Cresce, agora nos EUA, movimento pela rotulagem dos transgênicos. Empresa lança vasta campanha sobre “benefícios” de seus produtos, mas não explica por que procura ocultá-los do público
Por Taís González | No Blog da Redação do Outras Palavras
Nada como um teste prático, sob pressão social, para verificar o que há por trás dos discursos de “respeito ao consumidor” e “responsabilidade social” das grandes corporações. Nos últimos anos, a Monsanto – maior empresa agrícola do mundo e principal desenvolvedora de sementes transgênicas – multiplicou seus investimentos em publicidade. Passou a atuar de modo intenso nas próprias redes sociais. Desdobrou-se para “demonstrar” que seus produtos são benéficos, para a saúde humana e o ambiente.
Agora, estas alegações estão sendo testadas em seu próprio país de origem – os Estados Unidos. Em 5/11, um plebiscito no estado de Washington poderá assegurar, aos consumidores, o direito de ser informados (por aviso na embalagem) sobre a presença de transgênicos em alimentos, bebidas e sementes. Foi convocado por iniciativa popular. A empresa age contra ele, mas enfrenta forte dificuldade. Uma pesquisa recente, do New York Times, revelou que 93% da população defende a rotulagem.Os novos esforços de marketing da Monsanto estão descritos num texto do site Alternet. Em julho passado, o site Holmes Report, voltado ao mundo das relações públicas, informou que a corporação buscava assessoria especializada para gerenciar sua crise de imagem. Depois de ter recebido o título de “Pior empresa do ano” (em 2011), ter enfrentado uma onda global de protestos virtuais, iniciada em maio (que mobilizou mais de 2 milhões de pessoas), a mega-indústria liderou o lançamento do site GMOAnswers.com (“respostas sobre transgênicos”).
Financiado por mais de cinquenta multinacionais de alimentos, agronegócio e empresas de biotecnologia, ele promete responder todas as perguntas relacionadas aos organismos geneticamente modificados. Este esforço foi ampliado com declarações públicas de dirigentes da Monsanto, Em entrevista à DW, Ursula Lüttmer, da sucursal alemã, afirmou que os investimentos da corporação visam a uma agricultura sustentável, que ajude a produzir mais alimentos, proteja os recursos naturais e promova um melhor padrão de vida.
Estes argumentos têm sido amplamente desmentidos, também na internet. As culturas geneticamente modificadas enfrentam resistência desde que foram introduzidas, na década de 1990. As críticas, antes restritas a vozes solitárias, tiram proveito da rede para ganhar consciências e ruas. Sites como o March Against Monsanto [Marcha contra a Monsanto] ampliaram sua popularidade. Para 12 de outubro, estão convocando um protesto ao vivo, diante da sede mundial da empresa, em Saint Louis (EUA)
Mas o que a Monsanto parece mais temer – em contradição flagrante com sua promessa de transparência – são as iniciativas para rotular a embalagem de produtos que contenham transgênicos. De acordo com a própria corporação, isso equivale a colocar uma “caveira e ossos cruzados” nos pacotes de comida. Talvez por isso, a multinacional pressionou vigorosamente trinta estados norte-americanos, este ano, para evitar ou ao menos atrasar, as leis de rotulagem obrigatória; e ameaça processar outros (Vermont, Connecticut, Maine e Washington), se garantirem o direto a seus cidadãos o direito à informação sobre a origem do que ingerem.
Em Washington, a batalha tornou-se mais importante, porque envolve ampla mobilização social. Mais de 340 mil pessoas aderiram, no início deste ano, à campanha pela Iniciativa 522 (I-522), para garantir, em plebiscito, a identificação de organismos geneticamente modificados (OGMs). Convocada a consulta, a iniciativa passou a ganhar cada vez mais adeptos. Um site especialmente criado para divulgá-la oferece leituras sobre o tema, notícias, material de campanha, opiniões conceituadas (como a de chefs de resataurantes) e alista voluntários.
Lobby permanente: O temor da Monsanto diante da mobilização social desnuda outro aspecto importante de sua forma de agir: a prática permanente de lobby. Em março deste ano, o Congresso norte-americano aprovou (e o presidente Barack Obama sancionou) lei que restringe as ações na Justiça para deter o avanço dos OGMs. Empresas de biotecnologia não mais precisam da aprovação de um juiz para testar produtos ou comercializá-los (a norma ficou conhecida ironicamente como “lei de proteção à Monsanto”). Não é mais segredo que ex-figurões da companhia integrem altos escalões das cadeiras governamentais nos EUA. Um exemplo é Michael Taylor, que durante as duas últimas décadas alternou sucessivamente seu trabalho como advogado da Monsanto e chefe da regulamentação alimentar dos EUA, Food and Drug Administration (FDA).
Embora os órgãos reguladores dos Estados Unidos tenham demonstrado pouca preocupação pelos OGM, a pressão social segue aumentando. De acordo com o ProjetoNão-OGM, vários Estados consideram uma legislação que exija a rotulagem de alimentos feitos a partir de milho geneticamente modificado, soja ou outras culturas. No site do projeto, você encontra uma lista de produtos que não contém organismos geneticamente modificados e informações consistentes relacionadas ao tema. Além disso, “em resposta à flagrante violação de direitos dos estados para legislar”, o Organic Consumers Association (OCA) lançou uma petição para observar todos os membros do Congresso que apoiarem as investidas da Monsanto e seus aliados.
No Brasil, a rotulagem de alimentos transgênicos foi decretada em 2003. Empresas da área da alimentação, entre outras, são obrigadas a identificar com o símbolo preto T sobre um triângulo amarelo os produtos que contenham mais de 1% de matéria-prima transgênicas. Na prática, a norma é frequentemente descumprida e há constantes tentativas para revertê-la.
Uma das consequências dos cultivos de OGMs no país é o uso abusivo de venenos agrícolas. Em boa parte dos casos, a transgenia significa alterar o código genético das plantas para que se tornem capazes de suportar mais agrotóxicos. Embora seja o terceiro maior produtor agrícola do mundo, o Brasil está em primeiro lugar no consumo destes produtos, desde 2008. E ainda é o principal destino dos defensivos agrículas barrados no exterior. Estima-se que, por ano, a quantidade de agrotóxicos jogados nas lavouras é cerca de 5,2 litros por habitante.
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