Manifesto à Nação
Plínio de Arruda Sampaio
De São Paulo
De São Paulo
Para os socialistas, a conquista de espaços na estrutura institucional do Estado não é a única nem a principal das suas ações revolucionárias. Em todas estas, os objetivos centrais e prioritários são sempre os mesmos: conscientizar e organizar os trabalhadores, a fim de prepará-los para o embate decisivo contra o poder burguês.
Fiel a esta linha, a campanha do PSOL concentrou-se no tema da igualdade
social, o que possibilitou demonstrar claramente que, embora existam
diferenças entre os candidatos da ordem, são diferenças meramente
adjetivas.
Isto ficou muito claro diante da recusa assustada e desmoralizante das
três candidaturas a firmar compromissos com propostas de entidades
populares - como a CPT, o MST, as centrais sindicais, o ANDES, o
movimento dos direitos humanos - nas questões chaves da reforma agrária,
redução da jornada de trabalho sem redução salarial, aplicação de 10%
do PIB na educação, combate à criminalização da pobreza.
Não há razão para admitir que se comprometam agora, nem para acreditar
que tais compromissos sejam sérios, como se vê pelo espetáculo
deprimente da manipulação do sentimento religioso nas questões do
aborto, do casamento homossexual, dos símbolos religiosos - temas que
foram tratados com espírito público e coragem pela candidatura do PSOL.
Nem se fale da corrupção, que campeia ao lado dos escritórios das duas
candidaturas ora no segundo turno.
Cerca de um milhão de pessoas captaram nossa mensagem. Constituem a base
de interlocutores a partir da qual o PSOL pretende prosseguir, junto
com os demais partidos da esquerda, a caminhada do movimento socialista
no Brasil.
O segundo turno oferece nova oportunidade para dar um passo adiante na
conscientização. Trata-se de esmiuçar as diferenças entre as duas
candidaturas que restam, a fim de colocar mais luz na tese de que ambas
são prejudiciais à causa dos trabalhadores.
O candidato José Serra representa a burguesia mais moderna, mais
organicamente ligada ao grande capital internacional, mais truculenta na
repressão aos movimentos sociais. No plano macroeconômico, não se
afastará do modelo neoliberal nem deterá o processo de reversão
neocolonial que corrói a identidade moral do povo brasileiro. A política
externa em relação aos governos progressistas de Chávez, Correa e
Morales será um desastre completo.
A candidata Dilma Rousseff é uma incógnita. Se prosseguir na mesma linha
do seu criador - o que não se tem condição de saber - o tratamento aos
movimentos populares será diferente: menos repressão e mais cooptação.
Do mesmo modo, Cuba, Venezuela, Equador e Bolívia continuarão a ter
apoio do Brasil.
Sob este aspecto, Dilma leva vantagem sobre a candidatura Serra. Mas não
se deve ocultar, porém, o lado negativo dessa política de cooptação dos
movimentos populares, pois isto enfraquece a pressão social sobre o
sistema capitalista e divide as organizações do povo, como, aliás, está
acontecendo com todas elas, sem exceção.
O que é melhor para a luta do povo? Enfrentar um governo claramente
hostil e truculento ou um governo igualmente hostil, porém mais
habilidoso e mais capaz de corromper politicamente as lideranças
populares?
Ao longo dos debates do primeiro turno, a candidatura do PSOL cumpriu o
papel de expor essa realidade e cobrar dos representantes do sistema
posicionamento claro contra a desigualdade social que marca a história
do Brasil e impõe à grande maioria da população um muro que a separa das
suas legítimas aspirações. Nenhum deles se dispôs a comprometer-se com a
derrubada desse muro. Essa é a razão que me tranqüiliza, no diálogo com
os movimentos sociais com os quais me relaciono há 60 anos e com os
brasileiros que confiaram a mim o seu voto, de que a única posição
correta neste momento é do voto nulo. Não como parte do "efeito manada"
decorrente das táticas de demonização que ambas candidaturas adotam a
fim de confundir o povo. Mas um claro posicionamento contra o atual
sistema e a manifestação de nenhum compromisso com as duas candidaturas.
Plínio Soares de Arruda Sampaio, 80 anos, é advogado e
promotor público aposentado. Foi deputado federal por três vezes, uma
delas na Constituinte de 1988, é diretor do "Correio da Cidadania" e
preside a Associação Brasileira de Reforma Agrária - ABRA
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