O ministro Luiz Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, anulou nesta segunda-feira (8/3) as condenações de Lula, no caso do tríplex do Guarujá; do sítio de Atibaia; da sede do Instituto Lula; e das doações ao instituto. Fachin declarou incompetente a 13ª Vara Federal de Curitiba, que tinha como titular o ex-juiz Sergio Moro, para processar e julgar o ex-presidente. Com a decisão, o petista volta a ter direitos políticos e pode disputar uma eleição.
Fachin declarou "a nulidade apenas dos atos decisórios praticados nas respectivas ações penais, inclusive os recebimentos das denúncias". Ou seja: encontrou uma forma de manter válidas as quebras de sigilo, interceptações e material resultante de buscas e apreensões — o que a declaração de suspeição de Moro, uma decisão previsível, não possibilitaria.
De todo modo, o ministro Gilmar Mendes ainda pode pautar suspeição do ex-juiz e ministro imediatamente. Foi ele quem pediu vista nesse processo e já havia avisado que levaria a discussão à 2ª Turma ainda neste semestre.
O ministro diz em seu despacho que os autos devem ser enviados para a Justiça do Distrito Federal e que caberá "ao juízo competente decidir sobre a possibilidade de convalidação" de depoimentos e de coleta de provas. Ato contínuo, o ministro declarou a perda de objeto dos pedidos de suspeição de Moro — algo que os advogados e ministros da Segunda Turma dificilmente aceitarão.
Fachin justificou a decisão com o respeito ao princípio da colegialidade. Ele afirmou que, após o julgamento do Inquérito 4.130 pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, a jurisprudência restringiu o alcance da competência da 13ª Vara Federal.
O relator destaca que, mesmo ficando vencido em relação ao tema, levou em consideração a evolução do entendimento na 2ª Turma em casos semelhantes, entendendo que o mesmo deve ser aplicado ao ex-presidente da República — o que, aliás, já tinha sinalizado em decisão anterior, referente a supostos crimes envolvendo a Transpetro.
O ministro julgou um Habeas Corpus ajuizado pela defesa de Lula em 3 de novembro de 2020. Defendem o petista os advogados Cristiano Zanin, Valeska Martins, Eliakin Tatsuo e Maria de Lourdes Lopes.
"Embora a questão da competência já tenha sido suscitada indiretamente, é a primeira vez que o argumento reúne condições processuais de ser examinado, diante do aprofundamento e aperfeiçoamento da matéria pelo Supremo Tribunal Federal", afirmou a defesa em nota.
O novo núcleo da "lava jato", que agora integra o Gaeco do Paraná, informou que "não atua na instância junto ao Supremo Tribunal Federal, portanto segue trabalhando nos casos que competem ao grupo nos processos junto à Justiça Federal no Paraná".
Por sua vez, a 13ª Vara de Curitiba afirmou que "cumprirá a decisão do excelentíssimo ministro Edson Fachin do Supremo Tribunal Federal, remetendo os autos ao juízo indicado".
Segundo um precedente do Superior Tribunal de Justiça, no RHC 40.514, em caso de incompetência relativa, "o recebimento da denúncia por parte de juízo territorialmente incompetente tem o condão de interromper o prazo prescricional".
Assim, segundo esse precedente, se o juízo do Distrito Federal recomeçar o processo, a ação poderá ser tocada normalmente, pois os crimes atribuídos a Lula não estariam prescritos.
O ministro reconhece que a acusação "não cuida de atribuir ao paciente [Lula] uma relação de causa e efeito entre sua atuação como Presidente da República e determinada contratação realizada pelo Grupo OAS com a Petrobras S/A, em decorrência da qual se tenha acertado o pagamento da vantagem indevida".
As mensagens trocadas entre procuradores e obtidas por hackers, que integram o material de uma reclamação no Supremo, mostram que os próprios autores estavam cientes da fragilidade desse elo: o então chefe da força-tarefa Deltan Dallagnol classificou a teoria como "capenga".
As outras três ações a que a decisão se estende sofrem do mesmo vício, afirmou Fachin. Nos casos do Instituto Lula, não ficou comprovada a relação entre Odebrecht e Petrobras; no do sítio de Atibaia, também não houve fundamentação suficiente para ligar a OAS e a Odebrecht aos supostos crimes cometidos pela administração da Petrobras.
Esses mesmos argumentos de incompetência estão sendo apresentados ao Supremo desde 2016, quando a defesa de Lula argumentou que não havia relação justificada com a Petrobras e que, mesmo que o tríplex fosse de Lula, a incumbência para a investigação seria do MP de São Paulo.
A justificativa foi a de que "a causa de pedir subjacente à pretensão deduzida nesta impetração aborda questão cujos contornos já foram submetidos não só ao crivo do Plenário do Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do Inquérito 4.130 QO, em 23.9.2015, mas da própria 2ª Turma, em diversos procedimentos atinentes à denominada operação 'lava jato' nos quais se deliberou, a partir do aludido precedente, sobre a competência da 13ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Curitiba".
O ministro citou, para isso, outros precedentes: julgamento da Petição 6.863 pela 2ª Turma, relativos à refinaria Abreu e Lima (PE); a Pet 6.727, sobre o mesmo assunto; os inquéritos 4.327 e 4.483, julgados pelo Plenário, que envolviam deputados do PMDB; e, por fim, a Pet 8.090, julgado pela 2ª Turma, na qual Fachin também ficou vencido.
"Diante da pluralidade de fatos ilícitos revelados no decorrer das investigações levadas a efeito na operação 'lava jato', a competência da 13ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Curitiba foi sendo cunhada à medida em que novas circunstâncias fáticas foram trazidas ao conhecimento do Supremo Tribunal Federal que, em precedentes firmados pelo Tribunal Pleno ou pela 2ª Turma, sem embargo dos posicionamentos divergentes, culminou em afirmá-la apenas em relação aos crimes praticados direta e exclusivamente em detrimento da Petrobras", resumiu Fachin.
Leia a íntegra da manifestação da defesa de Lula:
Cristiano Zanin Martins/Valeska Teixeira Zanin Martins
Clique aqui para ler a decisão
HC 193.726
Ação Penal 5046512-94.2016.4.04.7000/PR (tríplex do Guarujá)
AP 5021365-32.2017.4.04.7000/PR (sítio de Atibaia)
APS 5063130-17.2018.4.04.7000/PR (sede do Instituto Lula)
AP 5044305-83.2020.4.04.7000/PR (doações ao Instituto Lula)
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