Ana Cláudia Barros
O caso da menina Stephanie dos Santos Teixeira, de 12 anos, morta no
último sábado (4), após receber na veia vaselina líquida no lugar de
soro, no Hospital São Luiz Gonzaga, em Jaçanã, Zona Norte de São Paulo,
levanta a discussão sobre falhas praticadas por profissionais da área de
saúde. O procedimento teria sido realizado por uma auxiliar de
enfermagem, que deve prestar esclarecimentos à polícia nesta
quarta-feira (8).
Segundo a fundadora da Associação das Vítimas de Erros Médicos
(Avermes), a advogada Célia Destri, o problema é recorrente no País,
sobretudo em hospitais públicos. A entidade, em funcionamento desde
janeiro de 1991, move atualmente 1.200 processos na Justiça e atende a
uma média de 20 ocorrências por mês, mas recebe em torno de 50
denúncias.
- Nem todas as causas, pego. Muitas vezes, não são daqui, do Rio de
Janeiro. A associação encaminha os casos. Aqui, temos só seis advogados
trabalhando. Não há como atender a todos que nos procuram - conta Célia,
que perdeu um dos rins por negligência médica.
- Fui fazer uma cirurgia de cisto de ovário e a médica cortou meu
ureter. Ficou vazando urina na cavidade abdominal durante 14 dias. Eu
reclamava e ela dizia que minhas dores eram psicológicas. Não deu
atenção devida ao caso. Fui internada às pressas e quando os médicos
abriram minha barriga, eu estava com dois litros e meio de urina na
cavidade abdominal. Meus órgãos estavam boiando na urina. Se estou viva,
agradeço a Deus e ao médico que me salvou.
Decidida a converter revolta em ação, a advogada, assim que se
recuperou, passou a se dedicar à causa, "não podia ficar de braços
cruzados". Conforme Célia, que classificou de "crasso" o erro que
vitimou Stephanie, as denúncias mais frequentes que chegam à Avermes
envolvem partos.
- Desde que fundei a associação, os casos que mais encontramos aqui,
algo em torno de 40%, são os erros durante partos. Por incrível que
pareça, em pleno século XXI. Ou é a morte da criança ou da parturiente,
ou a criança sofre deslocamento de clavícula, ou passa da hora de nascer
e sofre lesão cerebral. Cerca de 60% dos paralisados cerebrais foram
devido ao parto. Tive essa informação com a Associação de Paralisados
Cerebrais.
Confira a entrevista.
Terra Magazine - Vocês, da associação, recebem muitas denúncias? A demanda é grande?
Célia Destri - O número é muito grande. Atualmente, eu estou
atendendo muito pouco, porque estou há 20 anos nisso. Tenho 64 anos e já
estou cansada. Muitas vezes, indico colegas advogados para trabalharem
na causa, devido ao grande número de processos que ainda tenho em mãos.
Então, os erros médicos são mais frequentes do que se imagina?
Com o Código de Defesa do Consumidor, não trabalhamos só em cima do erro
propriamente dito. A gente trabalha com a ideia de má prestação de
serviço, o que ocorre muito em hospitais públicos, onde há uma falta de
materiais basilar muito grande.
Com base nos casos que chegam à associação, pode-se dizer que equívocos são mais frequentes em hospitais públicos?
Sim. Pela má administração.
A falta de estrutura acaba favorecendo a incidência de erro médico?
Exatamente. Há má prestação de serviço, porque existe uma má
administração pública, o que acaba resultando num péssimo atendimento à
população. A Constituição diz que saúde é um direto de todos e dever do
Estado.
Quantos processos a associação move na Justiça?
Hoje em dia, eu tenho mais de mil processos correndo na Justiça. Atendo
uma média de 20 pessoas por mês, vítimas de erro médico. Nem todas as
causas, pego. Muitas vezes, não são daqui, do Rio de Janeiro. A
associação encaminha os casos. Aqui, temos só seis advogados
trabalhando. Não há como atender a todos que nos procuram.
E a procura pela associação? Quantos casos por mês vocês recebem?
A associação recebe em torno de 50 casos, mas não tem condições de pegar todos.
Aqui, atendo mais as pessoas carentes, que não podem pagar advogado.
Tanto é que erros em cirurgia plástica, parei de atender. Se a pessoa
tem condições de pagar cirurgia plástica, tem condições de pagar
advogado.
Como a senhora avalia esse caso de São Paulo, que resultou na morte
da menina Stephanie dos Santos Teixeira após injeção de vaselina?
Foi um erro crasso. Foi uma falta de atenção, um despreparo de quem quer
que seja, especificamente, do corpo de enfermagem. Ali, o médico
prescreveu e quem tinha que aplicar era a enfermeira. Se ela tinha que
aplicar o soro e colocou a criança na vaselina, a responsável é essa
criatura que não prestou a atenção. Provavelmente, pegou o frasco na
estante e nem leu. É uma falta de amor ao próximo, de atenção, de
preparo...
Esse tipo de equívoco é recorrente?
Não. É raro de acontecer.
Dos erros médicos, quais são os mais frequentes?
Desde que fundei a associação, os casos que mais encontramos aqui, algo
em torno de 40%, são os erros durante partos. Por incrível que pareça,
em pleno século XXI. Ou é a morte da criança ou da parturiente, ou a
criança sofre deslocamento de clavícula, ou passa da hora de nascer e
sofre lesão cerebral. Cerca de 60% dos paralisados cerebrais foram
devido ao parto. Tive essa informação com a Associação de Paralisados
Cerebrais.
Qual a recomendação que a senhora dá para a vítima de erro médico?
A pessoa que passou por essa situação tem que ir ao hospital e requerer a
cópia de seu prontuário, para que, comparado com todos os exames
realizados, possa se aferir se tem ou não a possibilidade de entrar na
Justiça para requerer indenização. Aqueles que ainda não sofreram esse
dano, que tenham cautela, que procurem saber quem é o médico, se ele já
tem algum processo. A pessoa pode verificar nos sites dos tribunais de
Justiça.
Todo cidadão que for vítima de qualquer dano, lesão, deve procurar a
Justiça. Mesmo que perca a ação. Mais vale ter tentado do que ficar de
braços cruzados. Só através de um movimento desse, de buscarmos a
Justiça, é que teremos condições de fazer com que isso tenha um basta.
Quando fundei a associação, as pessoas diziam que eu era maluca, que não
podia brigar com eles, porque não ia conseguir nenhuma vitória. Hoje
tenho orgulho de dizer que consegui 70% de vitórias contra 30% de
derrotas. E as derrotas foram por perícias mal elaboradas, por peritos
corporativistas. Só entro com processo quando tenho convicção de que
houve um erro.
Fonte: TERRA
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Advogado que sou e após haver atuado na Assessoria Jurídica do Hospital Regional de São José/SC, não consigo evitar as seguintes indagações:
E os erros dos atores do Judiciário: advogados, membros do Ministério Público e Magistrados?
Que tal se fizéssemos estatísticas sobre decisões judiciais reformadas, que fazem pressupor a existência de erros judiciais nas instâncias de baixo?
E que tal, ainda, considerarmos que, mesmo nas instâncias superiores, não raro uma corrente jurisprudencial dominante é derrubada e passa a vigorar entendimento contrário?
Não podemos nos furtar à autocrítica. Não só o pessoal da área médica comete suas negligências, imprudências e imperícias.
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