País listado por organizações internacionais entre os menos corruptos do mundo, a Suécia tem passado por várias discussões internas para atestar se essa imagem de “limpeza” é verdadeira ou falsa.
Em uma viagem para a série Extremos,
analisando a extrema falta de corrupção na Suécia, a reportagem da BBC
perguntou a moradores da capital, Estocolmo, o que achavam sobre essa
fama.
"Sim", alguns disseram, "existe uma maneira sueca de fazer as coisas: discutir, concordar, fazer o bem".
"Nós vemos a nós mesmos como um modelo para outros países", disse uma mulher.
Na unidade anticorrupção do governo sueco,
localizada no centro de Estocolmo, o promotor-chefe, Gunnar Stetler,
disse que o telefone toca frequentemente.
Na maioria das vezes, ele disse, são pessoas
dizendo que os seus vizinhos erguerar um muro, ou pintaram a casa de
verde, e alegando que a permissão para a construção havia sido obtida
por meios escusos.
Dificilmente o motivo do crime é diferente disso.
"Não é que nós sejamos melhores que vocês",
disse Stetler, "mas somos mais transparentes, e isso torna a corrupção
mais difícil".
Ele se ofereceu para me mostrar seu relatório de
despesas, porque na Suécia qualquer pessoa tem o direito de checar os
gastos dos agentes públicos.
Suspeita em Gotemburgo
Durante a visita à Suécia, no entanto, as
manchetes eram dominadas por um escândalo em Gotemburgo, a segunda maior
cidade do país. A polícia estava investigando alegações de que
autoridades locais aceitaram propina de uma grande construtora.
Os suecos ficaram chocados com a suspeita, e os
editoriais nos jornais populares questionavam se a Suécia era tão
"limpa" quanto pensava.
O escritor Henning Mankell, autor da série de detetive Wallander, afirma que a Suécia é um "país muito decente", mas acredita que existe há muito tempo um mito de que é um país perfeito.
Ele diz que, em seus livros, que examinam os
aspectos incômodos da sociedade sueca, pretende ser parte da
"consciência da Suécia".
"O que eu tento fazer é talvez dar um ponto de
vista mais realista da Suécia. Às vezes é necessário pegar uma lanterna e
olhar nos cantos escuros."
Mankell diz que os suecos se sentem traídos pelo
escândalo em Gotemburgo, e estão questionando se sua transparência os
torna complacentes. Eles reconhecem a corrupção quando a veem?
Casamento real
Em um belo dia de verão, a princesa Victoria se
casou com o seu personal trainer em uma igreja no centro de Estocolmo.
Uma multidão compareceu para ovacionar o casal.
A lua-de-mel, no entanto, foi menos humilde. Um magnata sueco transportou o casal em um jato particular para um iate luxuoso.
Peter Wolodarski, editor de política do jornal Dagens Nyheter, afirma que figuras públicas não devem ficar em dívida com negócios privados.
Ele acredita que ter a família real abrindo
portas pode ser útil para o bilionário, proprietário da maior empresa de
ensino de línguas do mundo.
"Existe um risco potencial", diz Wolodarski, "em ter a família real retribuindo um favor a um homem como esse".
A coroa disse que a viagem foi privada, um presente dado por um amigo da família.
Stetler considerou abrir uma investigação sobre o
presente de lua-de-mel, mas decidiu que a Constituição sueca coloca a
família real à margem das leis anticorrupção.
Polêmica com caças
A unidade lançou uma investigação, no entanto, sobre outro ícone nacional - a companhia Saab.
Além de carros, a Saab fabrica os caças Gripen,
que são fonte de orgulho nacional. Um anúncio de televisão chama os
jatos de "asas de uma nação".
A unidade anticorrupção sueca investigou
suspeitas de que a Saab usou um intermediário para subornar o governo
sul-africano para garantir um acordo lucrativo.
A Saab se recusou a dar entrevista à BBC, mas disse por meio de um comunicado que não considera ter cometido atos ilegais.
"Para nós na Saab, é extremamente importante
conduzir nossos negócios com altos padrões éticos, e nós agimos com
tolerância zero em relação a propinas", disse.
"A investigação preliminar foi conduzida por
vários anos, e a Saab deu assistência todas as vezes, compartilhando as
informações requisitadas."
O caso foi abandonado por falta de provas.
"Na verdade, tanto faz se você pergunta à Saab
sobre isso. Você tem que ter um promotor independente para fazer uma
investigação séria. Depois disso, só então poderemos dizer se eles são
culpados ou não", diz Nils Resare, que escreveu um livro sobre o caso
dos Gripen.
Segundo o autor, o promotor deixou o caso porque
ele não conseguia montar uma equipe para encontrar provas. "E isso é
provavelmente o maior escândalo de corrupção na história da Suécia",
afirma Resare.
A Organização para a Cooperação e
Desenvolvimento Econômico (OCDE) também criticou a Suécia por não se
esforçar o suficiente nesse caso.
Poucos funcionários
Stetler assumiu seu cargo depois que o caso foi
abandonado. Ele diz, no entanto, que a sua unidade poderia ter mais
funcionários. Ele tem que contar com que outros departamentos de governo
lhe emprestem policiais, por exemplo.
Para ele, a falta de corrupção em geral fez os seus compatriotas ficarem "um pouco ingênuos".
"Se você não está a par, você não aloca recursos
suficientes e não entende a importância de combater a corrupção", diz
Stetler. "E se as pessoas acham que não estão sendo investigadas, elas
provavelmente terão a chance de se tornar um pouco corruptas."
Mankell não acredita que a Suécia esteja se
tornando mais corrupta, mas ele acha que os suecos despertaram para a
corrupção que existe no país. "Agora temos a oportunidade de conter
isso", ele afirma.
Embora a Suécia não seja tão perfeitamente limpa
quanto se acreditava, as pessoas no país parecem comprometidas em fazer
algo a respeito.
A reportagem da BBC foi convidada a ir ao
distrito financeiro de Estocolmo para assistir a um workshop corporativo
sobre como evitar propina.
No local, havia folhetos sobre o que poderia constituir um suborno, e empresários tomavam nota no auditório.
A principal oradora, Helen Waxberg, disse à BBC
que isso não era um grande problema na economia sueca. Então por que
fazer um workshop?
"Ele é sobre prevenção, e não cura", ela afirmou. "Nós queremos que as empresas suecas sejam as primeiras da classe."
Fonte: BBC BRASIL
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