A ação controlada, meio de obtenção de prova que começou a ser usado na operação “lava jato” — segundo reportagem do jornal O Globo —, já foi considerada legítima pela 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal. Em 2011, os ministros concluíram que a prática difere do chamado flagrante preparado e pode ser divulgada “em prol da coisa pública”.
Pela Lei 12.850/2013, a ação controlada consiste em “retardar a intervenção policial (...) para que a medida legal se concretize no momento mais eficaz à formação de provas e obtenção de informações".
Segundo reportagem do jornalista Lauro Jardim publicada nesta quarta-feira (17/5), a Polícia Federal conduziu sete ações desse tipo na “lava jato”, monitorando conversas e entregas de dinheiro em “parceria” com o empresário Joesley Batista — dono do frigorífico JBS, que negocia delação premiada.
Malas e mochilas, por exemplo, tinham chips para rastrear o caminho de cerca de R$ 3 milhões que teriam sido pagos a um primo do presidente do PSDB, Aécio Neves, e ao deputado Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR). Já um diálogo entre Joesley e o presidente Michel Temer (PMDB) indica que Loures foi escolhido para resolver assuntos da Presidência com a empresa que controla a JBS.
Advogados deixam claro, porém, que os investigados não podem ser incentivados por agentes do Estado a cometer crimes. A questão foi bastante discutida no caso de Sérgio Machado, delator da "lava jato" que gravou as próprias conversas. A utilização das chamadas gravações clandestinas (quando um dos interlocutores grava a conversa sem avisar o outro) só é aceita, segundo especialistas em Direito Penal consultados pela ConJur, em dois casos, sempre em defesa própria: para a preservação de direitos (um acordo verbal, por exemplo) ou para se proteger de uma investida criminosa (como uma extorsão).
Caso de Arruda
A ação controlada também foi usada a partir de 2009, nas investigações do chamado mensalão do DEM, contra o ex-governador do Distrito Federal José Roberto Arruda. Foi então que o Supremo teve de analisar o uso do método: o suplente de deputado distrital Pedro Marcos Dias alegou que o aparelho do Estado, a polícia e o Ministério Público Federal foram usados para “preparar um agente do crime”.
Ex-secretário do DF, Durval Barbosa colaborou com investigações e gravou reuniões com autoridades, em 2009.
Agência Brasil
Esse agente foi Durval Barbosa, ex-secretário de Relações Institucionais, que gravou uma série de negociações ao lado de Arruda e de outras autoridades e entregou mala de dinheiro em pelo menos um dos encontros. Para Marcos Dias, a medida “foi tomada sem que houvesse fato criminoso determinado”.
Luz do dia
O relator do caso, ministro Marco Aurélio, reconheceu que a ação controlada é “ambivalente”. No caso analisado, afirmou, visava elucidar possíveis crimes. Como é difícil investigar tais procedimentos, ele considerou possível usar nova estratégia.
“Tem-se o interesse na prática à luz do dia, na prática que viabilize o acompanhamento da sociedade. Daí constituir princípio básico da administração pública a publicidade no que deságua na busca da eficiência – artigo 37 da Constituição Federal. Sopesem valores, observando-se que o coletivo sobrepõe-se ao individual”, escreveu Marco Aurélio em decisão monocrática.Marco Aurélio considerou legítima ação controlada envolvendo investigações sobre "mensalão do DEM" no Distrito Federal.
A defesa recorreu à 1ª Turma, e Marco Aurélio repetiu o entendimento. “É a célebre questão, considerado flagrante preparado e flagrante esperado”, disse aos colegas da corte. “Entendo que, no caso, a operação controlada mostrou-se legítima”, afirmou.
O ministro Luiz Fux entendeu que anular a prova “nulificaria completamente um inquérito que veio exatamente em proveito da moralidade administrativa e do bem público”. Ele afirmou que a prática tinha respaldo na Lei 9.034/1995, que tratava de meios operacionais contra organizações criminosas e acabou revogada anos depois pela Lei 12.850.
Também presente no julgamento, a ministra Cármen Lúcia não viu “qualquer ilegalidade ou constrangimento no uso dos instrumentos que a lei permite”, enquanto o ministro Ricardo Lewandowski definiu como legítimo o uso de “novos meios de investigação consentâneos com a evolução da criminalidade moderna”.
Clique aqui para ler a decisão.
HC 102.819
Felipe Luchete é repórter da revista Consultor Jurídico.
Revista Consultor Jurídico, 17 de maio de 2017, 22h37
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