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sexta-feira, 19 de fevereiro de 2021

EMILE ZOLÁ - Germinal

Uma obra portentosa, que mostra com crueza, a realidade terrível das minas de carvão, as doenças pulmonares dos trabalhadores, o inferno da vida miserável que levam, em contraponto à abastança dos donos das minas. 

Estou lendo, pela terceira ou quarta vez. E não me canso de apreciar a magnífica sensibilidade do autor para os problemas sociais, as diferenças de classe, a exploração despudorada da vida dos obreiros.

Algumas frases: 

- Conheço bem esses marqueses e duques, esses generais e ministros! Salteadores é o que são! Capazes de roubar até a camisa da gente numa curva da estrada...

- O pároco de Montsou, Padre Joire, passou levantando a batina, com delicadezas de velho gato bem alimentado que tem medo de molhar o pêlo. Era um bom sujeito, só que fingia não se interessar por nada, para não ter problemas nem com operários, nem com patrões.

Os Grégoire encarregavam Cécile da distribuição de suas esmolas. Com isso pensavam estar inculcando na filha uma bela educação. Era preciso ser caridoso; diziam mesmo que sua casa era a casa de Nosso Senhor. Deleitavam-se em dizer que praticavam a caridade com inteligência; na verdade, viviam possuídos do pavor de serem enganados e de encorajarem os vícios. Por isso nunca davam dinheiro, nunca! nem dez soldos, nem mesmo dois; então não era sabido que assim que um pobre se via com dois soldos ia logo bebê-los? Suas esmolas, portanto, eram sempre em gêneros, principalmente em roupas quentes, distribuídas no inverno às crianças indigentes. 

— Ah, pobrezinhos! — exclamou Cécile. — Estão roxos de frio... Honorine, vai buscar o pacote no armário. 

As criadas também olhavam aqueles miseráveis com a piedade e a ponta de inquietação daqueles que não precisam preocupar-se com o que vão jantar. Enquanto a camareira subiu, a cozinheira permaneceu ali, voltou a colocar o que sobrara do bolo na mesa e ficou de braços cruzados. 

— Felizmente — continuou Cécile — ainda tenho dois vestidos de lã e uns lenços de pescoço. Vocês vão ver como os pobrezinhos vão ficar aquecidos! 

Só então a mulher de Maheu pôde soltar a língua; disse gaguejando: — Muito obrigada, senhorita... Os senhores todos são muito bons. Os olhos encheram-se de lágrimas, estava certa de que lhe dariam os cem soldos, só não sabia como pedi-los se não oferecessem. A camareira estava custando a voltar, houve um silêncio embaraçoso. Agarradas à saia da mãe, as crianças arregalavam os olhos na contemplação do bolo. 

— Você só tem esses dois? — perguntou a Sra. Grégoire para romper o silêncio. 

— Não, senhora. Tenho sete. O Sr. Grégoire, que voltara ao seu jornal, teve um sobressalto de indignação. — Sete filhos! Por que, Santo Deus? — Que imprudência! — murmurou a senhora. 

A mulher de Maheu esboçou um gesto vago de desculpa. Que havia de fazer? Não eram planejados, vinham naturalmente. Depois, quando cresciam, sempre produziam, ajudavam na manutenção da casa. Na família dela, por exemplo, todos poderiam viver muito bem se não fosse o avô que começava a ficar velho; dos filhos, apenas dois dos rapazes e a moça mais velha é que estavam em idade de trabalhar na mina. O problema era alimentar os menores, que não faziam nada... 

— Então — continuou a Sra. Grégoire —, há muito tempo que trabalham nas minas? 

Um sorriso mudo passou pelo rosto lívido da mulher. — Sim, sim, há muito tempo. Eu trabalhei até os vinte anos. Quando dei à luz pela segunda vez, o médico disse que eu morreria se continuasse na mina; parece que o trabalho estava atacando-me os ossos. Aliás, foi nessa ocasião que me casei, e tinha muito que fazer em casa. Mas, do lado do meu marido, eles trabalham nisso há séculos, desde o tetravô, que sei eu! Seja como for, a família sempre trabalhou na mina, a partir das primeiras escavações em Réquillart. 

Com um olhar sonhador, o Sr. Grégoire examinou aquela mulher e aquelas crianças esquálidas, suas carnações linfáticas, seus cabelos descoloridos, a degenerescência que até as fazia mirrar, roídas pela anemia, de uma fealdade triste de esfomeados. Fez-se novo silêncio; apenas a hulha ardia, lançando um jato de gás. Na sala ligeiramente úmida respirava-se esse ar pesado de bem-estar no qual medra, sonolenta, a felicidade burguesa.

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