João Branco, economista e professor da ESPM-Rio, explica à Sputnik Brasil de que forma o aumento nas alíquotas do IOF vai impactar os consumidores e as empresas.
As novas alíquotas do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) entraram em vigor na segunda-feira (20), aumentando o custo do crédito para empresas e famílias.
O governo federal anunciou que o aumento, de 36%, vai ser cobrado até o dia 31 de dezembro de 2021 e incidirá sobre operações de crédito, câmbio e seguro ou relativas a títulos e valores mobiliários.
O objetivo é custear o Auxílio Brasil, programa que deve substituir o Bolsa Família. De acordo com o governo, a alta do IOF permitirá uma arrecadação extra de R$ 2,14 bilhões para custear o novo programa.
"Para as pessoas físicas a alíquota passa de 3% ao ano para 4,08% ao ano. Já para as pessoas jurídicas, a alíquota anual passa de 1,5% para 2,04%", informa a Agência Brasil.
João Branco, economista e professor da Escola Superior de Propaganda e Marketing do Rio de Janeiro (ESPM-Rio), explica à Sputnik Brasil de que forma esse aumento nas alíquotas do IOF vai impactar os consumidores e as empresas.
"Um cidadão comum, se ele for fazer o financiamento de um carro, ele vai pagar 36% a mais de imposto. Se ele for pegar um empréstimo pessoal, ou financiar uma compra no cartão de crédito, tudo isso vai aumentar significativamente o custo da operação [...]. Isso pesa bastante no bolso das pessoas", comenta.
O especialista recorda que as empresas precisam de capital de giro para se financiar e pagar dívidas. De forma que esse aumento gera "uma atmosfera de desconfiança muito grande por parte do mercado".
Incertezas e insegurança
Na campanha eleitoral de 2018, o então candidato Jair Bolsonaro afirmou: "Não vamos aumentar impostos". Promessa que foi reiterada quando Bolsonaro já era presidente: "Não tem aumento de impostos e ponto final". Para o professor da ESPM-Rio, todavia, o pior nem é a quebra da promessa.
"Em primeiro lugar essa ampliação de imposto vai de encontro a uma promessa de campanha do governo atual de não promover elevação de impostos [...]. Não chega a ser uma novidade, mas a forma como foi feito, aí sim. Foi muito atribulada, de afogadilho. Quando saiu a notícia, alguns componentes do próprio Ministério da Economia nem sequer sabiam que esse aumento estava em curso. Isso indica que há um certo desespero, uma certa falta de coordenação, falta de planejamento do governo na hora de definir a medida. Isso gera uma expectativa muito ruim no mercado", avalia Branco.
O especialista esclarece que o grande problema do governo federal é que o orçamento não está fechando. Há um desejo em ampliar o Bolsa Família, mas não há recursos.
"O que diz o manual em uma hora dessas? A alternativa número um é cortar custos, se essa alternativa não está no radar, seja porque vamos ingressar agora em um ano eleitoral, seja porque os custos e as despesas foram bastante cortadas ao longo do tempo, a alternativa é ampliar as receitas e uma das alternativas de ampliar as receitas é elevar os impostos."
A decisão de aumentar o IOF afeta indistintamente todos os consumidores que por alguma razão fazem uma operação financeira, e atinge principalmente as pessoas que estão mais endividadas porque a dívida vai aumentar ainda mais, explica João Branco.
"Ou seja, é um imposto regressivo, acaba afetando mais as pessoas que estão em pior situação financeira, de maneira geral acaba afetando mais os mais pobres em detrimentos dos mais ricos [...]. É um imposto muito ruim, prejudica os mais endividados e os mais pobres e vem de uma forma inesperada, gerando insegurança para todo mundo", sublinha.
Reforma tributária e dicas
Na verdade, os mais pobres vão sofrer ainda mais porque haverá aumento nos produtos, uma vez que a subida de impostos normalmente é refletida nos preços.
"Quando os agentes econômicos começam a repassar um determinado custo, e imposto é um custo, para o preço, a gente começa a ter uma expectativa de elevação da inflação. Ou seja, essa medida pode ser uma medida que também vai gerar inflação por dois motivos: primeiro pelo repasse automático para o preço e segundo porque na medida em que os agentes começam a ter maior desconfiança com relação ao futuro, maior insegurança com relação ao futuro, eles tendem a se precaver aumentando os seus preços. E se tiver um aumento generalizado desse tipo de comportamento isso vai se concretizar em inflação", explica.
A solução mais recomendável em situações como a atual, segundo João Branco, é conhecida pelos governantes, mas ninguém avança com ela: reforma tributária.
"A gente tem um sistema tributário que é muito ruim. Além de ser muito desigual, tem a componente pró-cíclica: vai bem quando as coisas vão muito bem e vai muito mal quando as coisas vão mal. Veja o caso do ICMS [Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços], que é um imposto direto sobre o consumo. Grande parte da arrecadação no Brasil é sobre esse tipo de imposto. Se a economia começa a retomar, aumenta, mais até do que proporcionalmente, a arrecadação do governo. E parece que está tudo bem e o governo não quer fazer a reforma tributária. Se a economia começa a patinar e a não crescer, a arrecadação piora mais do que proporcionalmente, e o governo pensa em fazer a reforma tributária, mas já não consegue porque perdeu o apoio político. Já estamos nessa armadilha há muito tempo, não é de hoje", lamenta.
O professor da ESPM-Rio comenta que só com uma reforma será possível tornar o nosso sistema tributário mais justo, onde as pessoas de mais alta renda paguem proporcionalmente mais impostos do que as pessoas de mais baixa renda.
Enquanto a reforma não acontece, e com as novas alíquotas do IOF já em vigor, o especialista tem algumas dicas para os consumidores:
"Em primeiríssimo lugar, mesmo que o IOF tivesse caído, o juro que você paga pelo cartão de crédito é muito alto, talvez a pior forma de você se financiar é parcelando débito no cartão de crédito, ou entrando no cheque especial. Isso é muito ruim. A melhor maneira, se for ter que pagar IOF, que pelo menos pague fazendo um empréstimo, financiado no mais longo prazo possível na menor taxa. Falar isso é fácil, nem sempre é possível, mas o ideal é não ter dívida, principalmente no cenário que a gente está observando agora do aumento dos juros", conclui.
Fonte: SPUTNIK BR
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