Como Geraldino Atto Azevedo (o poeta de Biguaçu) dizia, no poema Vagas:
Foi à borda do mar que me criei/Ouvindo dele a doce sinfonia/E aquela voz constante, dia a dia,/Por muitos longos anos escutei.
Mas, aprendi que a vida não é feita só de devaneios. Há muita dureza a ser enfrentada, principalmente por aqueles que não nascem em berço esplêndido. O colosso que é o mar cobra preço alto a quem dele busca viver, colhendo suas dádivas inesgotáveis. Impõe um tributo igualmente muito pesado a quem o enfrenta e o explora.
Os músicos do Grupo Engenho, mostrando percepção das implicações sociais da pesca artesanal, cantaram:
Hoje to triste pescador/Perdi o amigo Chicão/Morreu de cansaço dos barcos/Lá na barra da lagoa/Lagoa da Conceição (...)
A atividade do pescador artesanal implica numa canseira indescritível, suportada só pelos fortes. Não porque querem, mas porque necessitam (VICTOR HUGO - na obra Os trabalhadores do mar, proclamou ainda: os pescadores...precisam aprecatar-se quando andam no mar, por causa das artes do diabo, ... vagas que irrompem à pressão dos ventos, por exemplo), para manter-se e dar sustento às suas famílias.
Poucos defenderam e defendem ainda os pescadores artesanais, compreendem seus sacrifícios. Alguns até fingem-se solidários, por puro interesse eleitoreiro. Os espertos - atravessadores e religiosos, por exemplo -, sempre os exploram
Olha-se o lado poético da atividade, mas não o lado que revela os riscos do trabalho, o desgaste sob o sol inclemente, o esforço fatigante ("morreu de cansaço"), a pele que se cresta e os olhos que adoecem, sujeitos ao reflexo inclemente das águas prateadas.
Assim como os pescadores já não conseguem refletir sobre a agonia dos peixes, poucos conhecem a dor suportada por eles em decorrência de uma esporada de bagre ou de arraia, da pisada em um ouriço. Só conseguem os deslumbrados ver o lado bonito, como dizia Virgílio Várzea (A canção das gaivotas), o "fosforejar das ondas". Ocorre que as entidades de classe que fingem representá-los, de pouca valia se mostram.
Sem representação efetiva, ai dos que são mudos, refletiu o mesmo HUGO, na obra acima. E aqui cabe um paralelo: os pescadores, como os peixes, são levados a padecer e a sucumbir, sem muito conseguir dizer, eis que ninguém por eles esbraveja pra valer.
Fingem que não vêm a exploração do pescador pelas peixarias e pelas indústrias de enlatados, mantidas por atravessadores, os quais embolsam o lucro da arriscada atividade dos trabalhadores do mar.
A vida do pescador é como (...) uma cruel tormenta,/ de dores, de pesar, de desatino/que a musa descrever apenas tenta. (GERALDINO ATTO AZEVEDO - O peregrino). Sair de casa com um ralo "aparadinho", muitas vezes sem ter mastigado um duro biscoito, enfrentar um combate incessante com as ondas, o vento frio, a umidade, com as roupas ensopadas, não é para qualquer vivente. É desafio para os fortes.
Mas os fortes também possuem fraquezas e é por isso que se apegam a criações fantasiosas da inescrupulosa Igreja Católica, do tipo N. S. dos Navegantes, N. S. da Ajuda, N. S. do Perpétuo Socorro, N. S. dos Remédios e mais um rol infindável de ideias engenhosas dos que vestem batinas, as quais se firmam em decorrência da ingenuidade do povo simples.
Quanto aos moços do Grupo Engenho, pela sensibilidade social, aqui minha singela homenagem.
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