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quarta-feira, 27 de maio de 2020

3ª Turma do STJ admite prestação de contas para fiscalizar pensão alimentícia



NÃO BASTA SER PAI


27 de maio de 2020, 8h14




É possível determinar a prestação de contas para fiscalização de pensão alimentícia, pois a guarda unilateral pela mãe do menor obriga o pai a supervisionar os interesses dos filhos, sendo parte legítima para solicitar informações.

Ministro Moura Ribeiro abriu a divergência vencedora no julgamento da turma 

Paula Carrubba/Anuário da Justiça

Com esse entendimento, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça deu parcial provimento a um recurso especial para obrigar a mãe de uma criança a apresentar contas ao pai, demonstrando como utiliza o valor pago em pensão alimentícia. A decisão foi tomada por maioria, por três votos a dois.

O entendimento vencedor se baseia no parágrafo 5º do artigo 1.583 do Código Civil, que institui essa responsabilidade de supervisão ao genitor que não detém a guarda. Por isso, "sempre será parte legítima para solicitar informações ou prestação de contas, objetivas ou subjetivas, em assuntos ou situações que direta ou indiretamente afetem a saúde física e psicológica e a educação de seus filhos".

A decisão desafia precedente da própria 3ª Turma, que há pouco mais de um ano definiu que deficiências na administração da pensão devem ser objeto de análise global na via judicial adequada — não por prestação de contas. Esse foi o entendimento mantido pelos ministros Paulo de Tarso Sanseverino, relator do recurso, e Ricardo Villas Bôas Cueva. 
Ministra Nancy Andrighi fez diferenciação entre prestação de contas no procedimento comum e no especial 
Divulgação

Divergência vencedora

Abriu a divergência o ministro Moura Ribeiro, que superou os entraves do procedimento especial previsto nos artigos 550 a 553 do Código de Processo Civil para admitir a prestação de contas no caso. "Talvez não de forma mercantil, mas um pai tem o direito de saber se o filho está tendo o devido atendimento", concordou o ministro Marco Aurélio Bellizze.

O desempate a favor da divergência foi confirmado pelo voto da ministra Nancy Andrighi, durante a sessão por videoconferência nesta terça-feira (26/6). Ela apontou que o pedido do pai na inicial não tem qualquer requerimento de reconhecimento de existência de crédito — um dos entraves para reconhecer a prestação de contas, já que as prestações já pagas são irrepetíveis.

"O pedido de prestação de contas enquanto no procedimento especial é bifásico e objetivamente complexo — reúne obrigação de fazer, prestar contas na primeira fase, depois na segunda fase uma condenação —, o que não me parece excluir a possibilidade de pedido simples de prestação das contas, seguindo o procedimento comum, não o especial", apontou.

Entender diferente, segundo a ministra, significaria dizer que o direito previsto no parágrafo 5º do artigo 1.583 do Código Civil não poderia ser exercido em hipótese alguma. "Não podemos deixar a parte sem instrumento legal", destacou. "Não se pode igualar a prestação de contas como procedimento especial com aquele previsto no Código Civil", concluiu.

Indícios de mau uso da pensão
Ao decidir, os ministros da 3ª Turma destacaram as especificidades do caso concreto. O menor em questão tem severas necessidades especiais: é portador de Síndrome de Down, transtorno de espectro autista, problemas na coluna vertebral e deficiência visual. 

Para a ministra Nancy Andrighi, os autos trazem "indícios" de que os valores não estariam sendo vertidos em proveito do menor. O pai paga pensão no valor de 30 salários mínimos, mas ainda assim faz substanciosos gastos com a saúde do menor, que estuda em escola pública, "certamente incompatível com necessidades", segundo a autora do voto de desempate.

Assim, a partir do resultado da prestação de contas, inúmeros resultados podem surgir, todos em benefício do menor. Inclusive poderá fundamentar pedido de revisão de alimentos, ação de pedido de guarda, destituição de poder familiar ou reparação por danos materiais ou morais.

"Dado que no caso não houve destituição do poder familiar em relação ao genitor, ele não apenas poderia, mas deveria ter algum mecanismo de acompanhamento para ver se os alimentos estão efetivamente vertidos em favor do menor com tantos problemas. Poderá, inclusive, ser responsabilizado por sua omissão", destacou a ministra Nancy Andrighi.
REsp 1.814.639

 é correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília.
Revista Consultor Jurídico, 27 de maio de 2020, 8h14

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