Martha Medeiros
Todo homem sofre da “síndrome Paulo Maluf” e pensa que tudo na vida dele deve ter cara de grande obra.
Comida, por exemplo.
Tem coisa mais irritante que homem na cozinha?
Pois os moços passaram séculos
longe do fogão e, como não poderia deixar de ser, no momento em que
colocaram os pés 44 naquele território, viraram todos, ‘chefs’.
Você dá o maior duro azarando o
cara, finalmente, descola um convite e sai de casa, crente que “quer
jantar na minha casa ?” significa “oba, vai rolar sexo”!
Toca a campainha vestida para matar
e sem calcinha sob o modelito vermelho, levando debaixo do braço
aquele tinto francês que comprou no supermercado, seguindo seu infalível
critério de “rótulo bacaninha que lembra gravura ‘art nouveau’ do
Alphonse Mucha”.
Aqui, primeira dica importante: não
ouse dizer que o vinho veio do Carrefour, senão você vai ouvir uma
longa preleção mais ou menos na linha “eles deixam as garrafas em pé…
blablabla… vinho europeu não viaja bem…blablabla… a rolha resseca…
blablabla…” (se rolar, não se esqueça de balançar a cabeça concordando
com ele, combinado?).
Também nem tente argumentar
qualquer coisa,confiando naquele curso de degustação de vinhos que você
fez há quatro anos, lembra?
Lembra nada! Você saía totalmente chumbada de lá todas às vezes…
Pois para sua decepção, quem estará
à porta, será uma criatura com ar grave de alquimista prestes a
descobrir o segredo de Midas, reclamando da dificuldade de se encontrar
uma boa pimenta jamaicana, segurando uma bugiganga Le Creuset de tirar a
pele de legumes, embrulhado em um avental imenso, engomado, com
monograma bordado, imaculadamente branco e, para o seu azar, sem
aquela abertura atrás.
E você, louca pra vê-lo cozinhando um miojo de bum-bum de fora, né?
Confessa…
É compreensível, meninas.
Os homens estão sofrendo de uma espécie de novo-riquismo culinário.
O gourmet requintado em que ele se
transformou ontem, jamais passaria pela humilhação de pilotar um fogão
como o seu, cujo máximo de avanço tecnológico é a lâmpada amarelada
do forno.
Não, ele torrou 22 mil dólares num
Ilve italiano de sete bocas, com grelha, chapa infravermelha para
aquecer comida e dois fornos programáveis.
Fazer as poções mágicas em panelinhas com teflon pra lavar mais facilmente?
Seria muita pobreza, para quem
comprou uma ‘poissonnière’ de cobre com interior revestido de estanho,
só para fazer peixes no vapor (“uma pechincha, 250 dólares”).
Conjuntinho de facas como aquelas que você ganhou de presente da tia-avó no primeiro casamento?
Jamais!
No entender dele, nenhuma
matéria-prima de manjar dos deuses, merece menos que facas artesanais
Zakharov com cabo de osso e madeira.
Duas horas e meia depois, o jantar está servido.
Sabe aquele frango refogado que você faz em vinte minutos, jogando um punhado de temperos a olho?
É mais ou menos isso, só que coberto por uma finíssima fatia de manga, arrematada com umas três ou quatro lascas de gengibre.
Isso se não vier acompanhado daquele molho de ervas que não combina com nada, e ele insiste em colocar em tudo.
E pensar que você estava rezando
pra que aquela manga fosse virar sobremesa, escoltada por uma bolota de
um reles sorvetinho da Kibon….
Conselho de quem não quer que você arruine definitivamente a noite: tem de dizer que ele tá “ali, ó” com Emmanuel Bassoleil.
Não, melhor ainda: foi um prato comparável ao poulet do Paul Bocuse.
Fim do banquete, vá arregaçando as mangas para ajudar a lavar louça.
Se deixar por conta dele, serão
mais duas horas esfregando as três panelas de cobre, duas de pedra
sabão e o processador de alimentos que sujou 7 peças pra picar
salsinha, equipamentos rigorosamente necessários para cozinhar uns 250g
de frango.
Hora do café, hora do relax, certo?
Pelo menos agora, você finalmente
vai experimentar a tal griffe ‘Illycaffè’, que custou a ele uma nota
preta, sem imaginar que o elogiadíssimo blend tem cerca de dois terços
de café brasileiro.
Quando a água ferve, ele grita e de um salto, chega ao coador.
Queimadura?
Não, puro horror, porque “água para café não pode ferver de jeito nenhum”.
Ah, que saudades daquele tempo em que cozinhávamos com um “ajudante” tarado, encoxando a gente na pia…
Fonte: Blog do CACAU MENEZES
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