22/08/2015 - 18:53
Estudo conclui que profissionais e gestores dos hospitais ainda não assumem segurança do doente como uma "prioridade".Os eventos adversos graves e que podem causar sequelas e, eventualmente, a morte dos pacientes não surgem incluídos neste estudo
RUI GAUDÊNCIO
São os próprios profissionais de saúde que o admitem: só cerca de um terço dos erros e eventos adversos são notificados em Portugal, quando nos Estados Unidos e no Reino Unido a percentagem é duas vezes superior, revela um estudo feito pelo Departamento de Qualidade da Direcção-Geral da Saúde (DGS).
Este resultado é inferior ao obtido noutro estudo semelhante realizado em Portugal em 2011, altura em que eram 44% os profissionais que garantiam comunicar os erros e eventos que poderiam ter causado danos aos doentes, como por exemplo trocas de medicação e infecções.
Os eventos adversos graves e que podem causar sequelas e, eventualmente, a morte dos pacientes não surgem incluídos neste estudo, porque é suposto serem obrigatoriamente notificados e investigados.
Nos EUA, um inquérito com características idênticas, indicava, no ano passado, que 66% dos profissionais de saúde tinham por hábito notificar erros e eventos adversos, enquanto no Reino Unido, em 2010, a percentagem era de 71%. Ao nível de Portugal, só mesmo a Espanha em 2008, e mesmo assim com 47%.
A “frequência da notificação” de “erros/ocorrências” foi apenas uma das 12 dimensões da cultura de segurança nos hospitais em avaliação através de um questionário online auto-preenchido pelos profissionais em 55 unidades hospitalares públicas e privadas, em 2014, e cujos resultados foram agora divulgados pela DGS no Relatório de Segurança dos Doentes.
Os resultados obtidos nas 12 dimensões avaliadas demonstram que as percentagens observadas em Portugal são maioritariamente inferiores às registadas noutros países, enfatizam os autores deste estudo que foi elaborado em conjunto com a Associação Portuguesa para o Desenvolvimento Hospitalar. Responderam 17.928 profissionais de saúde, sobretudo enfermeiros e médicos. A taxa de adesão ao questionário foi de 18,3%, o que pode revelar, logo à partida, “o fraco envolvimento dos profissionais e das instituições” nas “questões da segurança do doente”, nota-se.
Os autores concluem que a segurança do doente “ainda não é amplamente assumida como uma prioridade pelos profissionais e pelas instituições” e que a “cultura de notificação e aprendizagem dos hospitais é fraca”. Alertando que uma insuficiente cultura de segurança dos doentes “constitui um grave problema de saúde pública”, além de representar um pesado ónus económico, lembram que um relatório elaborado pela Rand Corporation em 2008 para a Comissão Europeia estimava que “8% a 12% dos doentes internados em hospitais são afectados por eventos adversos resultantes dos cuidados de saúde recebidos e não da sua doença”.
Diversos estudos internacionais têm, de facto, vindo a indicar que aproximadamente 10% dos doentes que recorrem aos hospitais sofrem um evento adverso como consequência dos cuidados prestados. As causas mais frequentes prendem-se com o uso inadequado de medicamentos, as infecções e as complicações após intervenções cirúrgicas. Estes estudos indicam também que cerca de 50% destas complicações poderiam ter sido prevenidas.
Voltando ao estudo da DGS, os autores defendem que são prioritárias “acções de melhoria”, não só na dimensão da frequência da notificação dos eventos, mas também na resposta ao erro não punitiva e na dotação adequada de profissionais de saúde. Quando se olha para as respostas ao questionário percebe-se que muitos tenham ainda alguma relutância em comunicar os erros: por um lado (e são 33% os que o confessam), porque sentem que os seus erros são utilizados contra eles e, numa percentagem inferior, mas também significativa (23%), porque lhes parece que “é a pessoa que está a ser alvo de atenção e não o problema em si”.
Acresce que a dotação de trabalhadores também não será muitas vezes adequada à quantidade e à responsabilidade do trabalho. A este respeito, 29% dos inquiridos queixam-se mesmo de “trabalhar em ‘modo crise’, tentando fazer muito e demasiado depressa”.
Mesmo assim, quando se pediu aos trabalhadores uma avaliação geral da segurança, 50% respondeu que a considera “excelente” ou “muito boa”, 41%, “aceitável” e 7%, “fraca”. Apenas 2% admitiu ser “muito fraca”.
Os responsáveis da DGS fazem uma série de recomendações, por exemplo a de que, mensalmente, nas unidades e serviços, seja eleito o “campeão da segurança do doente”, que se promova uma cultura não punitiva e que se elaborem escalas de equipas tendo em atenção os limites mínimos que contribuem para a segurança dos doentes.
Fonte: http://www.publico.pt/
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