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Advogado - Nascido em 1949, na Ilha de SC/BR - Ateu - Adepto do Humanismo e da Ecologia - Residente em Ratones - Florianópolis/SC/BR

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domingo, 29 de setembro de 2019

ANACRONISMOS DE SALVINI, BOLSONARO, TRUMP, BORIS JOHNSON


Grande entrevista a António Mega Ferreira. "Portugal não pode diabolizar a única indústria que tem: o turismo"



Luís Barra

Foi jornalista e gestor, mas é como escritor que gostaria de ser recordado. Recusou cargos políticos alegando falta de vocação e ainda hoje se exaspera com as obras de Santa Engrácia e com os projetos por concluir. Tem uma ideia de futuro para o País

Usando uma expressão de génio de Alexandre O’Neill, diga-se que se tratou de uma conversa “em forma de assim”, na qual se falou do ressurgimento dos populismos e das próximas legislativas, de viagens de sonho e das voltas que o turismo deu a Lisboa. No final, fomos parar ao sítio por onde começámos: o Benfica, ou não estivéssemos nós a falar com um fervoroso adepto do clube das águias. Aos 70 anos, António Mega Ferreira – antigo presidente da Parque Expo e do Centro Cultural de Belém (CCB), atual diretor-executivo da Orquestra Metropolitana de Lisboa – lançou, recentemente, Santo António, de Lisboa e Pádua (Clube do Autor), um livro que é também um exemplo da sua devoção à escrita e à cultura.
(...)

E a Itália de Matteo Salvini, incomoda-o?
 
A Itália de Salvini incomoda-me brutalmente, é um vómito. Incomoda-me como me incomoda o Brasil de Bolsonaro, os Estados Unidos da América de Trump e a Grã-Bretanha de Boris Johnson. Tudo isto me incomoda porque é quase antinatural, anti-histórico; são coisas que já não estão na História, são anacronismos que seriam admissíveis nos anos 30 ou 40 do século passado. E, no entanto, chegamos ao fim da segunda década do século XXI e assistimos ao reaparecimento destes fenómenos.

Fonte: http://visao.sapo.pt/actualidade/sociedade/2019-09-29-Grande-entrevista-a-Antonio-Mega-Ferreira.-Portugal-nao-pode-diabolizar-a-unica-industria-que-tem-o-turismo

quinta-feira, 26 de setembro de 2019

DIZ AÍ: DÁ PENA DELE, OU NÃO?


CATÁSTROFES À VISTA

Relatório diz que catástrofes no litoral irão ocorrer uma vez por ano em 2050

Jeff J Mitchell/Getty Images

O Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas diz que tempestades intensas vão devastar a costa - e admite um aumento do nível médio das águas do mar de 4 metros

Em 2050, eventos extremos relacionados com o nível do mar que costumavam acontecer uma vez por século irão passar a ocorrer uma vez por ano. A avaliação da crise climática nos oceanos e calotes polares conclui que irão decorrer eventos desastrosos com um forte impacto nas vidas das pessoas e prevê-se que, sem ação urgente, situações muito piores irão atingir o planeta, incluindo um eventual aumento do nível do mar que poderá ultrapassar os 4 metros no pior dos casos.
O alerta encontra-se no relatório do Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas (IPCC, o maior organismo dedicado ao estudo das mudanças no clima) tornado público hoje, quarta-feira.
O estudo sublinha ainda que o aumento do nível do mar está a acontecer a um ritmo acelerado, devido às perdas de gelo na Gronelândia e na Antártida. Além disso, o o oceano está cada vez mais quente, ácido e com menos oxigénio.
Metade das megacidades do mundo e um total de quase dois mil milhões de pessoas vivem no litoral. Mesmo que o aquecimento seja restrito, os cientistas esperam que o impacto do aumento do nível do mar cause danos de custos extremos.
Os glaciares das montanhas mais altas do mundo, dos quais cerca de outros dois mill milhões de pessoas dependem para obter água, estão também a derreter rapidamente segundo o IPCC.
Uma das maiores preocupaçõs que o estudo revelou foi sobre o derretimento do permafrost (solos permanentemente congelados, com grandes quantidades de CO2 e metano acumulados) e o aumento de incêndios nas latitudes do norte.
De acordo com o estudo, pelo menos 70% do gelo desaparecerá se as emissões de gases com efeito de estufa não forem reduzidas.

Fonte: http://visao.sapo.pt/actualidade/sociedade/2019-09-25-Relatorio-diz-que-catastrofes-no-litoral-irao-ocorrer-uma-vez-por-ano-em-2050

ALUCINADOS

Maioria dos consumidores portugueses de “novas drogas” pertence às classes altas 

Alexandr Gnezdilov Light Paintin

Possuem um título académico e estão empregados, na maior parte dos casos. Mas poucos sabem identificar todas as substâncias psicoativas que já consumiram

O estudo não deixa margem para dúvidas: metade dos inquiridos tem um bacharelato, mestrado ou outro diploma do ensino superior – em 17% dos casos falamos mesmo de doutoramento. Além disso, apenas 9% estava desempregado na altura das entrevistas e todos possuíam casa própria, apartamento alugado ou habitavam numa unidade residencial. Estas as razões para concluir que o perfil dos portugueses consumidores destas “novas drogas” se encaixa no segmento das classes mais altas. “São pessoas escolarizadas e profissionalmente ativas”, sublinha ainda Susana Henriques, a responsável pela investigação feita em Portugal, e orientadora da tese de doutoramento que apurou os dados. “O consumidor de drogas estava associado a alguém com um aspeto degradante e que vivia na rua. Já não é assim, na maioria dos casos”, acrescenta Joana Paula Silva, a autora da tese.
Os inquéritos realizados detetaram ainda uma predominância do sexo masculino, uma média de idade a rondar os 21 anos e um consumo feito sobretudo em ambientes festivos e entre amigos – além da compra ser feita na rua, o que é, salienta Susana Henriques, um dos pontos em que se nota uma diferença entre os consumidores portugueses e os dos restantes países participantes da investigação: Alemanha, Holanda, Hungria, Irlanda e Polónia. “Por cá, a internet é a principal fonte de informação, mas não é o espaço mais comum para comprar.”
Já a grande dificuldade dos portugueses é identificar quais foram as “novas substâncias psicoativas” que já consumiram – sendo que o conceito equivale a um novo estupefaciente ou um novo psicotrópico, puro ou numa preparação, que não seja controlado pela Convenção Única das Nações Unidas sobre os estupefacientes, de 1961, nem pela Convenção das Nações Unidas sobre substâncias psicotrópicas, de 1971, e que possa constituir ameaça para a saúde pública de uma forma comparável à das substâncias aí elencadas.
“O conceito de novas substâncias psicoativas continua a ser muito pouco claro entre a população portuguesa, inclusive entre os seus próprios consumidores”, precisa a autora da tese, Joana Paula Silva. “Muitas das pessoas que entrevistei achavam no início da conversa que nunca tinham consumido NSP. Porém, ao longo do diálogo, perceberam que afinal já o tinham feito sem saberem”. Esse desconhecimento tem, antes de mais, um primeiro efeito inesperado que é a facilitação das vendas fraudulentas. “Como não as sabem distinguir, as pessoas são facilmente enganadas.”
O diagnóstico integra o projeto internacional “New Psychoative Substances: transnational project on diferent user groups, user characteristics, extent and patterns of use, market dynamics and best practices in prevention”, financiado pela Comissão Europeia – e que teve a participação de instituições e investigadores de seis países europeus, tendo Portugal sido representado pelo Centro de Investigação e Estudos em Sociologia (CIES-IUL) do ISCTE – Instituto Universitário de Lisboa.

POR QUE Estrangeiros compram 54 casas por dia em Portugal?


Popularidade do país junto da comunidade estrangeira continua em alta e as vendas de imóveis registaram um crescimento "expressivo" em 2018, aponta o INE. Franceses, ingleses, brasileiros, chineses e alemães são os maiores compradores

Marisa Antunes 

Os estrangeiros estão a comprar 54 casas por dia em Portugal, valor que representa 8,2% de todos os imóveis transacionados durante o ano passado. São 19.912 casas vendidas um pouco por todo o país mas com maior incidência geográfica na Área Metropolitana de Lisboa, que concentrou 21% do número total de imóveis transacionados e o Algarve com cerca de 29%. Só estas duas regiões concentraram praticamente metade dos imóveis adquiridos por não residentes em 2018 (49,6%).
Os números foram divulgados pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) que traça o perfil, por nacionalidades, por valor de investimento e por apetência geográfica dos estrangeiros que descobriram Portugal, a esmagadora maioria atraídos por programas como os vistos gold (que obriga a investir mais de meio milhão de euros) ou os Residentes Não Habituais (que obriga a uma permanência de 183 dias).
Contas feitas, do bolo total de mais de 26 mil milhões transacionados em imóveis no mercado nacional durante o ano passado, cerca de 13% (cerca de 3,4 mil milhões) é imputado a aquisições feitas por estrangeiros.

Do Minho à Madeira

Pelo terceiro ano consecutivo, os franceses continuam a liderar a tabela entre os estrangeiros que mais compram (19,7% em termos do valor transacionado), situação que se vem verificando desde 2016. Seguiram-se o Reino Unido (16,9%), o Brasil (8,3%), a China (5,1%) e a Alemanha (4,9%). "No seu conjunto, os 5 principais países de residência dos compradores que adquiriram imóveis em Portugal em 2018, representavam 54,8% do valor global de vendas a não residentes nesse ano", refere a análise do INE.
Contudo, em termos do número de imóveis transacionados, a ordenação é ligeiramente diferente, mantendo-se a França destacadamente na liderança (com cerca de 5 600 imóveis, 28,2% do total), seguida do Reino Unido (cerca de 3 000 imóveis, peso de 14,9%), da Suíça (7,7%), da Alemanha (6,0%) e do Brasil (4,9%).
A retirada da China deste segundo ranking explica-se pelo valor dos imóveis que adquirem - em menor número mas muito mais caros. O valor mediano das transações de residentes chineses é de 297,2 mil euros (sendo que 25% das aquisições efetuadas superaram o valor unitário de 515 mil euros), bem acima do valor médio dos prédios adquiridos pelos estrangeiros em 2018 situado em 171 178€.
De destacar também que se mantém a tendência de crescimento "expressivo" das vendas de imóveis a não residentes - 14,5% em número e 22,2% em valor, diz o INE, . E não só estão a comprar mais, mas também mais caro: "em 2018, aumentou a proporção de imóveis vendidos a não residentes com um valor unitário igual ou superior a 500 mil euros, representando 7,2% do número de imóveis adquiridos por não residentes (6,8% em 2017) e 37,6% do valor total (36,3% em 2017)".
Apesar das Áreas Metropolitanas de Lisboa e Porto e a região do Algarve se destacaram na capacidade de atracção com 4178, 1702 e 5700 casas vendidas respetivamente, a verdade é que os estrangeiros estão a descobrir todo o país. Na região Oeste foram vendidas 1075 imóveis, em Coimbra 890, no Minho 581 e na Madeira 483, só para citar alguns exemplos.
A Área Metropolitana de Lisboa destacou-se com o valor médio mais elevado dos imóveis vendidos a não residentes (322 514€), seguindo-se o Algarve (214 819€). Em ambos os casos, os valores médios dos imóveis vendidos a não residentes em 2018 aumentaram face ao ano anterior (+16,5% e +6,4%, pela mesma ordem).

Fonte: http://visao.sapo.pt/imobiliario/2019-09-26-Estrangeiros-compram-54-casas-por-dia-em-Portugal

Alguns magistrados, "estão se achando" acima da lei

Contra claro texto do CPC, STJ reafirma o livre convencimento


Quase diariamente recebo sugestões de pautas de leitores inconformados com decisões judiciais, questões de concursos, falas de autoridades públicas do direito, absurdos dogmáticos, etc. Nesta semana, recebi muitas denúncias epistêmicas sobre, de novo, ainda, sempre, decisões (novíssimas, dois mil e dezenove) fundamentadas no velho (mas não bom, só velho) "livre convencimento".
Sim, o "livre convencimento" ("motivado") como razão, como fundamento para decisão judicial. De novo, ainda, sempre.
As decisões são, quase todas, semelhantes. Por todas, tem uma novissima, de duas semanas atrás, do STJ. Vejam:
(...) O CPC/2015 manteve em sua sistemática o princípio da persuasão racional ou do livre convencimento motivado (...) conforme o disposto nos artigos 370 e 371 (...)”.
Procurei e não encontrei nada disso no CPC. Só se sabe que alguém perdeu um direito com base no livre convencimento que, “taxativamente”, não está previsto em lei. Isso acontece com milhares de pessoas. Brasil a fora. Decisão contra legem. Minha crítica nem é ao juiz específico, ao tribunal específico. É aquela coisa: o problema não é o mensageiro. Não é o jogador. O problema é a mensagem, o problema é o jogo, cujas regras não são cumpridas.
Já escrevi uma meia centena (acho que não é hipérbole) de colunas sobre esse equívoco epistêmico-filosófico que é o livre convencimento. Fiz lobby epistêmico para arrancá-lo do CPC de 2015. E consegui êxito junto ao Deputado Paulo Teixeira, para retirar o foco da inflamação epistêmica do CPC-2015. Só que a doença volta. O tal livre convencimento volta.
É a banalidade do livre convencimento. Princípio da persuasão racional? Mais um “princípio” para a coleção pamprincipiologista. Por que isso seria um princípio? E o que tem ou teria a ver com o livre convencimento?
Como justificar, na democracia, o livre convencimento ou a livre apreciação da prova? Se democracia, lembro Bobbio, é exatamente o sistema das regras do jogo, como pode uma autoridade pública, falando pelo Estado, ser "livre" em seu convencimento? Pergunto: A sentença (ou acordão), afinal, é produto de um sentimento pessoal, de um subjetivismo ou deve ser o resultado de uma análise do direito e do fato (sem que se cinda esses dois fenômenos) de uma linguagem pública e com rigorosos critérios republicanos? Porque a democracia é o respeito às regras do jogo.
Porque a intersubjetividade impõe constrangimentos. E o Direito é a intersubjetividade institucional por excelência: uma prática interpretativa, intermediada pela linguagem pública. Nada é mais antitético ao Direito que o livre convencimento.
Mas ele volta. De novo, ainda, sempre. E eu sou obrigado a voltar também. Porque são esses meus trópicos utópicos (para usar a expressão de Eduardo Giannetti): o dia em que a comunidade jurídica vai olhar para trás e dizer - "Meu Deus... em 2019, juízes escolhiam antes e fundamentavam depois, com base num negócio a que chamavam de 'livre convencimento'... como é que pode?"
O "livre convencimento" de Otelo, que buscava a "verdade real", matou a coitada da Desdêmona. Ele estava livremente convencido de que fora traído. Por aqui, não deixemos que ele mate o Direito. Morto o Direito, morre a democracia.
Por fim, para arrematar, já que a decisão (que se repete em dezenas ou centenas ou milhares de decisões) estabeleceu que o CPC 2015 “manteve” (sic) o livre convencimento, permito-me trazer, de novo, a justificativa da emenda do deputado Paulo Teixeira (ver texto sobre isso aqui) que, vencedora, suprimiu o livre convencimento.
Ajudei a redigir a justificativa (no caminho para o parlamento, conversei, por telefone, com Marcelo Cattoni e Dierle Nunes, que me assessoram para a conversa com Paulo Teixeira, Fredie Didier e Luiz Henrique Volpe). Fui testemunha ocular da história (invoco o testemunho de Fredie e Luiz Henrique). A mesma emenda foi feita — ainda não votada — no projeto do CPP e que faz menção à emenda feita no CPC (ver aqui). Um importante histórico do CPC pode ser visto neste texto de Rafael Niebuhr Maia de Oliveira e Welligton Jacó Messias e publicado por Renan Kfuri Lopes. De todo modo, eis:
“embora historicamente os Códigos Processuais estejam baseados no livre convencimento e na livre apreciação judicial, não é mais possível, em plena democracia, continuar transferindo a resolução dos casos complexos em favor da apreciação subjetiva dos juízes e tribunais. Na medida em que o Projeto passou a adotar o policentrismo e coparticipação no processo, fica evidente que a abordagem da estrutura do Projeto passou a poder ser lida como um sistema não mais centrado na figura do juiz. As partes assumem especial relevância. Eis o casamento perfeito chamado ‘coparticipação’, com pitadas fortes do policentrismo. E o corolário disso é a retirada do ‘livre convencimento’. O livre convencimento se justificava em face da necessidade de superação da prova tarifada. Filosoficamente, o abandono da fórmula do livre convencimento ou da livre apreciação da prova é corolário do paradigma da intersubjetividade, cuja compreensão é indispensável em tempos de democracia e de autonomia do direito. Dessa forma, a invocação do livre convencimento por parte de juízes e tribunais acarretará, a toda evidência, a nulidade da decisão.
Pergunto, então: como sustentar decisões como a aqui comentada? Como sustentar decisões como as que dizem que “o CPC 2015 em nada alterou o entendimento prevalente de que o juiz pode a analisar as provas livremente”?
Insisto nisso porque não é possível que se afronte a lei desse modo. Não é admissível que agravos e embargos sejam derrubados com base em um argumento que não foi albergado pelo legislador. Ou decisões sejam sustentadas no livre convencimento. Não é porque eu quero que seja assim. É o texto legal e a clara intenção do legislador. E mesmo que não houvesse a “intenção” do legislador, já bastaria a supressão da palavra “livre” (em vários dispositivos). Uma palavra na lei faz ou não faz diferença?
De qualquer maneira, com meu otimismo metodológico e com minha epistemologia do zelo, sugiro que escutemos e adotemos uma tese de Christian Baldus (introduzido e estudado no Brasil por Otavio Luiz Rodrigues Jr) sobre interpretação histórica negativa:
determinado comando ou certa hipótese de incidência não são aceitáveis ou compreensíveis porque o legislador, se os desejasse, tê-los-ia incluído no texto de lei.
No caso, ocorreu mais do que isso. Ocorreu a explicitação do objetivo da alteração legislativa, com o que está vedada interpretação que transforme o texto em seu contrário.
Mais ainda do que isso, toda a incidência da palavra livre foi suprimida também em outros artigos do CPC-2015, conforme explicito em meu comentário ao artigo 371 do CPC, no livro Comentários ao CPC, editora Saraiva, junto com Dierle Nunes, Leonardo Cunha e Alexandre Freire).
Falta-nos, ainda, o constrangimento intersubjetivo para que as subjetividades dos ditos intérpretes, maquiadas pelo livre convencimento motivado, salte aos olhos como singularmente aberrante em nossas práticas e costumes.
Numa palavra: essa questão do “livre convencimento” é algo que simboliza a resistência de setores do direito brasileiro (inclui-se parte expressiva da doutrina processual) em abandonar as velhas teses protagonistas e instrumentalistas que atravessaram o século XX. O juiz Antônio Carvalho, em brilhante conferência de abertura do Congresso da ABDPRO em Curitiba, dia 19 último, deixou a todos os presentes impressionados pelo modo lúcido com que tratou dessa temática — os malefícios do instrumentalismo e do protagonismo. A propósito: parabéns a toda a ABDPRO — resistência contra o arbítrio processual.
Vejam, finalmente, que nem entrei na seara filosófica para analisar o livre convencimento. Se em termos de teoria da democracia e teoria processual ele não se sustenta, o que dirá se analisarmos o conceito à luz dos paradigmas filosóficos? Mas isso já fiz em dezenas de outros textos, como em O Que é isto Decido conforme a Consciência, agora traduzido e adaptado para a língua espanhola sob o título La Llamada Conciencia de Los Jueces, da Editora Tirant Lebranch, de Madrid.

 é jurista, professor de Direito Constitucional e pós-doutor em Direito. Sócio do escritório Streck e Trindade Advogados Associados: www.streckadvogados.com.br.
Revista Consultor Jurídico, 26 de setembro de 2019, 8h00

GRAXAIM - Por que a maioria das pessoas não conhece um, embora tenha sido abundante na Ilha?




O texto abaixo explica a saga da espécie e as razões do seu desaparecimento:


- ENEDINO BATISTA RIBEIRO – Gavião-de-penacho – IHGSC + ALESC/Fpolis-SC/1990, vol. 1, p. 195: 
Era pau-para-toda-obra: recolhia as vacas leiteiras, tratava dos animais de estrebaria, dos porcos no chiqueiro; pastoreava o rebanho de ovelhas, para impedir que os graxains e os caranchos (*) comessem as crias recém-nascidas.

No combate à primeira dessas pragas, pedi a meu pai que mandasse construir uma arataca de caixão, que eu armava todos os dias, sobre a noite, três ou quatro quilômetros distante da casa. a isca por mim empregada era pele de porco sapecada na labareda do fogo.

No dia seguinte, quase sempre, lá estava preso um graxaim, que eu retirava da arataca, virando a boca do mundéu para cima e laçando-o pelo pescoço com uma corda de barbante grosso. Era um divertimento gostoso que fazíamos com as manas mais moças do que eu e moleques da fazenda. Só nos invernos de 1911 e 1912, matei mais de oitenta graxains e uma meia dúzia de gambás.

O graxaim (variação de guaraxaim) é um animal inteligente e muito esperto: uma vez laçado, bates-e e pula muito; depois de um certo cansaço, deita-se de todo o comprimento e fica ali quieto, mal respira, “faz-se de morto”, como se diz no linguajar das fazendas. Se a gente “vai na conversa”, tirando-lhe a corda do pescoço, o malandro levanta-se de pronto e sai como um raio, correndo o que dão as pernas, e o caçador fica “cheirando na tampa”, como se costuma dizer.

O graxaim é um mamífero da família dos canídeos, que passa o dia pelas tocas, fojos e solapas. Sai à noite e às vezes de dia, se tem muita fome, à procura de alimento.

Nos dias chuvosos, de luminosidade escassa, à boquinha da noite, a gente ouve seus gritos: guô-a guô-a. Não sei porque o grito desse animal causa, a quem o escuta, um certo mal estar. Há gente que até se recolhe para dentro de casa, persignando-se. Deve ser o forte sentimento de superstição que impera entre os sitiantes do Brasil.

É guloso perseguidor de cordeirinhos e até mesmo de bezerros recém-nascidos. Sem-vergonha como só ele, visita a casa do homem e vai aos galinheiros, onde, se não houve segurança, penetra, mata e carrega para o mato as “penosas”.

Como resultado dessas “virtudes”, o graxaim é muito caçado, daí a razão por que está desaparecendo do nosso interior. 
-=-==-
(*) os caranchos, são uma espécie de falconídeos, da família dos gaviões.

Ciência - Primavera: O que é o equinócio, que marca o início da estação tão especial?



  • 23 setembro 2019

Já é primavera no hemisfério sul.

A estação de transição entre o inverno e o verão começa oficialmente nesta segunda-feira (23/09) e vai até o dia 22 de dezembro.
A sua chegada se deve a um fenômeno astronômico chamado Equinócio - quando a luz solar incide da mesma forma sobre os dois hemisférios, fazendo com que os dias e as noites tenham a mesma duração (12 horas cada).
Esse evento acontece duas vezes por ano - e dá início à primavera e ao outono.

A origem das estações do ano



Leva um ano para a Terra orbitar ao redor do sol e, ao fazer isso, nosso planeta também gira em torno do seu próprio eixo, movimento que leva 24 horas.
Se o eixo da Terra estivesse a 90° ou perpendicular ao plano de sua órbita, nosso planeta seria muito diferente.
O nascer e o pôr do sol aconteceriam na mesma hora todos os dias.
Também não teríamos estações do ano e haveria um grande impacto nos padrões climáticos em todo o mundo.
A razão pela qual isso não acontece é porque a Terra está inclinada a 23,5 graus em relação ao seu plano de órbita.
E é justamente essa inclinação que dá origem às estações do ano.
No verão, o planeta está mais inclinado em direção o sol e no inverno, mais afastado dele.

O que acontece no Equinócio?

Durante um equinócio, nenhum dos polos da Terra está inclinado em relação ao Sol - com isso, os raios solares incidem sobre a Linha do Equador, iluminando com a mesma intensidade ambos os hemisférios.
É por isso que a duração da luz do dia é teoricamente a mesma em todos os pontos da superfície da Terra.
Daí o nome equinócio, palavra derivada do latim, que significa "noites iguais".

Fonte: https://www.bbc.com/portuguese


Criadora do #MeToo francês é condenada por difamação após acusar homem de assédio

  • 25 setembro 2019

A mulher que começou a campanha para encorajar outras mulheres a expor assediadores sexuais na França foi condenada por difamação pela Justiça.
A jornalista Sandra Muller, que criou a campanha #balancetonporc ("denuncie seu porco", em tradução livre), versão francesa do movimento #MeToo, foi condenada a pagar danos morais ao ex-executivo de televisão Eric Brion.
A Corte Civil de primeira instância deu ganho de causa a Brion, que havia sido acusado de assediar Muller, e condenou a jornalista a pagar 20 mil euros (R$ 91,5 mil) em danos morais a ele.
Muller disse que vai recorrer.
"Hoje eu perdi, mas outras mulheres ganharam", disse ela nesta quarta, depois do anúncio da sentença.
Ela também foi condenada a apagar o post que fez no Twitter, em 2017, no qual acusava Brion de assédio, e a publicar em sua conta declarações de retratação que foram elaboradas pela Corte.
O advogado da jornalista, Francis Szpiner, disse que a sentença estava "ultrapassada".

Quais foram os argumentos?

Durante o julgamento, os advogados de Brion argumentaram que ele havia se desculpado pelos seus "flertes inapropriados" e que ele "nunca admitiu ter assediado ninguém".
"Ele disse que em uma noite tentou flertar com Sandra Muller porque ele gostava dela", disse a advogada Marie Burguburu. "Ele tem o direito de flertar."
Muller, que viajou dos EUA para o julgamento, disse que o incidente foi "humilhante" e fez com que ela "iniciasse um movimento que se espalhasse através de todos os níveis da sociedade".
Ela defendeu seu direito à liberdade de expressão e disse que seu posts tinham o objetivo de encorajar outras a compartilhar suas experiências. Afirmou também que insultos sexistas precisam ser levados a sério.
Brion disse que a "máquina" que Muller lançou com suas postagens era "imparável", e alegou que ele tinha sido vítima de "sérias repercussões" pessoas e profissionais graças às postagens.
Depois da notícia do processo de Brion, Muller escreveu no Facebook: "Eu vou até o fim dessa luta, e com ajuda do meu advogado espero que esse julgamento seja uma oportunidade para um debate real sobre como combater o assédio sexual."

Como isso foi parar na Justiça?

Em outubro de 2017, Muller fez um post no Twitter: "#balancetonporc! Você também pode contar dando o nome e os detalhes de um assédio sexual que você sofreu no seu trabalho."
Algumas horas depois, ela escreveu. "Você tem peitos grandes. Você é meu tipo de mulher. Vou fazer você gozar a noite toda", junto com o nome de Brion e seu cargo.
Mas Brion disse que nunca trabalhou com Muller, que se desculpou por suas palavras e que não insistiu depois de ter sido rejeitado.
O resultado da campanha nas redes sociais espalhou o nome de Brion e, em dezembro daquele ano, ele escreveu uma resposta no jornal francês Le Monde.
Ele disse que fez seus "comentários inapropriados" em uma festa, tarde da noite, "mas apenas uma vez" — e disse que não estava tentando justificar seu comportamento. Ele também disse que havia uma necessidade de "verdade e nuance" em meio à onda de acusações.
Ele acrescentou que Muller havia insinuado que ele tinha algum tipo de relacionamento de trabalho com ela no qual o assédio teria acontecido. Também sugeriu que ela tinha sido "intencionalmente vaga", fazendo com que houvesse uma confusão entre "paquera pesada e assédio sexual no local de trabalho". E que depois foi extremamente difícil para ele encontrar trabalho.
O advogado de Muller, Szpiner, disse à Corte, em maio, que "se você não acha que quando um homem chega para você e faz uma proposta dessa é ofensivo, sinto muito, mas a maioria das mulheres e homens hoje acha que é".
"Se a campanha fez sucesso é porque milhares de mulheres se identificaram com ela", disse ele, em um programa de televisão francês.

Fonte: BBC

"Alvorada, lá no morro, que beleza!!!"



Houve tempo em que os escritores, como ENEDINO BATISTA RIBEIRO (na obra Gavião-de-penacho – IHGSC + ALESC/Fpolis-SC/1990, vol. 1, p. 133), retratando seu "rincão", discorriam poeticamente sobre um certo lugar, assim:  

(...) o terreno se abria num vargedo amplo, formado de terras de aluvião, muito férteis, com lindas e excelentes lavouras (...)

E agora? Em Ratones também temos várzeas (antigamente a Vargem pequena era chamada Várzea de Baixo), onde, por exemplo, alguns poucos, como dona Sônia Jandiroba, insistem, valentemente, em aproveitar as terras.

Pois bem.: construir em topos de morro e em certas encostas, com declividade acentuada, é considerado crime ambiental, porque tais áreas são consideradas de preservação permanente - Código Florestal, art. 4 -, embora a música brasileira cante as belezas do morro com a frase da manchete acima e quem infringe a lei está sujeito: a) a pagar multa administrativa; b) a responder a um processo por crime contra o meio ambiente; c) a pagar indenização, por conta de ação civil pública movida pelo Ministério Público, dentre outras "aporrinhações".

Além de tais incômodos, "morar em morro é coisa de favelado e quem gosta de morro é cabrito", pensam muitas pessoas. 

Mas, desprezando-se as ameaças dos órgãos ambientais (porque um dos princípios mais valorizados do Direito é o da "primazia da realidade", que se impõe aos ideais dos legisladores, em qualquer campo), o negócio é fugir para as "eminências" (um nome mais nobre que o simples "morro"), seja um albardão, uma lombada, um outeiro, uma coxilha, uma cumeada, um tergo,  um topo. Vai valer tudo, para ficar longe de uma invasão de siris, caranguejos e goiás.

Minha irmã Idezia me fez lembrar que nem tudo é tão ruim no morro, com a música da Elis Regina ("Maria do Socorro"), cuja letra diz:  

"Maria do Socorro
Suas pernas torneadas
Pelas ladeiras do morro".
 


Taí:  as mulheres preocupadas com a estética teriam muito a ganhar. 

O problema, lá nas alturas, é ter que cantar também a "lata d'água na cabeça". 

Então, só nos resta debandar para a Serra.

Finalmente, vamos deixar de ser "caranguejos", como se dizia  dos portugueses, que não gostavam de interiorizar a colonização, mantendo-se, a todo custo, no litoral. 

Terá a turma que andou comprando terras nos condomínios de "serra-acima" tido uma antevisão profética do caos que se avizinha? 

Parece que sim. Foram mais espertos, porque agora a tendência será de os preços dispararem, com o aumento exponencial da demanda.

E a Capital, como ficará? Restrita aos morros? A saída será as palafitas,  ou casas flutuantes?  Afinal, aqui, não temos a "totora", como lá no Perú e as espigas de piteira não seriam suficientes para fazermos balsas.

Como se vê, a ideia de mudar a Capital para Curitibanos já não parece tão absurda, né? 

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Vamos à notícia:  

Aumento do nível do mar acelerou e já é incontrolável, advertem especialistas da ONU

IPCC prognostica uma multiplicação dos fenômenos extremos vinculados ao aquecimento dos oceanos

Imagem aérea de povoado da região de Kivalina, no Alascar, ameaçado pelo aumento do nível do mar.JOE RAEDLE (AFP)
Manuel Planelles

Nova York - 25 Sep 2019 - 10:42 BRT

É incontrolável e está se acelerando. O aumento do nível do mar disparou por causa do degelo nos extremos norte e sul do planeta, conclui o IPCC, o painel de cientistas que, sob o guarda-chuva da ONU, analisa os impactos da mudança climática geradas pela ação do homem. Os gases de efeito estufa emitidos pelo ser humano até agora fazem que o degelo e o aumento do nível do mar continuem além deste século, conclui o IPCC em um relatório apresentado nesta quarta-feira.


O dilema que esta geração enfrenta agora tem a ver com o tamanho da hipoteca —que também inclui fenômenos meteorológicos extremos mais frequentes, ameaça à segurança alimentar e impactos na biodiversidade— que deixará para as futuras gerações. Que seja uma carga menor, destacam os especialistas, dependerá da rapidez com que a humanidade pare de emitir esses gases que superaquecem o planeta e estão vinculados principalmente aos combustíveis fósseis. Ao apresentar o relatório, Hoesung Lee, presidente do IPCC, conclamou os países a reduzirem suas emissões de gases, para que os impactos, embora não possam mais ser eliminados, pelo menos sejam atenuados e se tornem "mais manejáveis para as pessoas mais vulneráveis". Porque, como destaca o IPCC, "as pessoas mais expostas e vulneráveis são frequentemente aquelas que contam com menor capacidade de resposta".

Esse dilema geracional, apresentado em um relatório especial do IPCC, chega numa semana intensa na batalha contra a mudança climática. Depois das gigantescas manifestações estudantis de 20 de setembro e da cúpula da ONU da última segunda-feira em Nova York, espera-se na sexta-feira um grande protesto global contra a inação frente ao aquecimento. O relatório especial do Painel Intergovernamental para a Mudança Climática sobre o aquecimento e os oceanos é parte de uma série de análise temáticas. Este grupo internacional de especialistas revisa e compila o conhecimento sobre a mudança climática partindo dos estudos científicos publicados. Nesta ocasião participaram mais de 100 autores de 36 países, que revisaram 7.000 publicações.

"O aumento do nível do mar se acelerou devido ao aumento combinado da perda de gelo das camadas da Groenlândia e da Antártida", conclui o estudo. A perda de gelo na Antártida por causa do aumento da temperatura no período entre 2007 e 2016 triplicou com relação à década anterior; na Groenlândia, duplicou.

Esse degelo acelerado levou a uma taxa de aumento do nível do mar também mais rápido, até 2,5 vezes mais veloz na última década em relação à média do século passado. Mas as projeções do relatório falam de um problema que se agravará, mesmo que seja cumprido o Acordo de Paris, que determina que o aumento médio da temperatura do planeta não deve superar os dois graus em relação aos níveis pré-industriais. No cenário mais otimista, com esse limite em dois graus estipulado em Paris, o IPCC prognostica um aumento do nível do mar de 43 centímetros até 2100 (entre 1902 e 2015 foi de 16 centímetros). No cenário mais adverso, em que as emissões continuem crescendo como até agora, a elevação do nível do mar chegaria a 84 centímetros e poderia superar um metro. Além disso, durante os próximos séculos esse ritmo continuará ganhando velocidade e intensidade.

A análise destaca os "perigos relacionados ao clima" que ameaçam as populações costeiras: ciclones tropicais, níveis extremos do mar, inundações e perda de gelo. E recorda que nas zonas costeiras baixas vivem atualmente cerca de 10% da população mundial (680 milhões de pessoas). Além disso, 65 milhões de outras pessoas habitam pequenos Estados insulares. E quase outros 10% da população (670 milhões) vivem em regiões de alta montanha, outra das áreas analisadas no relatório.
Aumento de eventos extremos

Esses quase 1,5 bilhão de indivíduos estão na zona vermelha dos impactos climáticos relacionados aos oceanos e à água. São impactos que ocorrem, por exemplo, pela combinação do aumento do nível do mar com tormentas ou ciclones. O relatório alerta que até 2050 "os eventos extremos do nível do mar", até agora considerados excepcionais, que costumavam ocorrer uma vez a cada século, irão se tornar habituais e ocorrerão "pelo menos uma vez por ano" em muitos lugares do planeta. "Especialmente em regiões tropicais", embora também em zonas como a mediterrânea. O IPCC prognostica, além disso, uma maior frequência das ondas de calor marítimas e dos eventos extremos do El Niño e La Niña.

O estudo analisa também as ações de adaptação (fundamentalmente investimentos) necessárias para enfrentar a elevação do mar, que pode engolir cidades costeiras. E explica que esses investimentos podem ser rentáveis para as áreas urbanas densamente povoadas (Nova York, por exemplo, tem um plano para investir dez bilhões em defesas). Mas é muito difícil que áreas rurais e mais pobres, como os pequenos Estados insulares, possam arcar com isso.

O problema não é só o aumento do nível do mar. Associados aos fenômenos meteorológicos há também a elevação da temperatura da água – que desde 1970 subiu sem cessar – e outros problemas decorrentes da mudança climática. A análise mostra que durante o século XXI os oceanos alcançarão "condições sem precedentes" pelo aumento da temperatura, uma maior acidificação e a diminuição do oxigênio. Isto terá um impacto, por exemplo, na pesca, o que afetará "os meios de vida e a segurança alimentar" das comunidades que dependem dos recursos marítimos para sobreviver.

"As populações de peixes se moverão em direção aos polos para localizar suas temperaturas preferidas; isto afetará particularmente os países tropicais em termos de pesca, mas na Europa vimos a cavala e o bacalhau já se afastando para o norte", explica por e-mail o professor de Biologia Alex Rogers, da Universidade de Oxford. "Os peixes também se tornam menores à medida que aumentam as temperaturas", acrescenta esse especialista, referindo-se aos efeitos para a indústria pesqueira.
Acidificação dos oceanos

Entre 20% e 30% do dióxido de carbono emitido pelo homem foi absorvido pelos oceanos desde 1980, algo que deverá aumentar durante este século. Ao absorver mais CO2 "o oceano experimentou uma crescente acidificação" e ocorreu "uma perda de oxigênio". "A mudança climática está impactando os oceanos não só no aumento do nível do mar", observa Gladys Martínez, membro da Associação Interamericana para a Defesa do Ambiente (AIDA). "O oceano está colapsando, e o tempo está se esgotando para nós", alerta esta especialista, que pede mais atenção também aos efeitos da perda de biodiversidade. O relatório do IPCC observa, por exemplo, o alto risco a algumas espécies e ecossistemas sensíveis, como os corais.
Impactos nas geleiras

A perda das geleiras também influi no aumento do nível do mar. Mas, além disso, tem consequências além das costas. Essa perda representa, segundo o IPCC, uma alteração da “disponibilidade e qualidade da água doce", que tem implicações na agricultura e na produção de energia hidrelétrica.

Outro dos fenômenos analisados é o desaparecimento do permafrost (a camada de solo permanentemente congelado) devido ao aquecimento. Os especialistas prognosticam que ele continuará diminuindo, e que isso, por sua vez, permitirá a liberação dos gases do efeito estufa que vinham sendo guardados nesse tipo de terreno.

Todas estas mudanças longe da costa levarão a um aumento significativo dos incêndios florestais durante o século XXI na maioria das regiões de tundra e boreais, e também em algumas regiões montanhosas, adverte o IPCC.

Fonte: EL PAIS

quarta-feira, 25 de setembro de 2019

VIDA DE CAMPO - A queimada como uma das atrações e "maravilhas" da lida campeira


ENEDINO BATISTA RIBEIRO – Gavião-de-penacho – IHGSC + ALESC/Fpolis-SC/1990, vol. 1, p. 102: 
Só para quem não nasceu, ou nunca viveu numa fazenda, nem nunca sentiu a paz bucólica de um sítio, quando o sol à tardinha vai se escondendo atrás dos montes e dourando a paisagem com o mágico reflexo de nuvens cor-de-rosa, só quem nunca viu uma queimada de campo, quem nunca assistiu a uma derrubada de roça, só quem nunca atirou um pealo, quem nunca viu como o caboclo destemido e garboso salta ao lombo de um potro xucro e sai ao léu pelas campinas, só quem nunca parou um rodeio e nunca assistiu a uma briga de touros, desconhecerá que a vida de campo é a melhor, a mais pura e bela, a mais divertida de todas!
A coisa é cultural e, assim como a farra-de-boi, dará muito trabalho para ser mudada. 
E, de outro lado, desconfio que as poderosas multinacionais que produzem "defensivos agrícolas", um nome bonito para os agrotóxicos, ou seja, Bayer-Monsanto, Syngenta, entre outras,  possuem muito interesse em combater os incêndios florestais, meio primitivo de controlar algumas pragas, porque ampliam suas vendas na mesma proporção em que o fogo não for mais usado. 

O assunto é muito complexo e inevitável perguntar: o que é mais desastroso para a humanidade: queimar as matas, ou pulverizar as lavouras e o gado de corte com venenos que irão para na barriga dos cidadãos do mundo? 
Com a palavra os cientistas. 
 

Medida desproporcional - Suspensa decisão que proibiu casal devedor de sair de município



25 de setembro de 2019, 16h10


A 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, em decisão liminar, suspendeu a proibição de viajar imposta a um casal do Rio de Janeiro que responde a ação de insolvência civil em razão de dívida superior a R$ 3 milhões. De forma unânime, o colegiado considerou que a medida coercitiva restringiu de forma desproporcional o direito fundamental de ir e vir.

"É profundamente lamentável a conduta do devedor, há mais de 13 anos protelando o andamento da insolvência. No entanto, penso que tal medida coercitiva é ilegal, uma vez que restringe o direito fundamental de ir e vir de forma desproporcional e não razoável", afirmou o relator do habeas corpus no STJ, ministro Luis Felipe Salomão.

O ministro destacou que, de acordo com o artigo 139, inciso IV, do CPC/2015, o juiz poderá determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento da ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária.

Apesar de constituir instrumento genuíno para assegurar o cumprimento do comando judicial, o relator ponderou que a medida de incursão na esfera de direitos do executado, especialmente direitos fundamentais, não terá legitimidade e configurará coação reprovável quando estiver vazia de respaldo constitucional ou previsão legal, e se não for justificável como defesa de outro direito fundamental.

Segundo ele, os doutrinadores reconhecem que, diante das inúmeras possibilidades de aplicação do artigo 139, IV, é sempre imprescindível avaliar a proporcionalidade da medida, considerando sua adequação e necessidade.

No caso dos autos, Salomão entendeu que a proibição de viagens gera embaraço à liberdade de locomoção, a qual deve ser plena, tendo em vista que a medida de coerção atípica exige demonstração de sua absoluta necessidade e utilidade, sob pena de atingir o direito fundamental constitucional.

Além disso, lembrou que o STJ tem precedentes no sentido de que a obrigação prevista pelo artigo 104 da Lei de Recuperação e Falência — ainda que essa lei pudesse ser aplicada ao caso de insolvência civil — não possui caráter de pena, visando, ao contrário, simplesmente facilitar o curso da ação falimentar, tendo como objetivo a presença do falido para prestar esclarecimentos e participar dos atos processuais.

O dispositivo legal, ressaltou o ministro, não veda a possibilidade de viajar para fora da comarca; apenas a condiciona ao preenchimento de alguns requisitos, como a existência de justo motivo, a comunicação expressa ao juiz e a constituição de procurador.

"Dessa forma, consubstancia coação ilegal à liberdade de locomoção a decisão judicial que estabeleceu a proibição de viajar para fora da comarca em que tramita o processo de insolvência civil, tendo em vista a evidente falta de proporcionalidade e razoabilidade entre o direito submetido (liberdade de locomoção) e aquele que se pretende favorecer (adimplemento de dívida civil), diante das circunstâncias fáticas do caso em julgamento" , concluiu o ministro. O mérito do habeas corpus ainda será julgado pela 4ª Turma. Com informações da assessoria de imprensa do STJ.

HC 525.378

Revista Consultor Jurídico, 25 de setembro de 2019, 16h10

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O entendimento do  TJ/SC não disrepa do adotado pelo STJ, senão vejamos: 

Apelação Cível n. 0014512-37.2013.8.24.0018, de Chapecó
Relatora: Desembargadora Maria do Rocio Luz Santa Ritta
   
AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA PARCIAL DE DÉBITO C/C PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA, PERDAS E DANOS, LUCROS CESSANTES E DANOS MORAIS. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. RECONHECIDA A APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. NECESSIDADE DE INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. TESE REJEITADA. DEVER DE AMBAS AS PARTES DE PRODUZIR TODAS AS PROVAS CABÍVEIS. DEMANDADAS QUE SE DESINCUMBIRAM DO ÔNUS DE COMPROVAR A LEGALIDADE DA COBRANÇA. IRREGULARIDADE DA RETENÇÃO DO VEÍCULO RECONHECIDA. AUTOTUTELA INAPLICÁVEL AO CASO. LUCROS CESSANTES. INADMISSIBILIDADE DE PRESUNÇÃO. AUSÊNCIA DE PROVAS. DANO MORAL. PESSOA JURÍDICA. AUSÊNCIA DE OFENSA À HONRA OBJETIVA DA EMPRESA. PRECEDENTES DESTA CORTE. RECURSO DESPROVIDO.
           Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0014512-37.2013.8.24.0018, da comarca de Chapecó (3ª Vara Cível) em que é Apelante Guindastes Cordenuzzi Ltda ME e Apelados Bianor Celuppi ME/BR Serviços Mecânicos e Eletrônicos e outro:
           A Terceira Câmara de Direito Civil decidiu, por unanimidade, conhecer do recurso de apelação e negar-lhe provimento. Custas legais.
           O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Marcus Tulio Sartorato, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Des. Fernando Carioni.
           Florianópolis, 3 de setembro de 2019.
Desembargadora Maria do Rocio Luz Santa Ritta
RELATORA
            RELATÓRIO
           Guindastes Cordenunzzi Ltda. ME ajuizou ação declaratória de inexistência parcial de débito cumulada com pedido de antecipação de tutela, perdas e danos, lucros cessantes e danos morais contra Bianor Celuppi ME/BR Serviços Mecânicos e Eletrônicos e BC Auto Peças e Serviços, alegando a cobrança em duplicidade de peças trocadas do motor do caminhão Volkswagem/35300, placa LYW9635, que ao apresentar problemas de funcionamento, foi encaminhado à oficina mecânica (primeira ré) para manutenção, tendo a segunda ré, parceira comercial da primeira, fornecido as peças necessárias ao conserto do veículo.
           O pedido liminar de reintegração de posse foi deferido (fls. 58/59) e o veículo devolvido a autora (fl. 67), regularmente processado o feito, foram apresentadas as alegações finais (fls. 193/196 e 200/206).
           Na sentença, o magistrado julgou improcedentes os pedidos iniciais, com fundamento no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, condenando a autora ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios, fixados em 15% (quinze por cento) sobre o valor da causa (fls. 207/211).
                 Inconformada, a autora, nas razões recursais, requereu a procedência dos pedidos iniciais para obter: 1 - a incidência do Código de Defesa do Consumidor, invertendo-se o ônus da prova; 2 - a declaração de inexistência do débito no valor de R$ 4.929,48 (quatro mil, novecentos e vinte e nove reais e quarenta e oito centavos); 3 - a indenização por lucros cessante e danos morais em quantia a ser fixada por esta Corte de Justiça.
                 Com as contrarrazões pela manutenção da sentença (fls. 232/252), vieram os autos conclusos.

  VOTO
           Trata-se de recurso de apelação cível interposto pela parte autora em face da sentença que julgou improcedentes os pedidos iniciais, e a condenou ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 15% sobre o valor da causa.
                 Em 09/05/2013, a apelante contratou com as apeladas o conserto do motor do caminhão e o fornecimento de peças para a realização dos reparos necessários, entre elas o kit de camisas, pistões e anéis. O caminhão voltou a trafegar no dia 23/05/2013, ocorre que, no dia seguinte à entrega o veículo apresentou problemas.
                 Procuradas, as apeladas encaminharam o veículo ao pátio da mecânica e, novamente abriram o motor, após a análise das peças foi constatada a falta de manutenção/retífica em um componente do motor. Uma terceira empresa (Retchap Retifica de Motores) foi contratada para prestação do serviço e, após devidamente realizado, o motor foi remontado, sendo necessária para tanto, a nova troca do kit de camisas, pistões e anéis.
                 Ao fim, pelos serviços prestados, as apeladas cobraram o valor de R$ 15.232,26 (quinze mil, duzentos e trinta e dois reais e vinte e seis centavos). No entanto, a apelante reconhece apenas o débito no valor de R$ 9.964,00 (nove mil, novecentos e sessenta e quatro reais), já depositado em juízo (fls. 39/40), aduzindo a cobrança irregular por duplicidade da importância de R$ 4.929,48 (quatro mil, novecentos e vinte e nove reais e quarenta e oito centavos).
                 1. Da aplicação do Código de Defesa do Consumidor com a inversão do ônus da prova.
           Convém esclarecer que às relações comerciais estabelecidas entre as partes, quais sejam, entre a empresa BC Auto Peças e Serviços e a autora, a compra e venda de produto e, entre a empresa Bianor Celuppi ME/BR Serviços Mecânicos e Eletrônicos e a autora, a prestação de serviço, incidem os ditames na norma consumerista.
           Assim se diz por que, conforme os artigos 2º e 3º do Código de Defesa do Consumidor, respectivamente, "consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final" e "fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços".
           No caso dos autos, é evidente que o serviço e os produtos fornecidos pelas empresas demandadas não integram à cadeia produtiva da demandante, o que já foi dito nesta Corte de Justiça, "a autora, do ramo de transporte de cargas e prestação de serviço, utiliza o veículo para atividades profissionais, por conseguinte, não há de se afastar a tese de destinatário final. Segundo a interpretação maximalista do CDC, pouco importa qual uso será dado ao bem, bastando que não haja finalidade de revenda." (TJSC, Apelação Cível n. 2014.043044-0, de Içara, rel. Des. Denise Volpato, Sexta Câmara de Direito Civil, j. 07-10-2014).
           No entanto, embora se reconheça a incidência do Código de Defesa do Consumidor ao caso, razão não assiste à apelante no que se refere à inversão do ônus da prova. O recurso previsto no artigo 6º, inciso VIII, do referido diploma, tem caráter procedimental, e não de julgamento.
           Em decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça, sob a relatoria do Ministro Mauro Campbell Marques, acerca da inversão do ônus da prova, prolatou-se que "a decisão que a determinar deve - preferencialmente - ocorrer durante o saneamento do processo ou - quando proferida em momento posterior - garantir a parte a quem incumbia esse ônus a oportunidade de apresentar suas provas". (AgRg no REsp 1450473/SC, Segunda Turma, julgado em 23/09/2014, DJe 30/09/2014).
           A referida decisão no corpo do acórdão esclarece que, ainda que a inversão se dê ao tempo da sentença, tal medida não prejudica o demandado, pois desde o início da lide ele, assim como o demandante, estão cientes da sua responsabilidade de comprovarem tudo aquilo que estiver dentro de suas possibilidades.
           Assim, observa-se que, independentemente da inversão do onus probandi, oportunizou-se às partes a produção de todas as provas cabíveis. Além disso, o indeferimento da prova pericial ocorreu em razão da inconteste alteração de status das peças do motor do caminhão, que já foram retificadas e por isso perderam as características que deveriam ser analisadas pelo perito, não se justificando a realização do ato.
           Em sendo assim, cumprindo a ré com o disposto no art. 373, inciso II, do CPC, esvazia-se a pretensão de inversão do ônus probatório.
           2. Da cobrança em duplicidade.
                 A apelante alega a cobrança indevida da quantia de R$ 4.929,48 (quatro mil, novecentos e vinte e nove reais e quarenta e oito centavos), sustenta que o valor se refere à cobrança em duplicidade da mão de obra e de um kit de peças do motor do caminhão (jogos de pistões, camisas e anéis) e, que o fato gerador da substituição das referidas peças, em um segundo momento, teria sido um defeito no produto, ou ainda, na execução do serviço realizado pela mecânica e, que jamais teria se comprometido com a contratação de serviços externos por conta própria.
                 As apeladas, por sua vez, alegam que a substituição do kit é fruto da negligência do representante da apelante, Sr. Danilo Cordenunzzi; esclarecem que na primeira vez em que o motor do caminhão foi aberto houve a constatação da necessidade da manutenção/retífica de algumas peças e, que o Sr. Danilo se responsabilizou pessoalmente pela contratação do referido serviço.
                 Com o retorno das peças, supostamente retificadas à mecânica, o motor foi montado e o caminhão entregue, voltando a apresentar problemas no dia seguinte. Após novamente aberto o motor, aferiu-se que um componente não havia sido retificado, conforme anteriormente afirmado pelo Sr. Danilo, o que foi admitido por ele quando confrontado. Por essa razão a empresa Retchap foi contratada para realização da retífica da peça (cabeçote), sendo necessária a substituição do kit de camisas, pistões e anéis, que foram danificados pelo desgaste do componente que não recebeu a devida manutenção.
                 É fato incontroverso nos autos que houve a troca das referidas peças por duas vezes, o que se discute é a razão de tal fato, se por ineficiência das rés na execução do serviço contratado, ou então, por negligência da autora quanto a realização de um reparo em outro componente do motor que garantiria o bom funcionamento daquelas peças, com a contratação sob sua responsabilidade.
                 Com efeito, como bem salientou o Magistrado condutor da lide na sentença objurgada, é temerário acolher a pretensão da autora, no sentido de desconsiderar parte dos valores cobrados pelas requeridas, pois as provas produzidas nos autos são insuficientes para comprovar que a substituição repetida das peças foi causada pela má prestação do serviço pelas rés.
                  Ademais, o exame dos autos, revela que a ordem de serviço (fl. 35) diz respeito à contratação do serviço terceirizado de regulagem da bomba junto à empresa Conda Comercial Eletro Diesel Ltda., pessoalmente pelo representante da apelante, Sr. Danilo Cordenunzzi, no dia 20/05/2013, ou seja, data anterior à primeira montagem do motor, o que foi confirmado pela testemunha Carlos Alberto Giotto, funcionário da empresa.
                 O que corrobora com a tese apresentada pelas apeladas, confirmada pelo depoimento das testemunhas Juliano Olivo Soldi e Neori Kranz, mecânicos da BC Auto Peças e Serviços, de que a apelante, representada pelo Sr. Danilo Cordenunzzi, responsabilizou-se pela contratação do serviço de manutenção/retífica de algumas peças do motor na primeira vez em que foi aberto para conserto.
                 E, ainda, às fls. 25/26 a demandada trouxe aos autos as notas de prestação de serviço da empresa Retioeste Retífica de Motores, que dizem respeito a serviços por ela contratados em data anterior à primeira montagem do motor, nas quais não se identifica a prestação do serviço de manutenção/retífica do cabeçote, componente que, de forma uníssona, devido há não correção do desgaste, foi citado pelas testemunhas como causador dos reiterados problemas, que resultou na necessidade do refazimento do serviço, com a consequente, substituição de peças já anteriormente trocadas pelas rés.
                 Observa-se, ademais, que o depoimento de Cesar Fabro, funcionário da empresa Retchap, esclarece sobre a impossibilidade de ser verificada a adequada realização da retífica do cabeçote, senão pela sua desmontagem, procedimento realizado na própria retífica, o que demonstra que não poderia o mecânico da demandada ter verificado a efetiva realização do serviço.
                 Ainda do que foi dito pelo funcionário da empresa Retchap, conclui-se que a tempo da primeira montagem do motor e entrega do veículo, realizada dia 23/05/2013, o "cabeçote" havia sido apenas limpo, não tendo recebido a manutenção devida, o que só foi acontecer quando o veículo voltou a apresentar problemas e foi encaminhado pela segunda vez à oficina mecânica.
           Portanto, extrai-se dos depoimentos prestados pelas testemunhas, que a causa da necessária substituição do kit de peças foram os problemas de funcionamento decorrentes da ausência de manutenção/retífica do "cabeçote", serviço que deveria ter sido contratado e realizado aos cuidados do Sr. Danilo Cordenunzzi.
           Logo, devidamente comprovada a ausência de culpa das demandadas na substituição das peças, que ocorreu por fato de responsabilidade da demandante, justificando-se a cobrança da integralidade do valor (R$ 15.232,26), ainda que tenha sido observada a cobrança dúplice de algum serviço ou produto, porque devidamente verificada sua necessidade e efetiva realização.
           Portanto, evidente que as rés/recorridas se desincumbiram do ônus que lhe competiam (art. 373, II, CPC), pois demonstraram, por meio de prova testemunhal idônea a regularidade da cobrança.
                 3. Da retenção do veículo como fato gerador de lucros cessantes e danos morais.
                 A sentença recorrida reconheceu a licitude da conduta das demandadas que diante de inadimplemento do conserto impediram a retirada do veículo de dentro do pátio da oficina mecânica, amparando-se no artigo 1.219 do Código de Processo Civil.
           É fato notório que a entrega do veículo às demandadas teve como objetivo único o seu conserto, sem que houvesse, desse modo, transferência de quaisquer dos direitos inerentes à propriedade, não estando autorizada, pois, a reter o veículo para cobrar eventual dívida.
           Dito isso, as demandadas na condição de contratadas para fornecimento de produto e prestação de serviço, não se enquadram na categoria de "possuidor de boa-fé", a qual se refere o dispositivo, que em casos excepcionais, autoriza a autotutela.
                 Ademais, em caso análogo, já se manifestou o Superior Tribunal de Justiça:
    RECURSO ESPECIAL. CIVIL. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. VEÍCULO. REPARO. SERVIÇO CONTRATADO. PAGAMENTO. RECUSA. DIREITO DE RETENÇÃO. CONCESSIONÁRIA. BENFEITORIA. IMPOSSIBILIDADE. POSSE DE BOA-FÉ. AUSÊNCIA. DETENÇÃO DO BEM.
    1. A controvérsia a ser dirimida no recurso especial reside em definir se a oficina mecânica que realizou reparos em veículo, com autorização de seu proprietário, pode reter o bem por falta de pagamento do serviço ou se tal ato configura esbulho, ensejador de demanda possessória.
    2. O direito de retenção decorrente da realização de benfeitoria no bem, hipótese excepcional de autotutela prevista no ordenamento jurídico pátrio, só pode ser invocado pelo possuidor de boa-fé, por expressa disposição do art. 1.219 do Código Civil de 2002.
    3. Nos termos do art. 1.196 do Código Civil de 2002, possuidor é aquele que pode exercer algum dos poderes inerentes à propriedade, circunstância não configurada na espécie.
    4. Na hipótese, o veículo foi deixado na concessionária pela proprietária somente para a realização de reparos, sem que isso conferisse à recorrente sua posse. A concessionária teve somente a detenção do bem, que ficou sob sua custódia por determinação e liberalidade da proprietária, em uma espécie de vínculo de subordinação.
    5. O direito de retenção, sob a justificativa de realização de benfeitoria no bem, não pode ser invocado por aquele que possui tão somente a detenção do bem.
    6. Recurso especial conhecido e não provido. (REsp 1628385/ES, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 22/08/2017, DJe 29/08/2017).
           Logo, com a devida vênia, a decisão se funda em incorreção no ponto, vez que irregular o exercício da autotutela com o objetivo de compelir a demandada a adimplir o débito decorrente da contratação dos serviços de manutenção do veículo.
           Embora reconhecida a irregularidade da retenção do veículo, não merece prosperar a pretensão da apelante quanto à percepção de lucros cessantes. Isso porque, não se ignora que o bem retido faça parte da frota de veículos utilizados pela autora para o desenvolvimento de suas atividades econômicas e, que tenha sido trazido aos autos dois orçamentos de empresas concorrentes que prestam o mesmo serviço (fls. 29/33).
           Contudo, os lucros cessantes não podem ser presumidos, para que ocorra a sua fixação deve existir a comprovação nos autos de forma contundente, não bastando à mera alegação da renda percebida. Nesse sentido, verifica-se que a requerente não demonstrou, de forma cabal, nenhum documento que levasse a crer na existência dos lucros cessantes, o que poderia ter sido feito por meio da apresentação de um balanço dos lucros obtidos com os serviços prestados pelo caminhão nos meses anteriores, ou ainda, comprovada a inexistência de outro veículo capaz de substitui-lo na empresa.
           Desta forma, diante da ausência de comprovação da perda efetiva e real, por parte da autora, não há falar em lucros cessantes.
                 Por fim, quanto ao dano moral, impede salientar, que não se desconhece a possibilidade da pessoa jurídica sofrer dano moral, tema inclusive sumulado pelo STJ (Súm. 227). Entretanto, para que seja possível a aludida indenização, é preciso que haja uma efetiva ofensa à honra objetiva da pessoa jurídica, ou seja, um ataque ao seu nome, algo que denigra sua reputação perante terceiros, como bem explicou o Min. Ruy Rosado de Aguiar (RSTJ 85/268, 4ª Turma do STJ, 9.8.1995):
    "Quando se trata de pessoa jurídica, o tema da ofensa à honra propõe uma distinção inicial: a honra subjetiva, inerente à pessoa física, que está no psiquismo de cada um e pode ser ofendida com atos que atinjam a sua dignidade, respeito próprio, auto-estima etc., causadores de dor, humilhação, vexame; a honra objetiva, externa ao sujeito, que consiste no respeito, admiração, apreço, consideração que os outros dispensam à pessoa. Por isso se diz ser a injúria um ataque à honra subjetiva, à dignidade da pessoa, enquanto a difamação é ofensa à reputação que o ofendido goza no âmbito social onde vive. A pessoa jurídica, criação de ordem legal, não tem capacidade de sentir emoção e dor, estando por isso desprovida de honra subjetiva e imune à injúria. Pode padecer, porém, de ataque à honra objetiva, pois goza de uma reputação junto a terceiros, passível de ficar abalada por atos que afetam o seu bom nome no mundo civil ou comercial onde atua."
           Sob tais premissas, conclui-se que a simples restrição indevida ao uso do veículo não configura, automaticamente, um constrangimento que resulte no dano moral em favor da pessoa jurídica supostamente lesada, uma vez que, para a configuração do abalo a sua honra objetiva, tal informação deve se propagar vinculada negativamente à imagem da apelante, de forma que atinja seu mercado de atuação e seus efetivos ou potenciais clientes.
                 Dessa forma, in casu, como prova do abalo à honra objetiva da pessoa jurídica, a autora deveria comprovar que a retenção do veículo maculou sua imagem, disseminando a ideia de má pagadora perante seus clientes.
                 Contudo, não é o que se observa, a autora não trouxe prova alguma da ocorrência de prejuízo ou ofensa a sua reputação. Ademais, não se pode olvidar que uma vez demonstrada a regularidade do valor cobrado pelas apeladas a título dos serviços efetivamente prestados à apelante, conclui-se que a inadimplência da apelante contribuiu para a retenção, ainda que ilegal, do veículo. Logo, inexistente o direito da apelada à indenização por danos morais.
                 Assim, imperiosa a manutenção da sentença de improcedência.
           Ante o exposto, nega-se provimento ao recurso.
                 Diante da integral rejeição do apelo, é devida a fixação de honorários recursais em favor do causídico das rés, os quais se arbitra equitativamente em 5% (cinco por cento) do valor da causa, a serem acrescidos ao montante já arbitrado em primeiro grau.

Gabinete Desembargadora Maria do Rocio Luz Santa Ritta