Pois bem.: os ânimos estão a acirrar-se, entre as classes sociais, atingido nível bastante perigoso e o pior pode vir a acontecer.
“Em Mileto houve uma guerra entre ricos e pobres.
Estes, a princípio, venceram, e forçaram os ricos a fugir da cidade. Mas depois, lamentando não ter podido degolá-los, tomaram seus filhos, fecharam-nos em currais, e deixaram-nos pisar pelas patas dos bois.
Os ricos tornaram a conquistar a cidade.
Pegaram, por sua vez, os filhos dos pobres, besuntaram-nos com piche, e queimaram-nos vivos.”
Que acontecia então com a democracia?
Ela não era precisamente responsável por esses excessos e crimes, mas foi a primeira a ser atingida. Não havia mais regras.
Ora, a democracia não pode viver senão por meio de regras muito restritas, e melhor ainda observadas.
Não se viam mais verdadeiros governos, mas facções no poder.
O magistrado não exercia mais sua autoridade em proveito da paz e da lei, mas em proveito dos interesses e cobiças de um partido.
O comando não tinha mais nem títulos legítimos, nem caráter sagrado; a obediência não tinha mais nada de voluntário; sempre constrangida, estava sempre à espera de uma desforra.
A cidade, como diz Platão, não era mais que um ajuntamento de homens, dos quais parte era senhora, parte escrava.
Dizia-se que o governo era aristocrático quando os ricos estavam no poder, democrático quando estavam os pobres.
Na realidade, a verdadeira democracia deixara de existir.
(...)
Fonte: FUSTEL DE COULANGES - A cidade antiga
Fonte: http://bibliotecadigital.puc-campinas.edu.br/services/e-books/Fustel%20de%20Coulanges-1.pdf
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