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quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Turismo em Florianópolis - Uma lacuna legislativa

Segundo SÉRGIO LUIZ FERREIRA (na interessante obra O banho de mar na Ilha de SC - Edit. das Águas - Fpolis/1998/pág. 101, que entendo leitura indispensável para todos os que gostam de história e/ou atuam no setor turístico), turismo é palavra que teria sido cunhada pelo famoso escritor francês STHENDAL (1783-1842, autor de O vermelho e o negro, por exemplo).

Curiosamente, ao que parece, chegado em excesso ao lazer (pelo menos do ponto de vista físico, já que se dedicava a pensar e escrever) morreu o francês de apoplexia.

A atividade turística - de importância reconhecida para a economia de qualquer país - no Brasil é declarada pelo art. 180 da Constituição Federal
fator de desenvolvimento social e econômico, estabelecendo o mesmo dispositivo medida programática de promoção e incentivo dele pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios, por força da Emenda Constitucional nº 35, dispõe sobre a matéria nos seguintes termos:

Art. 192-A — O Estado promoverá e incentivará o turismo como fator de desenvolvimento econômico e social, de divulgação, de valorização e preservação do patrimônio cultural e natural, respeitando as peculiaridades locais, coibindo a desagregação das comunidades envolvidas e assegurando o respeito ao meio ambiente e à cultura das localidades exploradas, estimulando sua auto-sustentabilidade.
§ 1º — O Estado definirá a política estadual de turismo proporcionando condições necessárias para o desenvolvimento da atividade.
§ 2º — O instrumento básico de intervenção do Estado, decorrente da norma estatuída no caput, será o plano diretor de turismo, estabelecido em lei complementar que, fundado no inventário do potencial turístico das diferentes regiões, com a participação dos municípios envolvidos, direcionará as ações de planejamento, promoção e execução da política estadual de turismo.
§ 3º — Para o cumprimento do disposto no parágrafo anterior, caberá ao Estado, em ação conjunta com os municípios, promover especialmente:
I - o inventário e a regulamentação do uso, ocupação e fruição dos bens naturais e culturais de interesse turístico sob jurisdição do Estado;
II - a infra-estrutura básica necessária à prática do turismo, apoiando e realizando investimentos no fomento dos empreendimentos, equipamentos e instalações e na qualificação dos serviços, por meio de linhas de crédito especiais e incentivos fiscais; e
III - a promoção do intercâmbio permanente com Estados da Federação e com o exterior, visando o aumento do fluxo turístico e a elevação da média de permanência do turista.


Florianópolis, dita possuidora de grande potencial e vocação turística, pela beleza natural de que está dotada, não se olvidou, em sua Lei Orgânica (equivalente à "Constituição Municipal"), datada de 1990, de prever a regulamentação do assunto, estabelecendo:

Art. 127 - O Município desenvolverá uma política voltada ao turismo, de forma a compatibilizar o desenvolvimento do setor como atividade econômica e a busca da preservação de suas riquezas naturais.

§ 1º - As atividades relacionadas com a exploração do turismo, deverão adequar-se à política urbana e contribuir para o desenvolvimento sócio-econômico do Município.

§ 2º - Fica o Município definido como de interesse turístico.

Art. 128 -
Lei Complementar disporá sobre o Plano de Desenvolvimento do Turismo.

Art. 129 -
É de competência do Município, apoiar, orientar e fiscalizar a atividade turística.

Art. 130 -
Promover o turismo alternativo, visando a minimizar a sazonalidade e o impacto ambiental, estimulando o turismo ecológico.


Merece ênfase o art. 128, que preconiza a edição de uma Lei complementar no sentido de criar e disciplinar um Plano de Desenvolvimento do Turismo.
Tendo procurado, na rede, sem sucesso, a lei complementar por derradeiro referida, fui à Procuradoria Jurídica da Câmara de Vereadores de nossa Cidade e lá, também não se conseguiu localizar tal diploma, chegando-se à conclusão de que simplesmente não existe.

Causa espécie tal desleixo de parte da administração e dos legisladores municipais, ante a circunstância de que o turismo é considerado crucial para a economia local.

Após as diligências referidas fui até o gabinete de um vereador conhecido, conversei com a assessoria do mesmo e sugeri que tomasse a iniciativa de elaborar o projeto de lei complementar acima destacado.

Para que a idéia não seja esquecida, ainda ontem voltei a tocar no assunto com o mesmo assessor e estarei vigilante, no interesse coletivo (eis que minha atuação profissional não se prende ao setor turístico), de sorte que ocorra a elaboração do projeto, sua discussão com os setores mais diretamente interessados na atividade turística e elaboração da lei.

A percepção da inexistência da lei complementar sob comento decorreu de adversidade enfrentada em uma das ações populares em que questiono a destinação de dinheiro público para o custeio de dois eventos de natureza religiosa, como já comentei anteriormente neste blog.
Naquela decisão, o magistrado, sem fundamentar jurídicamente seu entendimento, adotou postura, ao meu ver completamente equivocada, ante as disposições legais acima transcritas, de que o custeio, por entes públicos, de despesas com congressos religiosos não atenta contra o interesse público porque implica em incentivo ao turismo.
Ocorre que as formas de promoção e incentivo, previstas na legislação acima e na lei ordinária federal que disciplina a matéria (de nº 11.771/2008 - que estabelece normas sobre a política nacional de turismo), não englobam o repasse de dinheiro para igrejas ou entidades a ela ligadas, cuja atividade-fim, aliás, nenhuma relação possui com o turismo.
Avulta, ainda, a circunstância de que, ao magistrado, como a qualquer outro agente público, só é dado admitir ou praticar o que esteja previsto em lei (art. 37, da Constituição Federal - princípio da legalidade) e, no caso acima mencionado, meu entendimento é de que tal princípio foi contrariado.

Pois, à vista do exposto, parece-me, no mínimo, risível, o paradoxo acima comentado: administração pública municipal que não se preocupa em legislar sobre atividade fundamental para a economia local e um magistrado que, de forma desautorizada pela legislação vigente, busca defender a atividade turística, apoiando uma ilicitude gritante (o repasse de dinheiro público para custear congresso Eucarístico, Encontro de Gideões), transformando-se numa espécie de procurador informal dos interesses particularíssimos dos cultos.

Conclusão: haja persistência para defender o interesse coletivo neste país. Estou ansioso para ver qual será a manifestação do Ministério Público (que tem a incumbência de defender os interesses metaindividuais) nas duas ações populares que versam sobre a matéria.

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