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segunda-feira, 21 de outubro de 2013

Maior consumidor mundial de agrotóxicos, Costa Rica tem alta incidência de leucemia infantil



Foto: Giorgio Trucchi/Opera Mundi

Do Opera Mundi

Dados dos WRI (World Resources Institute), organização dedicada a investigar questões ambientais, apresentam a Costa Rica como o maior consumidor de agrotóxicos do mundo, com 51,2 quilos por hectare. Em 2009, o país importou mais de 400 TM (toneladas métricas) em fórmulas com bromometano, um agroquímico e componente apontado como destruidor da camada de ozônio (XVI Relatório sobre o Estado da Nação em Desenvolvimento Humano Sustentável 2010).

O IRET (Instituto Regional de Estudos sobre Substâncias Tóxicas) da Universidade Nacional da Costa Rica, revelou, no começo de 2011, que a quantidade de agrotóxicos importados entre 1977 e 2006 aumentou 340%, alcançando um total de 184 817 TM em quase 30 anos.

Ainda mais preocupante é a tendência do aumento do uso destes produtos. Em 1977, com cerca de 345 mil hectares dedicados à agricultura, o país importou 2.800 toneladas de pesticidas. Em 2006, com 451 mil hectares plantados (30,7% mais de território), a importação destes produtos chegou praticamente às 12 mil toneladas (328% mais de agroquímicos). Em 2010, o Serviço Fitossanitário do MAG (Ministério de Agricultura e Pecuária, por sua sigla em espanhol), reportou o uso de 14 mil toneladas de ingredientes ativos de agrotóxicos, isto é, três quilos consumidos para cada costarriquenho.

Segundo o engenheiro agrônomo Fernando Ramírez, um dos produtos tóxicos mais usados é o Mancozeb. Em declarações à imprensa nacional, Ramírez explicou que este produto gera efeitos tóxicos em longo prazo e doenças crônicas. Além disso, são comumente utilizados alguns fosforados e fungicidas, como o Paraquat e o Endosulfan, produtos que já foram suspensos em muitos países por seus efeitos sobre a saúde e o meio-ambiente.

Fontes acadêmicas estimam que 4,5% dos trabalhadores agrícolas costarriquenhos sofrem uma intoxicação por ano. Mas os graves efeitos causados pelo contato direto com agrotóxicos não parecem estar caindo apenas sobre os trabalhadores e trabalhadoras agrícolas, mas também sobre seus descendentes.

Com o objetivo de “contribuir para o conhecimento científico sobre os riscos cancerígenos dos agrotóxicos e outras substâncias tóxicas”, e servir como base para a tomada de decisões regulatórias nacional e internacionalmente, o IRET e o Instituto Karolinska da Suécia realizaram, em 2008, o estudo “Exposição ocupacional e ambiental de pais e mãe a agrotóxicos, outros contaminantes e leucemia.”

A doutora Patrícia Monge Guevara, então coordenadora do Mestrado em Saúde Ocupacional e pesquisadora do IRET, disse que “dois fatores nos motivaram a promover esse estudo. O primeiro é que a Costa Rica tem uma das mais altas incidências mundiais de leucemia infantil, e o segundo é que entres as causas mencionadas na literatura internacional figura a exposição ou contato com substâncias químicas”. Dentro dessas substâncias estão os agrotóxicos.

O estudo demonstrou que existe uma relação clara e direta entre esses dois fatores – a exposição dos pais aos agrotóxicos e a leucemia — e que o risco de desenvolver a doença [entre os que se expõe a agrotóxicos] é até três vezes maior que o normal. Mais ainda, essa relação acaba sendo ainda mais alta quando o contato com essas substâncias é feito pela mãe durante a gravidez e durante o primeiro ano de vida da criança.

“Os resultados são claros. Podemos concluir que o contato dos pais e mães com agrotóxicos antes do nascimento e no primeiro ano de vida da criança contribui para a aparição da leucemia infantil. Mas vamos além, porque ficou clara uma associação entre grupos definidos destas substâncias, como, por exemplo, os organofosforados, entre eles o Diclorvós, Fenamifos, Malathion, Metamidofós, Foxim e o Terbufos, alguns herbicidas como o Paraquat y Picloram e fungicidas como o Benomyl e o Mancozeb”, detalhou a doutora Monge.

Apesar de o estudo não incluir uma análise por região geográfica, estima-se que as áreas mais afetadas sejam as rurais, onde as trabalhadoras e os trabalhadores estão expostos ao contato com agrotóxicos, e em particular as monoculturas.

Milho transgênico

A quase inexistente produção de milho no país despertou o apetite das grandes companhias que controlam o mercado de sementes no mundo, e que estão inundando os países com seus produtos geneticamente modificados (OGM).

Em novembro de 2012, a empresa D&PL Semillas Ltda, subsidiária da companhia Delta & Pine Land, controlada pela Monsanto, apresentou para a CTNBio (Comissão Técnica Nacional de Biossegurança) uma solicitação para plantar na região de Guanacaste vários hectares de milho transgênico MON-88017, MON-603 e MON-89034.

Em estudo recente conduzido pelo biólogo francês Gilles Eric Seralini mostrou que ratos alimentados com milho transgênico MON-603, patenteado pela Monsanto, morreram prematuramente e tiveram uma frequência de tumores de 60-70%, frente a 20-30% do grupo ao qual esse alimento não foi fornecido.

Depois da decisão da maioria dos integrantes da CTNBio de aprovar a solicitação da D&PL Semillas Ltda, várias organizações ambientalistas e setores da sociedades costarriquenho interpuseram um recurso perante à Sala Constitucional, alegando a inconstitucionalidade de três artigos (117, 118 e 132) do Regulamento da Lei de Proteção Fitossanitária.

Assim, conseguiu-se a suspensão de todos os trâmites que estavam pendentes, entre eles a permissão outorgada à Monsanto, até que os magistrados escutem as partes, adquiram mais informações e emitam uma sentença sobre o fundo do recurso.

Esta nova luta de Davi contra Golias incluiu um componente de conscientização nos territórios, cujos resultados foram inesperados. Durante a histórica mobilização “Caminhada em Defesa do Milho”, que em novembro de 2012 atravessou toda a Costa Rica, múltiplas atividades com as populações locais e com as autoridades municipais foram organizadas, mais de sete mil assinaturas foram coletadas e mais de 18 mil panfletos informativos foram distribuídos.

Além disso, um crescente número de setores acadêmicos e institucionais se expressou publicamente contra a plantação de transgênicos. “Foi reativado o músculo social, capitalizando o descontentamento generalizado que existe no país. Nestes meses nos dedicamos a trabalhar nos municípios e conseguimos que 62 dos 81 municípios que existem na Costa Rica se declarassem livres de transgênicos, isto é, 76% dos governos locais do país”, disse a Opera Mundi Fabián Pacheco, membro da Federação Ambientalista e mestre em Agrobiologia Ambiental.

Embora as autoridades governamentais não reconheçam esse resultado, por considerar que o poder sobre o modelo de desenvolvimento agrícola é do governo central e não dos locais, Pacheco acredita que esse processo permitiu “tornar cada vez mais visível a questão dos transgênicos e capacitar as pessoas para essa discussão.”

Frente a este avanço a aos resultados obtidos, Pacheco, que é também representante do setor ambiental frente à CTNBio, apresentou em 16 de outubro, Dia Mundial da Alimentação, projeto de lei de moratória contra a plantação de transgênicos na Costa Rica.


“O que se conseguiu nos territórios nos dá legitimidade e respaldo suficiente, em palavras e votos, para apresentar, frente à Assembleia Legislativa, um projeto desta magnitude. É um passo adiante nessa grande luta para declarar a Costa Rica um país livre de transgênicos”, garantiu.

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