
Não por menos, o ataque virulento às universidades pelo ministro da educação ocorre num contexto de negação a obviedades científicas em prol de uma agenda que se ampara essencialmente em terraplanismos – aqui visto como qualidade, categoria ou sinônimo dessa direita bolsonarista desapegada de fatos concretos – que ganham forma em conceitos como “globalismo”, “climatismo” e “ideologia de gênero”. Mark Sargent, o papa das teorias terraplanistas, assume ele próprio que a postura de Trump quanto a temas dessa natureza foi fundamental para que seu rebanho crescesse.
Na onda do terraplanismo, cresce também o “passapanismo”. Antes voltado a passar o pano nas fissuras do bolsonarismo decorrentes do envolvimento do clã com práticas improbas, os passapanistas agora se detêm em sair em defesa da dupla de milicianos judiciais Sérgio Moro e Deltan Dallagnol.
Fernando Frazão/Agência Brasil
Em março de 2005, numa reportagem que publicou no jornal O Globo, a jornalista Vera Araújo usou o termo “milícia” para classificar onze grupos de paramilitares que controlavam quarenta favelas na capital carioca.
Segundo o Houaiss, milícia é o “grupo armado de pessoas, geralmente com formação militar, paramilitar ou policial, que atua à margem da lei em algumas comunidades carentes, pretensamente para combater o crime”.
A similaridade com o modus operandi da dupla é auto-explicável.
Além dos milicianos, o séquito de bolsonaristas vem, de domingo para cá, passando o pano também para os protagonistas das cabeludas conversas divulgadas pelo The Intercept. Os argumentos para safar as peles de Moro e Dallagnol são de um nível de acrobacia capaz de causar inveja mesmo àqueles que insistem em dizer que o ex-juiz foi alçado ao posto de Ministro da Justiça por ter combatido a corrupção.
O principal argumento, além da retórica miliciana de que os fins justificam os meios, é talvez o de que a divulgação das conversas firmadas pelo juiz e pelo procurador foram ilegais e que sua revelação não alteraria a condenação de Lula.
Há ainda o vitimismo alardeado por Dallagnol em suas redes, as tentativas de descredibilizar Glenn Greenwald, idealizador do site, e a indolente interpretação de que os diálogos dizem respeito a conversas de comadre, desimportantes e naturais no cotidiano da atividade judiciária.
Primeiro, nossa Constituição garante o sigilo da fonte para o exercício da atividade jornalística (artigo 5º, XIV). Logo, o The Intercept não tem nenhuma obrigação de revelá-la, pouco interessando se a coleta das informações foi legal ou ilegal.
A insistência nesse ponto revela muito mais a afobação em tirar os holofotes do seu conteúdo, intenção que fica nítida também nos ataques à pessoa de Glenn Greenwald. “Nós não discutimos para provar que o adversário está errado. Discutimos para destruí-lo socialmente, psicologicamente, economicamente”, orienta Olavo de Carvalho em suas aulas. Até a deportação de Greenwald está sendo pedida pelo bolsonarismo lavajatista.
Segundo, em resposta à indagação de um jornalista no Twitter, o Telegram afirmou que não há evidências da ação de um hacker nesse caso.
Fonte: https://www.cartacapital.com.br/justica/depois-do-terraplanismo-passapanismo-vira-tendencia-com-vaza-jato/
Nenhum comentário:
Postar um comentário