20 de setembro de 2021, 10h35
É constitucional a norma que proíbe a participação de representantes de organizações sindicais, representativa de interesses patronais ou trabalhistas ligados às atividades reguladas, na direção de agências reguladoras. Por unanimidade, este foi o entendimento fixado pelo Supremo Tribunal Federal em julgamento no Plenário Virtual encerrado na última sexta-feira (17/9).
Fachin rejeitou ação da CNT. Rosinei Coutinho - SCO/STF
Prevaleceu a tese do relator, ministro Luiz Edson Fachin, na qual rejeitou Ação Direta de Inconstitucionalidade apresentada pela Confederação Nacional dos Transportes (CNT) contra dispositivo da Lei 13.848/2019, aprovada pelo Congresso, que introduziu estas modificações. Segundo ele, a lei tem o objetivo de "diminuir o risco de influências nos atos proferidos pelas agências com vistas a uma adequada regulação e prestação dos serviços públicos".
A CNT havia ajuizado no STF a ADI 6.276 contra as alterações introduzidas pela Lei 13.848/2019 na Lei 9.986/2000, que dispõe sobre a indicação de membros na estrutura diretiva das agências reguladoras.
Os incisos III e VII do artigo 8º-A da norma proíbem a indicação para o Conselho Diretor ou para a Diretoria Colegiada dessas entidades de pessoa que exerça cargo em organização sindical e de membro de conselho ou de diretoria de associação representativa de interesses patronais ou trabalhistas ligados às atividades reguladas pela respectiva agência.
Na avaliação da CNT, os dispositivos discriminam os sindicalistas e trazem a presunção de que pessoas que exercem atividades sindicais teriam interesses escusos e poderiam causar danos às agências reguladoras.
Para a confederação, as questões classistas (patronais e trabalhistas) não são cerne da atuação desses órgãos. Por isso, sustenta que não há incompatibilidade ou qualquer outro motivo que justifique a restrição.
Não foi esse, contudo, o entendimento do ministro Fachin. "No caso, diferente do que alega a requerente, não houve, pelo Parlamento, imposição de discriminação injustificada, estereótipos de pessoas que exercem atividades sindicais ou presunção de que estas teriam interesses escusos e poderiam causar danos às entidades tuteladas. Houve legítima cautela ao garantir o distanciamento de outros interesses e embates do escopo de atuação das agências reguladoras, considerada sua importância e seu papel desempenhado frente à sociedade", diz ele em seu voto.
Ao analisar o caso, o relator afirma que a criação das agências reguladoras no Brasil decorre da adoção de um novo modelo de serviço público em que as entidades privadas se encarregam de sua execução direta. À administração pública incube a gestão e a regulação da prestação de serviços, valendo-se dos princípios constitucionais que norteiam o direito administrativo brasileiro.
No Brasil, o modelo de agências adotado a partir da década de 1990 busca aprimorar a regulação econômica com uma atuação independente, tecnicamente justificada e levada a efeito por órgãos colegiados de atuação setorial. A independência das agências é justificada, assim, pela possibilidade de atribuir a um órgão técnico e dotado de notória especialização a realização de uma intervenção adequada e eficiente, de acordo com o ministro.
"A autonomia, no entanto, não é um conceito uniforme, sendo sua conformação balizada pela atuação legislativa. O regime jurídico do Conselho Diretor ou Diretoria colegiada das Agências guarda também essa orientação, pois não há livre exoneração e tampouco livre nomeação", pontua Fachin.
Na opinião do ministro, o Conselho Diretor ou a Diretoria Colegiada, considerando a necessidade de tomada de decisões imparciais, devem ser isentos de influências políticas, sociais e econômicas externas à própria finalidade dessas autarquias. "Evidencia-se, de pronto, a clara necessidade de se evitar a captura de suas gestões, compreendida como qualquer desvirtuação da finalidade conferida às agências, quando estas atuam em favor de interesses comerciais, especiais ou políticos, em detrimento do interesse da coletividade", salienta.
Fachin reconhece que há, no âmbito de atuação destes órgãos, inúmeros interesses contrapostos, tanto dos entes privados, quanto dos regulados, bem como interesses dos consumidores e até do próprio Estado. Para ele, “evitar a captura significa exercer a imparcialidade quando do processo decisório, a fim de assegurar a eficiência do Estado Regulador”.
"O Conselho Diretor ou a Diretoria Colegiada devem ser, portanto, estritamente técnicos e imparciais, a fim de evitar o desequilíbrio em favor de quaisquer partes e, sobretudo, a subversão da regulação, razão pela qual não se demonstra desarrazoada a vedação ora impugnada. Trata-se, assim, de opção legislativa legítima. Sabe-se que a exigência de preenchimento de certos requisitos para ocupação de cargos públicos, quando devidamente justificada e por meio legal, não implica discriminação ilegal", diz o relator, ao rejeitar as argumentações da CNT.
ADI 6.276
Severino Goes é correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília.
Revista Consultor Jurídico, 20 de setembro de 2021, 10h35
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