Fraude
PanAmericano maquiou vendas
Banco Central vê indícios de crime em operações do banco de Silvio Santos; instituição computava bens vendidos no seu patrimônio
Publicado em 11/11/2010 | Das agências
O
problema foi detectado há cerca de seis semanas por técnicos do BC
quando estavam sendo conferidos financiamentos vendidos pela
instituição. Na ocasião, foi constatado que grandes bancos haviam
adquirido operações do PanAmericano em número maior que o declarado. É
como se o comprador anunciasse a compra de 50 operações, mas o vendedor
registrava a venda de 10.
Bolsa
Com crise, ações caem 29,5 %
Em meio à repercussão do rombo de R$ 2,5 bilhões nas contas do
PanAmericano, as ações preferenciais da instituição amargaram ontem um
tombo de 29,5%. O volume de negócios com o papel somou R$ 163 milhões,
muito acima da média diária.
No pregão de terça-feira, antes do fato relevante do banco, as ações
já haviam registrado movimentação atípica, com variação e volume acima
do padrão. Naquele dia, segundo fontes, boatos de que havia problemas no
banco provocaram uma queda de 6,7% no fechamento, com um volume de R$
48,7 milhões. Em todo o ano de 2010, o volume de papéis do PanAmericano
negociado por dia não passou de R$ 20 milhões.
Tradicionalmente, uma movimentação atípica com ações pode ser alvo de
investigação por parte da Comissão de Valores Mobiliários (CVM). No
entanto, a autarquia não se pronuncia sobre o assunto. Em nota, lembrou
apenas que “não comenta situações específicas, embora acompanhe e
analise as (..) operações de companhias abertas.”
Caixa e BC apontam falha de auditorias
A Caixa Econômica Federal informou em nota que as contas do Banco
PanAmericano foram aprovadas após auditoria realizada por ela e por
outros consultores que participaram do processo de aquisição da
instituição. Em dezembro de 2009, a Caixa comprou 49% do controle e
36,56% do total das ações do PanAmericano, por R$ 739,2 milhões.
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Uma das hipóteses é que a diretoria fazia a operação irregular
para aumentar o lucro do banco, o que aumentava os bônus dos executivos.
O diretor de fiscalização do BC, Alvir Hoffmann, disse ainda não ter
precisão quanto às datas, mas admitiu que esse expediente pode estar
sendo usado há três ou quatro anos.
Ao se deparar com a diferença de números, técnicos do BC passaram a
avaliar carteira por carteira para encontrar a causa do problema. Foi um
trabalho de mais de um mês. “Chegamos à conclusão de que o PanAmericano
havia vendido operações e não havia ‘dado baixa’ no balanço. Por isso, o
volume declarado era muito maior que o efetivo”, diz fonte que
acompanhou o processo desde o início.
“A manutenção desses ativos na carteira gerava receitas extras, além
da própria receita obtida com a venda da carteira. Portanto, o balanço
trazia ativos e receitas a mais”, explicou Hoffmann em entrevista no fim
da tarde de ontem.
Consignados
Segundo o diretor de fiscalização, há sinais, inclusive, de que a
financeira de Silvio Santos teria vendido a mesma operação para mais de
um banco e que algumas carteiras de crédito foram negociadas com valor
diferente do real. Os problemas aconteceram principalmente nos
empréstimos consignados e financiamentos de veículos .
Diante do problema, administradores do PanAmericano foram convocados
para prestar esclarecimentos ao BC. De pronto, os gestores da financeira
admitiram o problema. “Eles reconheceram que mantinham no balanço um
ativo que já havia sido vendido”, cita a fonte. Ao reconhecer a falha,
Silvio Santos tomou a frente das negociações para recuperar a saúde
financeira da instituição.
Segundo Hoffmann, há sinais de que a intenção dos diretores afastados
era maquiar números para inflar o lucro e, assim, aumentar os bônus
pagos à diretoria. Mas outras hipóteses não são descartadas.
Funcionamento
A venda de carteiras é um negócio comum entre bancos de pequeno e
grande porte. No segmento de crédito, as instituições são separadas em
dois grandes grupos. No primeiro, chamado de “originador”, ficam as
casas de menor porte – como o PanAmericano – que têm pessoal de vendas
pulverizado e abrangência capaz de gerar grande volume de empréstimos e
financiamentos.
Uma vez realizada a operação, a instituição menor vende a operação
aos grandes bancos, que passam a administrar a carteira. Esse grupo é
chamado de “gestor” ou “administrador”. A operação é lucrativa porque o
banco pequeno que vende recebe parte do valor total antecipadamente e
pode reinvestir o dinheiro em novas operações de crédito. Para o grande,
a compra é vantajosa porque ele ganha a rentabilidade dos empréstimos e
tem custo administrativo muito menor que a despesa para se oferecer o
mesmo crédito em suas próprias agências.
O BC informou que “tudo indica que a investigação vai redundar em
algo para o Ministério Público”, em referência à Lei do Colarinho
Branco. Hoffman disse que não há evidência de problemas da mesma espécie
nos demais bancos, mas que o BC pode rever normas de fiscalização para
ajudar a prevenir novas fraudes desse tipo.
* * * * *
PERGUNTAS E RESPOSTAS
Confira de onde surgiu o rombo do PanAmericano e como o banco será socorrido:
Qual é o problema do banco?
Uma investigação iniciada há cinco semanas pelo Banco Central revelou
que o PanAmericano deixava de computar operações de venda de carteiras.
O banco atua, principalmente, em operações de crédito consignado e
veículos. Os recursos vêm da venda dessas carteiras para grandes bancos.
O levantamento do BC mostrou que o PanAmericano não contabilizava parte
dessas vendas no balanço. Ou seja, vendia um bem, usava o dinheiro, mas
continuava contabilizando esse bem em seu balanço. O rombo detectado
pelo BC chega a R$ 2,5 bilhões.
O que será feito agora?
Para cobrir o rombo, o PanAmericano precisou de um aporte de capital.
O dinheiro não foi levantado via mercado para não provocar suspeitas.
Em vez disso, o próprio Silvio Santos, dono do grupo que controla o
banco, negociou um plano com o Fundo Garantidor de Crédito para salvar a
instituição. O FGC fez um empréstimo ao grupo no mesmo valor do rombo.
Uma nova diretoria do banco também foi aprovada pelo Banco Central, uma
vez que as suspeitas de fraude recaem sobre os diretores
recém-afastados.
Como será feito o pagamento do empréstimo?
O grupo Silvio Santos terá dez anos para quitar os R$ 2,5 bilhões.
Serão três anos de carência até o início do primeiro pagamento, que será
semestral. O empréstimo não terá juros, apenas correção pelo Índice
Geral de Preços – Mercado, o IGP-M. Como garantia, Silvio Santos
ofereceu 44 empresas subordinadas à holding SS Participações, entre elas
o SBT, sua participação no banco PanAmericano, a Jequiti, a Liderança
Capitalização e o Baú da Felicidade. O valor contábil de todas as
empresas é de R$ 2,7 bilhões.
O que é o FGC e por que ele foi usado?
No Brasil, todas as instituições financeiras devem necessariamente
ser associadas ao FGC. É um fundo formado por dinheiro privado, com o
objetivo de proteger correntistas e investidores no caso de falência de
uma instituição financeira. Ainda que não tenha dinheiro público, as
medidas adotadas pelo Fundo precisam do aval do Banco Central. O FGC
possui hoje patrimônio líquido de R$ 28 bilhões, equivalente a cerca de
3% do passivo total do setor bancário.
Qual a importância do Banco PanAmericano?
O banco atua como uma financeira, especializada no fornecimento de
crédito para o consumo popular. Até junho, a instituição tinha uma
carteira de empréstimos de R$ 10,9 bilhões e uma base de 12,3 milhões de
cartões de crédito emitidos. Com ativos de pouco mais de R$ 10 bilhões,
está no rol dos 30 maiores bancos do país. No Paraná, tem 14 lojas.
Apesar de alguns fundos de ações terem papéis do PanAmericano, analistas
consideram que o problema é pontual, e uma eventual falência não
levaria a uma crise sistêmica.
Qual é o risco para as pessoas com conta no PanAmericano?
Como o banco atua principalmente com o fornecimento de crédito, o
risco para a pessoa física é baixo. Uma vez feito o empréstimo, a maior
parte consignado, o correntista fica com a obrigação apenas quitar sua
dívida, sem a possibilidade de perder dinheiro. Quem investiu nos papéis
do banco na bolsa perde naturalmente com a desvalorização das ações.
Ontem, elas caíram quase 30%.
Qual é o envolvimento da Caixa Econômica no banco?
Em julho passado, a Caixa Econômica comprou 49% do controle e 36,56%
do total das ações do PanAmericano, numa operação de R$ 739 milhões.
Por que as falhas no balanço não foram detectadas no momento da aquisição?
É a grande questão que a Caixa ainda não respondeu. O banco público
promete um coletiva para hoje, para responder às dúvidas em relação à
operação. Ontem, a Caixa informou em nota que as contas do PanAmericano
foram aprovadas após auditoria realizada por ela e por outros
consultores que participaram do processo de compra. A Comissão de
Constituição e Justiça do Senado (CCJ) convocou o presidente do Banco
Central, Henrique Meirelles, a presidente da Caixa, Maria Fernanda Ramos
Coelho, e os representantes de duas empresas de auditoria que não
identificaram o problema, a KPMG e a Deloitte, para explicar a operação
de aquisição do PanAmericano. A audiência está marcada para a próxima
quarta-feira.
Fonte: GAZETA DO POVO
Fonte: GAZETA DO POVO
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