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sábado, 5 de outubro de 2013

MÁRCIO SCHAEFER - Sangue bom ele tem

Seu pai, que eu conheci advogando para o Banco do Brasil, 
 é um sujeito de boa índole, estudioso, trabalhador e sobretudo um cavalheiro muito querido da maioria que o conhece. Isto também deve ter sido preponderante na sua brilhante carreira.

Nossos cumprimentos a essa família bem sucedida, da qual se orgulham os catarinenses.


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A paixão que tornou Marcio Schaefer o maior projetista de barcos do país
Catarinense de Florianópolis, empresário iniciou a carreira junto ao mar como velejador

Ao criar o maior barco nacional Marcio consolida uma carreira de duas décadasFoto: Ricardo Wolffenbüttel / Agencia RBS
Cristiano Santos



Desbravar e desvendar novas águas são sentimentos que correm na veia dos Schaefer. O pai de Marcio desceu a Serra ainda bebê, aos três anos, quando a família deixou Lages para encontrar o mar em Florianópolis. As águas, inúmeras vezes, definem a vida de muita gente. Para essas pessoas, o desconhecido não assusta, estimula. Estão dispostas a realizar seus desejos. E a vida não é um apanhado de vontades? 

Marcio Schaefer sempre soube que passaria a vida desenhando. É assim há muito tempo. O catarinense é hoje um dos melhores e mais respeitados projetistas de barcos do país. De seus estaleiros saem "naves espaciais" que deslizam suavemente por todos os oceanos do planeta. 

Ele nasceu e cresceu em uma ilha que ficou no passado. Brincava com os amigos nas ruas da região central sem causar qualquer preocupação aos pais. Andava de bicicleta na Mauro Ramos, na Urbano Salles, por ali. Estudou no Catarinense. 

– Tive uma infância muito boa, em uma cidade pacata. Meu pai fez a carreira dele aqui, minha mãe é daqui, parente de longe do Hercílio Luz – revela, confirmando aquela história de DNA do início do texto. Os Ramos, sobrenome do pai, são conhecidos na Serra pelo pioneirismo em diferentes setores. 

A relação com o mar, para quem é filho de um pequeno pedaço de terra cercado por ele, é incontestável. Antes de a população crescer vertiginosamente, os florianopolitanos passavam o inverno no Centro e o verão nas praias. Migração que alguns locais ainda mantêm como uma tradição. No Campeche, o tio tinha uma casa no meio do nada, só mato, areia e mar. Foram os tios, inclusive, que levaram Marcio ao Iate Clube Veleiros da Ilha. 

– Como meu pai não tinha uma proximidade com o mar, comecei a velejar com os meus tios. Tinha uns 14 anos, ia todo dia, não queria mais sair de lá. 

Adentrar este universo foi como uma porrada. Deu o start. Quando criança, ele ficava desenhando na cabeça vários objetos. Certa vez, construiu por dias um kart, mas no papel a ideia não se concretizou. Velejando compreendeu que os rabiscos a partir de agora seriam seu instrumento de trabalho. E não seriam só rabiscos.

A fase como velejador durou alguns anos. O rapaz se tornou uma promessa, abocanhou prêmios, estava no auge. Mas apesar da pouca idade, o catarinense sabia das dificuldades da profissão. Elas não se relacionavam só ao temperamento da natureza. Os caminhos eram e ainda são curtos na área. 

– Eu fui preparado para ser médico, engenheiro ou advogado. Só estas três profissões eram aceitáveis na época e na minha família. Primeiro, você tem que aceitar que vai dar este passo, para uma profissão que ninguém conhece. O outro passo é convencer a família de que você não está louco. Hoje quem vê a minha fábrica pensa que fazer barco é uma coisa legal. Mas era um mercado que só existia fora daqui, muito distante. 

Marcio posa debaixo da Ponte Hercílio, local de um de seus estaleiros. Foto: Ricardo Wolffenbüttel/Agência RBS

Curso por correspondência

Quando chegou a hora do vestibular, Marcio optou pela Engenharia Mecânica da Universidade Federal de Santa Catarina. Mas dividia os livros com o esporte pelas águas brasileiras. 

Tinha 18 anos e competia sem parar, passava três meses aqui, três meses no Rio de Janeiro, curtia a vida como a idade permitia. A Joaquina era o point, "o" lugar. E a universidade, em que Matemática e Física não eram problemas sem solução, insistia em uma greve a cada três meses. Por correspondência, iniciou um curso de desenho de barco. Pirou. Começou a desenhar todo dia, a pesquisar, e comprou a primeira prancheta e alguns livros – difíceis de serem encontrados até hoje. Estava decidido: seria projetista de barcos. Teve a sorte de um pai que financiou os estudos por três anos em Buenos Aires. 

– Ir para a Argentina era uma evolução, tinha outros filhos de conhecidos que estudavam Medicina ou Odontologia lá. A Argentina era um país muito desenvolvido, muito superior ao Brasil na época, não era o que a (presidente) Cristina (Kirchner) transformou hoje. Eles eram muito fortes na náutica, tinham muitos estaleiros, muitos projetistas. Eu comecei a viver num círculo em que só falava sobre barcos. O dia inteiro – relembra. 

Mesmo ao lado de figurões da área, Marcio se destacava. Além da paixão incontrolável, tinha o conhecimento da prática como velejador. Era capaz de montar e desmontar um barco. Novamente virou promessa. Virou referência. 

Nas charmosas calles da capital portenha, o projetista foi complementando sua biografia. Conheceu a primeira mulher através de um amigo em comum. Deste amor, nasceram os filhos Marcio e Barbara – ele trabalha com o pai; e ela, na área de turismo em Londres. A faculdade terminou e a família veio para o Brasil. De volta a Florianópolis, se viu desacreditado, inexperiente. Normal. Foi trabalhar em São Paulo, mas o chefe não captou o talento como deveria. Em casa, o casamento acabou e as crianças voltaram para o país vizinho com a mãe. 

– Eu tinha uma deficiência em inglês e sabia que precisava dominar o idioma, pois já tinha deixado passar oportunidades. Estava com 27 anos e fui para a Europa de barco, com uns velejadores. Passamos primeiro pelo Caribe, vi o primeiro topless, fui me acostumando – fala, rindo, com as cenas na memória dos quatro meses a bordo fazendo o caminho contrário dos nossos colonizadores. 

Na festa de 50 anos, Marcio e o pai, o advogado e desembargador aposentado João José Ramos Schaefer. Foto: Norton José/Divulgação

R$ 30 mil e R$ 30 milhões

No Velho Continente, aportou na Espanha, fez ótimos contatos e foi à luta. Desbravando. E claro trabalhou com barcos. Ficou um ano e pouco e retornou para Santa Catarina. Estava na hora de concretizar os próprios projetos, criar uma identidade, mostrar o que tinha aprendido nestas andanças. 

– Voltei pra Florianópolis, montei o escritório e comecei tentando vender um projeto para um e pra outro, ainda era uma coisa muito incipiente. Todo mundo queria um projetista vindo de fora. Para o povo inglês, por exemplo, tudo o que é deles é melhor. O brasileiro, se o cara falar espanhol, se baba todo. A explicação para o fracasso é que o Brasil não funciona. Mas às vezes, é por preguiça – sentencia, sem meias palavras, uma de suas características. 

No início, desenhou um barco para um amigo, "uma lanchinha". Como projetista, a vida estava um pouco áspera. Pensou em alugar lanchas em Canasvieiras, na época outro point, familiar, badalado, movimentado. Ri alto quando lembra que a projeção de lucro era de R$ 30 mil – só em 2012, ele investiu R$ 30 milhões em sua fábrica de sonhos. O amigo precisou ser pressionado para montar a tal lanchinha e, no meio da conversa, acabou vendendo as fôrmas, um rolo de manta e um tambor de resina de vidro para o projetista. Atualmente ele se orgulha de ser o maior consumidor de resina para náutica deste país. 

– Eu tinha que fazer as coisas e comprei metade de um estaleiro junto com um amigo da família. Só que eu meti uma visão diferente do negócio, com uma velocidade que o sócio não aguentou. Não tinha capital de giro, apenas um talão de cheques do Banco do Brasil. Eu desenhava, fazia e vendia. Faltava um parafuso, saía para comprar, rodando numa Parati. Foi assim que começou. 

Foi assim que, em 1992, nasceu a Schaefer Yatchs, hoje uma fábrica com estaleiros em Florianópolis, Biguaçu e Palhoça, produtora de 10 modelos de barcos que vão de 26 a 80 pés e podem custar até R$ 12 milhões. Foi o Schaefer 800, de 80 pés e quase 25 metros de comprimento e 50 toneladas de peso, que consolidou o tamanho da realização do empresário. É o maior barco construído por uma empresa nacional. Entre os parceiros, a Pininfarina, responsável pelo design de marcas como Ferrari e Maseratti, que decorou a Phantom 600 (60 pés). Suas criações são vendidas para empresários como Michel Klein, das Casas Bahia, e celebridades do porte do onipresente Luciano Huck ou o sambista Zeca Pagodinho. Gente que poderia ir até Marte em busca de um novo brinquedo. Mas preferem vir até Santa Catarina para, com o criador, se emocionarem durante o ritual de quebrar a garrafa de champanhe no casco da nova aquisição. 

No meio de tudo isso, Márcio conheceu Raquel, sua mulher, em um Baile Municipal do Clube 12. Namoraram "oito ou 10 anos" antes de casar. Seguindo seu rumo e com o domínio total do estaleiro, Marcio fez uma lancha, foi aprendendo como era o negócio, correu riscos e profissionalizou a empresa. Eram cinco ou seis funcionários. Hoje a marca é responsável por 950 empregos diretos e 2 mil indiretos.

– A grande vantagem de eu ser daqui, apesar de estar fora dos grandes centros, era que quando ia alugar um galpão não precisava de avalista, sabiam que era gente honesta. Você ia numa loja e pedia crédito. Em outro lugar não teria montado toda esta estrutura. Ter uma família conhecida ajudou bastante. 

Primeiro, veio um barco de 19 pés, depois 23 e assim sucessivamente, sempre em ordem crescente.

Lançado este ano, o Schaefer 800, de 80 pés e avaliado em R$ 12 milhões, é o maior barco construído por uma empresa nacional. Foto:Schaefer/Divulgação

Madrugadas com Eros Ramazzotti

– Até hoje quando fazemos um barco de 80 pés, por exemplo, com uma tecnologia muito boa, um trabalho complexo, vejo que tudo isso veio da base. Lá de trás. Eu sei que tenho que buscar, pesquisar, encontrar assessoria. A tecnologia tem que ser conquistada, além de formar uma equipe. 

E mesmo com um batalhão de colaboradores, os projetos continuam saindo das madrugadas ao som do italiano Eros Ramazzotti (ou um bom e velho rock'n roll). Quando a maioria está dormindo, Marcio Schaefer solta a imaginação. Ele gosta de acompanhar todos os processos, da produção à venda. Só lança um produto novo no mercado – e as feiras de náutica o aguardam com ansiedade – quando "ele tem pernas próprias". Traduzindo, quando estiver sendo fabricado na velocidade que ele quer. 

– Fazer um barco qualquer um faz, Cabral já fez isso... O importante é fazer um barco de série, um produto comercial, consolidar a produção, a venda. Esse é o meu negócio. Eu sou um cara muito humilde na hora da criação e me abro muito ao que está acontecendo no mundo. Eu vou a todas as feiras, conheço todos os barcos, viajo o mundo pesquisando. Eu não sou inventor, sou projetista. Então tenho que pegar a melhor ideia do que está acontecendo no mercado. A gente acaba inventando alguma coisa, mas não é esse o meu trabalho – define. 

O sucesso de seus barcos é resultado de uma vida inteira de dedicação. O lazer e o trabalho se misturam. Uma coisa não se separa da outra. Quando quer silêncio, tomar um bom vinho e cozinhar – a filha, Barbara, que acompanha a entrevista, revela que o pai faz risotos elogiadíssimos –, prefere deixar a pessoa jurídica de lado. Na casa no Canto da Lagoa, as cozinheiras sabem exatamente o que o patrão gosta de ver à mesa. O preparo do bacalhau, outra de suas especialidades, foi, por exemplo, ensinado passo a passo para a equipe.

– Sou chato, sou detalhista. Eu relaxo saindo de barco, tenho um 26, pequeninho. Tenho um 62 no clube, mas não uso. Quando todo mundo está indo pro Tinguá, eu quero ir para outro lugar para curtir o mar, para relaxar. Gosto que o ritual de cozinhar dure horas. Se não for assim, vou comer fast food. 

Em 2012, Marcio comemorou os 50 anos com um festão onde tudo começou. Recebeu no Iate Clube amigos, representantes de todo o Brasil, funcionários e familiares. Não tinha motivos para não celebrar em grande estilo. 

– É bom chegar nesta idade e ter feito as coisas que a gente fez. Quando somos jovens não sabemos o que será do futuro. Eu queria fazer as coisas que eu fiz. A maior alegria que posso ter é o reconhecimento profissional e a minha família. A equipe que tenho também me orgulha, são as pessoas com quem eu posso contar. São pessoas que ajudamos a formar, é muita gente que faz parte desta história. São muitas vidas, são pessoas que não eram nada há 20 anos. Eu peguei muita gente desacreditada e fiz o cara ser um profissional respeitado. Gente que deve a vida a mim, de certa forma – encerra com lágrimas nos olhos, dominado pela emoção de revisitar, em pouco mais de três horas, sua própria história.

Fonte: DC

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