MARCELO NINIO
DE JERUSALÉM
Numa noite fria em Jerusalém há poucos dias, uma plateia ansiosa lotou a principal sinagoga da cidade para um debate entre candidatos à eleição parlamentar israelense de amanhã.
A maioria, porém, foi atraída pela presença de um deles: Naftali Bennett, 38, magnata da internet e líder do partido ultranacionalista Bait Yehudi (Lar Judaico).
Com um discurso de total rejeição à criação de um Estado palestino e a imagem de modernidade turbinada por seu sucesso nos negócios, Bennet virou a grande sensação da campanha como a nova face da direita.
Segundo as pesquisas, o Bait Yehudi será um dos três maiores partidos no próximo Parlamento, um triunfo sem precedentes para o movimento de colônias judaicas nos territórios palestinos.
A ascensão do partido de Bennett acentua a guinada da política israelense para a direita na última década.
Menahem Kahana/AFP
Naftali Bennett, em campanha, chega à vila de Merkaz Shapira para visitar estudantes; ele quer anexar 62% da Cisjordânia
Diante da estagnação do processo de paz com os palestinos, a maioria do público perdeu a esperança e o interesse numa solução para o conflito. A esquerda, tradicional defensora de um acordo com os palestinos, virou uma minoria insignificante.
Bennett tem explorado a resignação geral com o status quo e a desconfiança em relação aos palestinos para conquistar votos da direita moderada e até do centro.
"O conflito não é a prioridade", disse Bennett em Jerusalém, sob aplausos. "Temos que nos concentrar em temas sociais e no desenvolvimento do país."
O pragmatismo tem fortes raízes ideológicas. "Por trás do partido de Bennett estão alguns dos rabinos mais reacionários dos assentamentos", diz Amnon Abramovich, analista do Canal 2.
Ex-líder do conselho de assentamentos judaicos na área ocupada por Israel em 1967, Bennett não perde nenhuma chance de defender o direito histórico dos judeus a todo o território, do mar Mediterrâneo ao rio Jordão.
Uma de suas propostas é anexar 62% da Cisjordânia, impossibilitando o Estado palestino reconhecido pela ONU no fim do ano passado.
Ao mesmo tempo, Bennett ganha terreno entre eleitores fora de seu círculo ideológico ao dar ênfase a temas sociais e econômicos, que estão em destaque desde os protestos de "indignados" israelenses no ano passado.
A fórmula de mesclar passado judaico com futuro sionista funcionou sobretudo entre os jovens que votarão pela primeira vez. O partido liderado por um ex-empresário de software investiu pesado nas redes sociais para divulgar sua campanha.
SONHO ISRAELENSE
Filho de judeus norte-americanos que se mudaram para Israel logo após a Guerra dos Seis Dias (1967), Bennett encarna muitos aspectos do "sonho israelense", o que explica parte de seu sucesso.
Após o serviço militar na mítica Sayeret Matkal, a principal unidade de elite do Exército israelense, Bennett criou uma empresa de software e ficou milionário aos 33 anos ao vendê-la por US$ 145 milhões (R$ 209 milhões).
Para Rafi Smith, um dos principais especialistas em pesquisas de opinião de Israel, a ascensão de Bennett se deve à história pessoal de sucesso, à juventude e também ao patriotismo.
"Bennett não é um fenômeno passageiro, mas produto de uma sociedade cada vez mais direitista e da mentalidade de bunker que predomina em Israel", diz Smith.
Poderia ser uma boa notícia para o premiê direitista Binyamin Netanyahu, cuja reeleição está praticamente assegurada. Mas virou um pesadelo e gerou uma guerra fratricida na direita israelense. Além de subtrair votos do partido governista, o Bait Yehudi seria um aliado incômodo.
Um gabinete com ministros que rejeitam o Estado palestino aumentaria a pressão internacional contra Israel. Para evitar isso, especulam analistas, Netanyahu poderá deixar Bennett de fora e tentar atrair partidos de centro.
Fonte: FOLHA DE SP
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ATUALIZAÇÃO:
Amran Mitza diz que atitude do eleitorado permite que líderes de direita adotem políticas mais liberais
Candidato ao Knesset diz que segurança foi o principal tema da eleição
DANIELA KRESCH (EMAIL·FACEBOOK·TWITTER)
ESPECIAL PARA O GLOBO (FACEBOOK·TWITTER)
Israelense passa por cartaz do primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu, e de Shelly Yachimovich JACK GUEZ / AFP
TEL AVIV — Para o respeitado general da reserva Amram Mitzna, de 67 anos, não há dúvidas sobre como o eleitorado israelense votará nas eleições parlamentares na terça-feira. A maioria optará por partidos conservadores ou religiosos, na busca por líderes fortes que lembrem os ícones políticos do passado. Mas para o esquerdista Mitzna, ex-líder do Partido Trabalhista e ferrenho defensor de negociações com os palestinos, o voto na direita não significa que os israelenses tenham deixado a paz de lado. O ex-prefeito de Haifa e da cidadezinha de baixa renda Yeruham (que foi convidado a administrar, de 2005 a 2010, para ajudar a prefeitura a sair do buraco), volta a concorrer a uma cadeira no Knesset (o Parlamento) uma década depois de liderar os trabalhistas à derrota na disputa com Ariel Sharon nas eleições de 2003. Mas, dessa vez, concorre como número 2 da ex-chanceler Tzipi Livni no recém-criado partido de centro-esquerda Hatnuá (O movimento).
O GLOBO: Por que os partidos de centro não se uniram para concorrer juntos?
Amram Mitzna: Em primeiro lugar, porque não chegaram a uma conclusão quanto ao melhor caminho a seguir, ideologicamente falando. Claro que cada um acha que suas propostas são as mais certas, mas nesse caso há também uma questão de ênfase. O Partido Trabalhista (da jornalista Shelly Yachimovich) destaca a questão social. O Yesh Atid (Há Futuro, do jornalista Yair Lapid) trata das dificuldades da classe média. Já o meu partido, o Hatnuá (O movimento, liderado pela ex-chanceler Tzipi Livni) foca no processo de paz com os palestinos. Fora isso, todos têm um líder que não está interessado em ser copiloto ou o número 2 do outro...
Mesmo concorrendo separadamente, esses partidos serão uma alternativa real à próxima coalizão do primeiro-ministro de Israel Benjamin Netanyahu?
Amram Mitzna: Durante a campanha, cada partido de centro ou de centro-esquerda tenta ser maior que o outro. Mas a disputa real não é entre eles, é entre o bloco da esquerda e o da direita. Espero que, depois das eleições, descubram um ponto em comum. Não tenho como prever porque está claro que haverá uma disputa interna pela liderança de cada bloco.
Não seria melhor voltar à época de poucos e grandes partidos?
Amram Mitzna: Sim, mas é difícil voltar. O motivo é a perda de liderança política. Vota-se em partidos considerados “fortes” em busca de uma liderança inexistente. Não há mais líderes de estatura como no passado. O vácuo faz com que qualquer político iniciante ache que pode ser premier. Vivemos uma era de perda de liderança. Por todo o mundo democrático, os governantes têm tido que construir coalizões.
Os eleitores israelenses estão tendendo mais para a direita?
Amram Mitzna: Existe um fenômeno interessante quando se trata do eleitor israelense. É muito estranho. De um lado, o eleitor está tendendo para a direita, migrando para partidos mais conservadores e religiosos. Mas, de outro lado, quando o público é perguntado sobre suas posições, como por exemplo se concorda com a devolução de territórios palestinos, a grande maioria responde que está disposta a isso, que concorda com a criação de um Estado palestino, o que antes era tabu. Portanto, vemos um processo muito ambivalente. O público se aproxima das posições da esquerda, mas vota na direita.
Por quê?
Amram Mitzna: Isso acontece, entre outras coisas, pela mesma perda de confiança nos líderes que citei antes. Vota-se em partidos considerados “fortes” em busca de uma liderança inexistente. O lado bom disso é que líderes direitistas também podem conseguir apoio entre seus eleitores se decidirem dar passos mais liberais, como negociar com os palestinos, desmantelar assentamentos, essas coisas. A pergunta é se terão coragem de fazer isso.
Qual foi o assunto mais importante da campanha? Economia, Irã, palestinos, religiosos no Exército?
Amram Mitzna: Boa pergunta. Apesar de todos terem falado muito de questões sociais, o que está em jogo, no fim das contas, é a sensação de segurança. E é aí que Netanyahu sai ganhando. Ele tem uma imagem de líder experiente, que entende de segurança, que vai manter os interesses do país e defender Israel. E imagem, nesse caso, é tudo.
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