Perfil

Advogado - Nascido em 1949, na Ilha de SC/BR - Ateu - Adepto do Humanismo e da Ecologia - Residente em Ratones - Florianópolis/SC/BR

Mensagem aos leitores

Benvindo ao universo dos leitores do Izidoro.
Você está convidado a tecer comentários sobre as matérias postadas, os quais serão publicados automaticamente e mantidos neste blog, mesmo que contenham opinião contrária à emitida pelo mantenedor, salvo opiniões extremamente ofensivas, que serão expurgadas, ao critério exclusivo do blogueiro.
Não serão aceitas mensagens destinadas a propaganda comercial ou de serviços, sem que previamente consultado o responsável pelo blog.



segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

Boate em área urbana - Preocupação com isolamento acústico - Uso de materiais inflamáveis e tóxicos - Fatalidade?

É preciso questionar tudo, no afã de evitar semelhante infortúnio ao que acaba de atingir a sociedade riograndense. 

Antes de qualquer outra consideração, imperioso sugerir às famílias das vítimas que constituam um advogado que funcione como "assistente de acusação", de sorte a que não fique ao exclusivo cuidado do Ministério Público a condução do caso. E mais: que o advogado/assistente não seja influenciável por qualquer dos responsáveis.

Quando se permite a instalação de uma grande casa de diversão, igreja ou estabelecimento capaz de produzir barulho e incomodar a vizinhança, exige-se   isolamento acústico, mormente se o som (como acontece nos dias atuais) é emitido em alto nível, para atingir as verdadeiras multidões que tais estabelecimentos acolhem.
Este é um dos detalhes que aumentam significativamente os riscos de incêndio com centenas de vítimas fatais, isto porque o material plástico/esponjoso destinado ao aludido isolamento é uma fogueira em potencial, eis que produzido com derivados de petróleo, uma verdadeira bomba incendiária.
Qualquer descuido, imprudência, imperícia ou má execução de instalações elétricas, pode engendrar tragédias obviamente questionáveis, não se podendo cogitar de mera fatalidade, que é algo muito diferente.
Fatalidade é acontecimento inevitável, decorrente de caso fortuito ou força maior: um incêndio e/ou morte decorrente de um raio (fato da natureza), evento imprevisível. Quando os riscos potenciais são óbvios, possibilitando uma perfeita previsibilidade de acidente e consequências nefastas, não se pode falar em fatalidade, como o fez o governador Tasso Genro. 
Raciocinemos em termos de acidente automobilístico: alguém que conduz um veículo com freios sabidamente defeituosos, ou com faróis que não funcionam à noite, ou imprimindo excesso de velocidade a ele, ou ainda dirigir em estado de embriaguez, não pode falar em fatalidade, caso venha a provocar um evento danoso (vitimando-se ou vitimando terceiros), o qual não pode ser tido como mero acidente. A ocorrência tem como causa primária  imprudência/negligência/até dolo do condutor.
Aos advogados - quando não resta explicação razoável para defender um cliente em apuros, com evidente responsabilidade pelo ocorrido - só resta apelar para o vago conceito de fatalidade, tentando desconfigurar a culpa ou dolo dos seus constituídos.
No caso de Santa Maria, falar em fatalidade é atentar contra a inteligência alheia, até um certo deboche:
a) se a casa não possuía mais que uma saída;
b) se o material do seu isolamento acústico era altamente inflamável;
c) se os equipamentos de combate a incêndio não estavam em ordem ou eram insuficientes;
d) se não havia na casa pessoal com treinamento adequado ao combate a incêndio;
e) se a casa foi autorizada a funcionar, apesar de todos os detalhes acima;
f) se a lotação do estabelecimento superava os limites do razoável;
g) se a banda que se apresentou não foi alertada para o risco de iniciar o fogo, ante a qualidade dos materiais de isolamento

há que se procurar os culpados, objetiva e serenamente, sem caça a bruxas, respeitando-se o amplo direito à defesa e ao contraditório, como se espera em qualquer país democrático, não se podendo incensar o pessoal do Corpo de Bombeiros, responsável pelo exame dos itens de segurança, isto porque a Municipalidade exige (ou deveria exigir) o prévio Laudo da corporação para emitir o dito Alvará de funcionamento.

Em tese,  culpa em sentido amplo,  administrativa, criminal e cível deve ser atribuída ao dono da boate, ao poder público e aos integrantes da banda que utilizou-se de pirotecnia.
Acusar-se apenas um deles não seria judicioso, repugnaria à opinião pública, cujo senso de justiça é inato, ou seja, independe de filigranas jurídicas. 
O cidadão médio, mesmo sem formação jurídica, tem noção do que é certo ou errado, justo ou injusto e o governador Tasso Genro, que advogou durante décadas, sabe muito bem que falar em fatalidade cheira a sacanagem. A afirmação do colega Tasso é altamente questionável, incondizente com as notícias sobre o fato, até desrespeitosa às famílias dos falecidos e outras vítimas não fatais.

De um acórdão do Tribunal Superior do Trabalho, colhi ensinamentos que, por semelhança, podem ser aproveitado:


    (...) O que se vê, então, é que a responsabilidade civil da reclamada está configurada. Afinal, as medidas de segurança que protegem a saúde do trabalhador não foram tomadas (ou, se foram, não como deveriam), visto que o evento aconteceu. Não há falar, assim, em mera fatalidade.
    José Affonso Dallegrave Neto bem elucida a questão:
    [...]
    No caso, foi comprovada a culpa da reclamada no acidente sofrido pelo reclamante. Portanto, tal como ressaltado na sentença, a prova dos autos revela que o acidente ocorreu em razão da execução de serviço em condições inseguras.
    Assim, comprovado o nexo causal entre o sinistro e a lesão sofrida pela reclamante, não há dúvida de que a empresa deve responder pelo dano causado ao reclamante.(...)

(Excertos do aresto decorente do julgamento do RR - 187-41.2010.5.04.0771 Data de Julgamento: 12/12/2012, Relator Ministro: Emmanoel Pereira, 5ª Turma, Data de Publicação: DEJT 19/12/2012).

Trocando-se "trabalho" por diversão, outro acórdão do TST lança luzes sobre a responsabilidade:


    (...) A caracterização do trabalho em situações de risco pouco importa ser o contato permanente ou não, bastando a constância da potencialidade do perigo. fatalidade é imprevisível, não marcando hora nem data para acontecer. (...)

(Excertos do acórdão atinente ao julgamento do RR - 129100-02.2004.5.15.0074 Data de Julgamento: 12/12/2012, Relator Ministro: Walmir Oliveira da Costa, 1ª Turma, Data de Publicação: DEJT 14/12/2012.



Nenhum comentário: