Defensores dos animais pediram ao presidente da Assembleia Legislativa para reabrir o debate
Projeto pretende organizar eventos que incluam cavalos, adequando-os às leis de proteção aos animais e permitindo-os de entrar no calendário oficialFoto: Antenor Tatsch Jr. / Divulgação
Rafael Diverio
Pronto para ir a votação, o projeto de lei que reconhece "o direito de andar a cavalo, individualmente ou em grupo" e transforma a cavalgada em patrimônio cultural do Estado pode ter o trote interrompido. É o que tentam os defensores dos animais, que consideram o texto exagerado e pedem que a Assembleia Legislativa amplie o debate antes de votá-lo.
Integrantes do Movimento Gaúcho de Defesa dos Animais (MGDA) entregaram nesta segunda-feira um requerimento ao presidente do Legislativo gaúcho, deputado Pedro Westphalen (PP), para que impeça a votação do projeto 312/2012.
De autoria da Comissão de Agricultura, Pecuária e Cooperativismo, à época presidida por Ernani Polo (PP), a ideia do projeto é organizar eventos que incluam cavalos, adequando-os às leis de proteção aos animais e permitindo-os entrar no calendário oficial. Polo garante que a proposta facilita a realização de festas menores, por flexibilizar algumas condições e permitir captação de verba pública.
Nesses itens estão as principais queixas. Para Naor Nemmen, presidente da ONG Porto Alegre Melhor, a lei, basicamente, tenta evitar responsabilidades. Ele ainda reclama que o local escolhido para a audiência pública sobre o PL — um dos trâmites legais no processo da lei — tenha sido a cavalgada do mar:
— Como alguém que é contra poderia participar de uma reunião assim? É praticamente como fazer uma festa de gremistas no Beira-Rio — comenta.
Para o veterinário José Arthur Martins, vice-presidente do Conselho Regional de Medicina Veterinária (CRVM), o projeto apresenta aspectos positivos, como a presença de profissionais e a garantia do bem-estar animal. Questiona, porém, pontos citados pelos ativistas, como a presença de um veterinário em eventos com cem ou mais conjuntos de cavalarianos e a determinação, por parte dos organizadores, do tempo de descanso aos animais nas cavalgadas.
— Só um médico-veterinário conhece a fisiologia do animal para montar um cronograma que não fira o cavalo. E isso depende do piso a ser percorrido, do peso do cavalariano e outros itens. Enfim, no contexto geral, a ideia é boa, mas precisa ser mais adaptada — diz.
O deputado Pedro Westphalen garantiu que repassará as reivindicações dos manifestantes para as comissões pertinentes ao projeto.
O QUE ESTÁ SENDO PROPOSTO
Projeto 312/2012 tenta regulamentar a relação do gaúcho com o cavalo:
— Pela proposta, eventos equestres passam a ser práticas desportivas e culturais, podendo captar recursos públicos para suas realizações.
— Além disso, o texto permite que a organização dos eventos determine a quantidade de tempo de atividade e descanso dos animais.
— Exige que prefeituras organizem o trânsito e garantam a limpeza das vias imediatamente após a passagem dos animais.
— Proíbe que os eventos firam o bem-estar animal, transformando o condutor ou proprietário em único responsável pela saúde do cavalo.
— Impede também que eventos com mais de cem cavalos ou percurso superior a 40 quilômetros sejam realizados sem a presença de um veterinário.
— É vedada motivação político-partidária nos eventos equestres previstos neste artigo.
ENTREVISTA > Naor Nemmen — Integrante do Movimento Gaúcho de Defesa dos Animais (MGDA)
“O projeto beira a esquizofrenia”
Zero Hora – Por que o grupo é contra o projeto apresentado pela comissão?
Naor Nemmen – A proposta, na verdade, é uma gigantesca colcha de retalhos. A alma deste projeto é reconhecer o fato de andar a cavalo com o patrimônio cultural rio-grandense. Mas, se olhar bem, vemos que se aplica a eventos tradicionalistas ou não. Quer dizer, se tiver a festa de peão de Barretos, baseada em cowboys americanos, vai se enquadrar nesta lei. O projeto beira a esquizofrenia. Estão tentando se eximir de qualquer responsabilização ou fiscalização. Além disso, a lei garante aos eventos entrar no calendário oficial tanto cultural quanto esportivo e captar verba pública.
ZH – Quais as irregularidades que o senhor aponta no projeto?
Nemmen – O projeto fere um dos itens do código do Conselho Regional de Medicina Veterinária, que determina um veterinário para cada 11 conjuntos de cavalos e cavalarianos, por exemplo. Mais: libera aos organizadores a determinação dos tempos de descanso nas cavalgadas. Isso deve ser feito por profissionais. E tem outros itens: exige que prefeituras liberem trânsito e limpem ruas após as passagens. Também não houve parecer formal pela comissão de saúde e meio ambiente, da Assembleia Legislativa. E a audiência pública para apresentar o projeto foi realizada na própria cavalgada do mar.
ENTREVISTA > Ernani Polo — Deputado estadual, que presidia a comissão que propôs o projeto
“Procuramos garantir equilíbrio”
Zero Hora – Por que foi criado este projeto de lei?
Ernani Polo – O projeto tenta regulamentar para garantir os eventos de cavalgadas e rodeios, da nossa tradição, e garantir o bem-estar dos animais. Procuramos garantir equilíbrio, e não dependermos mais de Termos de Ajustamentos de Conduta (TAC). Debatemos na AL, no MTG, na OAB.
ZH – Por que a audiência pública foi realizada na Cavalgada do Mar e não em um local mais acessível?
Polo – Recebemos solicitação para fazer o debate e a comissão de agricultura fez lá, como fazemos em vários locais, sobre vários temas. A partir daquele encontro, começou a ser discutido. Tanto que o projeto foi aprovado por unanimidade nas comissões de constituição e justiça e de educação. Quando é assim, não precisa passar pelas demais.
ZH – Essa lei facilita a captação de recursos?
Polo – Na verdade, não. Hoje em dia já tem condição de captar pela Lei de Incentivo à Cultura (LIC) ou pela Lei Rouanet, basta aprovar projeto.
ZH – Sobre a cavalgada, não teria de ser um profissional a determinar tempo e distância percorridos?
Polo – Mas se tu botares poucos animais e tiver que contratar um veterinário, vai complicar o evento. Se engessar muito, esses eventos vão acabar. É um prejuízo às futuras gerações.
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