26 de maio de 2020, 22h11
Não é possível admitir que em toda e qualquer hipótese haja a limitação do valor de multa por descumprimento de decisão judicial, sob pena de conferir ao condenado livre arbítrio para decidir o que melhor atende a seus interesses. O destinatário da ordem judicial deve ter em mente a certeza de que sua desobediência trará consequências mais gravosas do que o cumprimento.
Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva criticou descaso das empresas para com as decisões judiciais e negou impor teto às multas
Gilmar Ferreira
Com esse entendimento, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça confirmou a incidência de multa no valor de R$ 3,134 milhões em astreintes causadas por uma ação declaratória de indébito e indenização por danos morais. O valor terá de ser pago pelo Banco Santander e pela Aymoré, empresa de financiamento de créditos da instituição bancária.
No caso, a Aymoré foi condenada a indenizar um homem que teve o nome incluído no cadastro de proteção ao crédito por uma dívida de um financiamento que nunca realizou. Constatada a fraude, a empresa foi condenada a pagar R$ 20 mil de indenização, além de "limpar" o nome do autor, sob pena de multa diária de R$ 3 mil.
Essa decisão não foi cumprida, o que levou o autor a iniciar cumprimento de sentença de valor parcial acumulado indicando crédito de pouco menos de R$ 600 mil. A quantia foi bloqueada via BacenJud, mas não foi transferida para conta em juízo pelo Banco Santander. Nova decisão judicial, determinou essa transferência, sob pena diária de R$ 10 mil.
Nenhuma das medidas foi cumprida pelas partes, o que fez com que o autor da ação promovesse outros dois cumprimentos de sentença, em valor de R$ 1,611 milhão contra a Aymoré e R$ 2,8 milhões contra o Santander. Em dois recursos especiais, as duas partes pediram o estabelecimento de um teto e indicaram valor abusivo das astreintes.
Desobediência flagrante
"Nos dois casos concretos é tão flagrante a desobediência, o descaso e a desídia com as ordens judiciais que já há três condenações por desobediência — que são hipóteses que constituem ilícito cível e até criminal, é bom lembrar. Por qualquer exame que se faça, não conseguiríamos, lamentavelmente, reduzir o valor da multa", apontou o relator, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva.
No caso do Santander, ele destaca que o banco deixou de cumprir a ordem de transferência do valor bloqueado via BacenJud por 280 dias, uma ação que não encontra dificuldades de realização. Segundo o relator, não foram apresentados motivos plausíveis para o descumprimento da ordem, senão o fato de que a instituição confiava no afastamento ou redução da multa.
Da mesma forma, a Aymoré se recusou a cumprir a simples retirada do nome do autor dos cadastros de proteção ao crédito. O ministro Ricardo Villas Bôas Cueva classificou as ações como "ato atentatório à dignidade da Justiça" e destacou a elevada recalcitrância de ambas as partes em cumprir os mandamentos judiciais.
"O destinatário da ordem judicial deve ter em mente a certeza de que a desobediência trará consequências mais gravosas do que o cumprimento, e não ter a expectativa de limitação da multa, sob pena de tornar inóquo o instituto processual e violar o direito fundamental à tutela jurisdicional. Estaríamos aceitando a tese do descumprimento eficiente da ordem. Bastaria fazer as contas para deixar de cumprir [uma decisão]”, afirmou.
REsp 1.840.693
REsp 1.819.069
REsp 1.819.069
Danilo Vital é correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília.
Revista Consultor Jurídico, 26 de maio de 2020, 22h11
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