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quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Imagine as alianças secretas que estão sendo feitas em troca de apoio


.Reportagem da Folha Universal comenta sobre a campanha "Serra é do bem" associando o nome do candidato ao de Jesus Cristo





Na mão do clero



A Igreja Católica é acusada de tentar interferir nas eleições presidenciais brasileiras de maneira direta, tomando parte em uma campanha difamatória agressiva contra a candidata à presidência da República Dilma Rousseff (PT) e, ao mesmo tempo, declarando apoio ao candidato da oposição José Serra (PSDB).


Em pleitos anteriores, os representantes das organizações oficiais do Vaticano no País, como a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), chegaram a demonstrar simpatia por um ou outro candidato, mas, segundo especialistas, não há registro de um ataque tão intenso e de tentativas tão diretas de misturar religião e política nas eleições presidenciais.



“É um ativismo religioso extremamente conservador e moralista. O debate não está sendo feito com base em questões econômicas ou sociais como distribuição de renda, mas sim focado em questões moralistas. É um movimento que acontece há algumas eleições, mas agora se apresenta de forma clara em uma disputa presidencial. Isso é novo”, analisa a professora Maria das Dores Campos Machado, coordenadora do Núcleo de Pesquisa de Religião, Gênero, Ação Social e Política da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).



Ela ressalta que o Estado é laico e tal interferência é um atropelo no aparato institucional da República e um desrespeito com a ordem democrática. “A igreja católica pode achar ruim as pílulas anticoncepcionais, mas não pode querer transformar isso em lei. Não pode obrigar quem é evangélico a deixar de tomar pílula ou utilizar preservativos, isso não pode virar legislação. O Estado não pode atender um e sacrificar os outros, é preciso respeitar todos.



E a legislação tem que ser feita para todos, não para um grupo. É muito negativa a participação destes religiosos da maneira que estão atuando hoje”, completa.



No episódio mais recente, a Polícia Federal apreendeu no domingo (17) cerca de 2 milhões de panfletos com mensagem contrária ao PT e a Dilma Rousseff, e assinados por bispos católicos da Regional Sul 1 da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), que reúne as dioceses do Estado de São Paulo (leia mais na página 17). Os papéis foram encontrados por militantes do PT, que fizeram a denúncia. “Embora não possamos fazer acusações definitivas, há indícios veementes que esse panfleto pode ter sido produzido pelo nosso adversário. A gráfica tem como sócia Arlety Kobayashi, irmã de Sérgio Kobayashi, que é o coordenador de infraestrutura da campanha do candidato José Serra. É indiscutível a relação da proprietária da gráfica com o PSDB e com o candidato José Serra.



Sendo assim, é evidente que não poderíamos deixar de ter postura pública e pedir explicação sobre esses fatos”, declarou o coordenador jurídico da campanha de Dilma, deputado José Eduardo Cardozo.
Ele anunciou ainda que o partido tomará medidas judiciais contra a distribuição dos panfletos, os mesmos que já haviam sido distribuídos no dia 12 deste mês em missas de homenagem a Nossa Senhora Aparecida no santuário Nacional de Aparecida do Norte (SP) e em Contagem (MG) (leia mais no texto ao lado).
Nesse mesmo dia, os religiosos também aproveitaram a presença de Serra em missa em Aparecida do Norte para, por meio da “TV Aparecida” e demais retransmissoras católicas, exibir durante 10 minutos imagens do candidato e de sua mulher, Monica Serra.



No passado, argumentos semelhantes, de ameaça à democracia e à liberdade de expressão, serviram de base para o Golpe de 1964 e a ditadura que se seguiu. Um exemplo é o editorial do “Jornal do Brasil” de 1º de abril daquele ano, dia seguinte ao golpe, que afirmava: “Desde ontem se instalou no País a verdadeira legalidade”.



Os responsáveis pela campanha de Serra se aproveitam de tal radicalização para tentar angariar votos e reverter a vantagem de Dilma nas pesquisas. Não é à toa que, nas últimas semanas, o candidato tem tentado associar sua imagem à religião católica.



Mostra disso é que a campanha conta até com panfletos que, em um lado, dizem “Jesus é a verdade e a justiça” e, no outro, “Serra é do bem”. Para analistas políticos, os setores conservadores aproveitam a busca por votos para ganhar espaço na campanha tucana.



Em 6 de outubro, em uma reunião da cúpula do PSDB, foram distribuídos panfletos do Instituto Plinio Corrêa de Oliveira (IPCO), base da Sociedade Brasileira de Defesa de Tradição, Família e Propriedade (TFP), grupo católico conservador. No site do IPCO, há, por exemplo, a afirmação de que o PNDH-3 “é a mesma história do início da Revolução Bolchevique na Rússia!“, uma referência ao início do comunismo naquele país. A reportagem procurou a assessoria de José Serra (PSDB) para ouvi-lo, mas ele não se pronunciou até o fechamento desta edição.



A participação dela na campanha ficou marcada pela declaração, ainda no primeiro turno, de que Dilma era “a favor de matar as criancinhas”. Oficialmente, a CNBB Nacional nega que esteja fazendo campanha pela eleição do tucano.



Em nota, os dirigentes nacionais alegam que “a escolha é um ato livre e consciente de cada cidadão” e dizem lamentar “profundamente que o nome da CNBB – e da própria Igreja Católica – tenha sido usado indevidamente ao longo da campanha, sendo objeto de manipulação”. Porém, em seguida, ressaltam que “é direito – e, mesmo, dever – de cada bispo, em sua Diocese, orientar seus próprios diocesanos, sobretudo em assuntos que dizem respeito à fé e à moral cristã”.



Além disso, sobram na internet ataques pessoais feitos a partir de mensagens eletrônicas anônimas que reúnem acusações graves e sem fundamento contra a candidata petista, como as que a acusam de ser a favor do aborto. Fato que Dilma negou em diversas oportunidades.



De acordo com a filósofa e educadora da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, Marilena Chaui, uma das principais intelectuais do Brasil, a maneira como os ataques se dão são reflexo da ausência de um plano de governo do candidato tucano. “É evidente que José Serra não tem um projeto de Brasil. Não tem um projeto de nação. Isso ficou claro na sequência dos programas de televisão e rádio que ele fez, em que começou pela crítica dos programas sociais do governo Lula e terminou falando que iria dar continuidade a eles”, destacou em discurso a professora, em ato em que intelectuais declararam apoio à candidatura de Dilma. “A ausência desse programa faz com que se procure inventar um assunto que possa ocupar a opinião pública, sobretudo por intermédio de uma intervenção de tipo religioso. Várias igrejas da periferia receberam uma carta vinda do Vaticano a esse respeito. É preciso impedir que se queira fazer o objeto dessa eleição um plebiscito nacional sobre o aborto”, ressaltou.



Questionada em entrevista à rede britânica “BBC” sobre a entrada de temas religiosos na disputa eleitoral brasileira, a senadora Marina Silva (PV), que foi católica durante 37 anos e hoje é evangélica, criticou a radicalização do discurso. “Somos um país onde mais de 90% das pessoas creem em Deus, e esse é um dado de realidade que não se pode negar. No entanto, precisamos ter a sabedoria de não importar conflitos religiosos que existem em outros países para o Brasil, onde temos cultura de respeito pela diferença e pela diversidade. Mas o respeito pela diferença e pela diversidade pressupõe o direito daqueles que são evangélicos ou católicos de afirmarem os seus pontos de vista”, destacou a candidata, que ficou em terceiro lugar nas eleições.



Não faltam exemplos de religiosos católicos que, com o intuito de cumprir tal “dever”, estão atacando as instituições democráticas brasileiras. O arcebispo da Paraíba, Aldo Pagotto, por exemplo, gravou e publicou na internet um vídeo em que, ao atacar Dilma, começa tentando deslegitimar o processo eleitoral por si só e assustar os fiéis: “Engana-se quem pensa que esteja em jogo apenas o dilema da escolha dos candidatos e dos partidos mais capazes de promover o desenvolvimento do País em uma disputa democrática”, ressalta, no vídeo, Pagotto, para emendar em tom grave: “A experiência política e a história advertem amplamente que quando a democracia se converge neste tipo de demagogia para ganhar voto já é a ditadura no horizonte.”



CASO DE POLÍCIA




A Polícia Federal apreendeu, no último dia 17, a pedido do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), cerca de 2 milhões de panfletos que, de acordo com denúncia do Partido dos Trabalhadores (PT), configuram crime de difamação e propaganda eleitoral negativa contra a candidatura de Dilma Rousseff (PT). Intitulados “Apelo a Todos os Brasileiros e Brasileiras”, os folhetos foram encomendados por Luiz Gonzaga Bergonzini, bispo católico ligado à diocese de Guarulhos (SP), e continham o brasão da Confederação Nacional dos Bispos (CNBB) e a assinatura eletrônica de dirigentes da CNBB Regional Sul 1.



A responsável pela impressão é a gráfica Pana, que tem como sócia Arlety Kobayashi, filiada ao PSDB e irmã de Sérgio Kobayashi, coordenador de infraestrutura da campanha do partido. Ao longo de quatro páginas, o texto relaciona o PT e sua candidata à descriminalização do aborto. Ao final, recomenda que os eleitores “deem seu voto somente a candidatos ou candidatas e partidos contrários à descriminalização do aborto”.



Segundo Paulo Ogawa, marido de Arlety e pai de Alexandre Ogawa, o outro sócio da gráfica, os panfletos faziam parte do segundo pedido feito pela diocese de Guarulhos. Em setembro, foi rodado um lote de 100 mil, ao preço de R$ 3 mil.



Segundo especialistas, o panfleto não cumpre as exigências necessárias para a divulgação de propaganda eleitoral ao não apresentar o CNPJ da gráfica, o CPF ou CNPJ de quem encomendou a impressão e a quantidade de folhetos impressos. “A tiragem é fundamental para que depois ela possa ser conferida com a prestação de contas”, salienta o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional Tocantins, Ercílio Bezerra.



O ministro do TSE Henrique Neves da Silva apontou na liminar que decidiu pela apreensão do material e que, caso seja confirmado que o pedido partiu da diocese de Guarulhos, a entidade estará descumprindo o artigo da lei eleitoral que determina que “as igrejas não podem contribuir com publicidade em favor ou contra candidatos eleitorais”.



Apesar do conteúdo dos panfletos ser idêntico ao publicado no site da CNBB Regional Sul 1, os bispos católicos de São Paulo emitiram nota no domingo 17, após a ação da PF, negando a autoria do pedido. “O Regional Sul 1 da CNBB desaprova a instrumentalização de suas Declarações e Notas e enfatiza que não patrocina a impressão e a difusão de folhetos a favor ou contra candidatos”, diz o texto no site.



Dirigentes do PT acreditam que o material possa ter sido pago pela campanha de Serra. “Queremos saber quem pagou esse panfleto, como seria distribuído e de que forma. Temos convicção de que chegaremos aos autores”, disse José Eduardo Cardozo, coordenador jurídico da campanha de Dilma.Ogawa diz que sua mulher nunca militou pelo PSBD e nega que tenha trabalhado no Ministério da Fazenda, nomeado pelo então ministro José Serra. A suspeita surgiu porque, em 2000, Serra nomeou um “Paulo Ogawa” por meio do decreto nº 3.496. Mas Ogawa diz ser uma confusão. “Nunca trabalhei em ministério nenhum. Sou conhecido como Paulo, mas meu nome oficial é Tomomi”, explica.”


Fonte: Folha Universal/Gospeledeovelha

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