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sábado, 26 de janeiro de 2013

Guantanamo, direitos humanos e a política dos EUA



Guantánamo continuará a ser ‘caixa-preta’ dos EUA

Por GABRIEL BONIS


Há pouco mais de quatro anos, em 22 de janeiro de 2009, Barack Obama assinava seu primeiro ato importante como presidente dos Estados Unidos. Uma série de ordens executivas cumpria uma promessa de campanha e determinava o fechamento da prisão de Guantánamo, em Cuba, no prazo de um ano, além da revisão dos procedimentos de detenção e técnicas de interrogatório “avançadas”. Caso tivesse resistido à eficiente articulação contrária dos republicanos no Congresso, o ato selaria o destino de um local onde a tortura a suspeitos de terrorismo se tornou “oficial”.

Aos poucos, entretanto, o líder democrata viu-se forçado a ceder até admitir em 2010 que descumpriria a promessa. Obama não vislumbrava a concretização da medida em um futuro próximo. Desde então, os republicanos conseguiram garantir a manutenção total das atividades da base cubana. “Tornar a prisão mais transparente é o ideal, mas isso não vai ocorrer. Vai continuar sendo uma caixa preta do governo Obama, assim como foi historicamente de outros governos”, diz Cristina Pecequilo, professora de Relações Internacionais da Unifesp e especialista em política externa dos EUA.

Protesto pelo fechamento da prisão de Guantánamo em Chicago (EUA), em 2012. Foto: World Can’t Wait/ Flickr

Para lembrar a promessa de Obama, uma série de protestos públicos organizados pela ONG Anistia Internacional ocorrem desde a última semana em cidades norte-americanas. No Rio de Janeiro, a entidade realizou na manhã de terça-feira 22 uma manifestação na Praça Mahatma Gandhi.

“As medidas de Obama não são de alguém que quer fechar ou diminuir as violações aos direitos humanos realizadas em Guantánamo”, critica Maurício Santoro, assessor de Direitos Humanos da Anistia no Brasil.


De fato, o presidente norte-americano adotou nos últimos anos uma série de atos que diminuem as possibilidades de extinção das atividades do presídio cubano. Em meio à forte oposição republicana, Obama acabou refém da Câmara dos Representantes (equivalente à Câmara dos Deputados no Brasil), onde perdeu a maioria na metade de seu primeiro mandato. Os “deputados” da oposição se articularam para construir um bloqueio financeiro que inviabilizou a ordem para fechar Guantánamo.

O primeiro deles ocorreu no final de 2010, quando as duas casas do Congresso aprovaram o orçamento do Pentágono para o ano seguinte. A medida trazia de forma explícita a autorização para detenção por tempo indefinido de prisioneiros na base cubana, além de um dispositivo que impedia o fim da prisão. Estavam inclusos ainda vetos ao julgamento dos presos de Guantánamo em território norte-americano e o financiamento do Pentágono para “o translado, a libertação ou qualquer tipo de ajuda aos réus”. Tudo isso foi amarrado à liberação da verba de 725,9 bilhões de dólares para o Departamento de Defesa naquele período.

Articulação. Obama optou por ceder ao bloqueio republicano contra o fechamento da prisão articulado no Congresso. Foto: Chip Somodevilla/ Getty Images/ AFP


Obama teve que ceder, pois nos EUA o presidente não pode vetar partes de uma lei. Ou a assina ou a derruba integralmente. Para liberar orçamento de áreas sensíveis da defesa, sancionou a medida. O mesmo aconteceu em janeiro deste ano, quando precisou assinar a Lei de Autorização de Defesa Nacional (NDAA, em inglês) que impede o fechamento de Guantánamo.

Limitado pelos congressistas, o democrata procura agora diminuir a importância da prisão de outra forma. “Menos suspeitos são enviados para lá. Assim, conforme as pessoas vão sendo tiradas do local, o processo esgota por si mesmo”, explica Pecequilo. “É uma estratégia de vencer pelo cansaço.”

Enquanto isso, os EUA tentam melhorar a imagem de violador de Direitos Humanos fortalecida pela Doutrina Bush, permissiva com torturas para obter informações relevantes. No início de sua administração, Obama divulgou memorandos secretos que permitiam à CIA, agência de inteligência do país, no governo de George W. Bush, torturar suspeitos de terrorismo em Guantánamo e nas prisões secretas americanas em todo o mundo. O democrata também voltou a participar mais ativamente de comissões humanitárias da ONU, das quais seu antecessor havia se afastado.

Atualmente existem 166 prisioneiros em Guantánamo, de um total de 779 encarcerados desde 2002. A maioria ficou presa por anos, sem acusações formais ou julgamentos. Há casos de pessoas detidas por mais de dez anos nestas condições. “Das pessoas que passaram pela prisão, menos 1% foram julgadas. E, quando isso aconteceu, comissões militares não deram acesso total do processo aos advogados de defesa por alegadas razões de Segurança Nacional”, destaca Santoro. Apenas um detento foi transferido para os EUA para julgamento.

A maneira como os presos terminaram na base também é questionável. Grande parte da população carcerária do local vem do Iêmen, de onde foram entregues aos EUA por um regime autoritário que os classificou como terroristas.

Protesto da Anistia Internacional do Rio de Janeiro. Foto: AF Rodrigues/Divulgação

Os números de Guantánamo fazem jus a sua fama de tortura: ao menos nove detentos morreram na base, sete deles se suicidaram. Além disso, 12 detentos foram presos quando tinham menos de 18 anos. Um dos casos é o do canadense Omar Khadr, capturado no Afeganistão, em 2002, quando tinha 15 anos. Ele foi condenado a 40 anos de prisão depois de confessar ter matado um soldado americano com uma granada. No ano passado, foi transferido para uma prisão de segurança máxima em seu país.

Apesar de improvável, o fechamento do local ainda é defendido. No final de 2012, a presidenta do Comitê de Informações do Senado, Dianne Feinstein, divulgou um relatório feito por autoridades norte-americanas que indicavam a possibilidade de desativar a carceiragem e transferir os presos para presídios nos EUA. Segundo a democrata, isso seria possível sem colocar em risco a segurança do país “se houvesse vontade política”.

Fonte: CARTA CAPITAL

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