9 de julho de 2020, 16h16
Não foi só o Ministério Público Federal de São Paulo (MPF-SP) que viciou a distribuição dos processos da "lava jato" internamente, como a ConJur revelou nesta quinta-feira (9/7). Em 2016, o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) teve que obrigar o MP estadual a distribuir os processos livremente.
Para CNMP, atuação de Cássio Conserino (MP-SP) em caso envolvendo Lula violou princípio do promotor natural
Reprodução
A decisão se deu em um pedido de providências formulado pelo deputado Paulo Teixeira (PT). Ele reclamava que o promotor Cássio Roberto Conserino tinha extrapolado suas prerrogativas funcionais ao assumir de ofício o comando de investigação sobre o tríplex no Guarujá, envolvendo o ex-presidente Lula. Para Teixeira, a investigação não deveria ter sido distribuída à 2ª Promotoria Criminal, da qual Conserino faz parte, mas à 1ª Promotoria Criminal.
Na decisão, o CNMP entendeu que houve, sim, irregularidade na distribuição, e determinou que, "em observância ao princípio do promotor natural, todo e qualquer procedimento de investigação criminal no âmbito do Ministério Público de São Paulo deverá ser distribuído livremente, respeitadas as regras de prevenção interna".
No entanto, seguindo o voto do relator do caso, Valter Shuenquener de Araújo, os conselheiros estabeleceram que obrigatoriedade de livre distribuição valeria apenas para os casos surgidos a partir da publicação do acórdão. Na prática, a decisão garantiu a permanência de Conserino nas investigações sobre a relação entre a família de Lula e o apartamento triplex em Guarujá.
Conflito de normas
Ao analisar o mérito, Shuenquener afirmou que o artigo 3º, parágrafo 4º, da Resolução 13/2006 do CNMP, contraria a Lei Orgânica do MP-SP (Lei Complementar de São Paulo 734/1993). Isso porque a norma do conselho, que faculta ao membro do MP, em hipótese de investigação instaurada de ofício, permanecer no comando dela até a distribuição da denúncia, viola a regra de que os casos devem ser distribuídos entre os promotores competentes.
De acordo com o relator, tal regra pode ser extraída da decisão do Supremo Tribunal Federal que reconheceu o poder do MP de promover apurações criminais por conta própria. "Não há duvida que o STF, ao lado de dar o poder de promover procedimento investigativo para o MP, decidiu que investigações devem ser livremente distribuídas. Não seria racional que todos promotores de um mesmo local pudessem simultaneamente, de oficio, instaurar Procedimentos Investigatórios Criminais (PICs) sobre o mesmo fato."
O objetivo da livre distribuição é preservar o princípio do promotor natural, disse Shuenquener. Ele lembrou que, sem essa garantia, seria possível estabelecer membros do MP ad hoc para atuar nos casos, acabando com a imparcialidade do órgão.
Com isso, Shuenquener votou para que as investigações criminais passassem a ser distribuídas livremente entre promotores, e não mais por prevenção. Contudo, ele opinou que tal determinação só deveria ser aplicada aos próximos casos, de forma a preservar a segurança jurídica. Os demais conselheiros seguiram o entendimento dele.
Caso do tríplex
O caso que gerou a controvérsia acabou arquivado em 2017 por "alegações vagas" e pela constatação de uma série de equívocos na denúncia. A acusação, de 102 páginas, contra representantes da empreiteira OAS e da Cooperativa Habitacional dos Bancários (Bancoop) foi rejeitada pela Justiça de São Paulo com a absolvição sumária de todos os réus. O trecho que envolvia o presidente Lula foi retirado do processo e encaminhado ao então juiz federal Sergio Fernando Moro, por conexão com a operação "lava jato".
Pedido de providências 1.00060/201-42
Revista Consultor Jurídico, 9 de julho de 2020, 16h16
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