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quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

MUDANÇA DE JURISPRUDÊNCIA Contrariando STJ, TJ do Rio diz que é ilegal cobrar taxa por esgoto não tratado


A discussão em torno da legalidade da taxa de esgoto parece estar longe do fim. Em um acórdão recente, a 11ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro condenou a Companhia Estadual de Águas e Esgotos (Cedae) a devolver as tarifas pagas ao longo de 10 anos por um cidadão que nunca recebeu a adequada contraprestação do serviço público — no caso, a coleta, o transporte e o tratamento dos dejetos no bairro onde mora.
A decisão, porém, contraria entendimento pacificado pelo Superior Tribunal de Justiça, em 2013, após julgar um recurso repetitivo. Na ocasião, a 1ª Seção da corte autorizou a cobrança mesmo quando a concessionária não cumpre todas as etapas do serviço de saneamento básico.
Na ação, o autor, que mora no bairro de Magalhães Bastos, na zona oeste do Rio de Janeiro, contou que “seu imóvel não dispõe de coletor público de esgotos sanitários, mas apenas de galerias pluviais onde é despejado o esgoto, tornando impossível a coleta, o transporte e o tratamento dos dejetos”. No entanto, a despeito da inexistência do serviço, ele pagou uma taxa de aproximadamente R$ 100 por quase uma década.
A primeira instância julgou a ação improcedente, e o autor recorreu. Na 11ª Câmara Cível do TJ-RJ, o caso foi relatado pelo desembargador Cláudio de Mello Tavares, que constatou que o serviço prestado pela Cedae não atendia todas as etapas previstas na Lei 11.445/2007, que estabelece as diretrizes do saneamento básico.
O desembargador lembrou que, pelo Código de Defesa do Consumidor, a remuneração das concessionárias de serviços públicos ocorre por meio da cobrança de taxas. Contudo, nesse caso, o pagamento não se mostra razoável, pois a empresa ré não tem prestado o serviço de forma adequada.
“Todo aquele que se dispõe a exercer alguma atividade no mercado de consumo tem o dever de responder pelos eventuais danos, por vícios ou defeitos, dos bens e serviços fornecidos ao mercado. Não se vislumbra plausível que, em se tratando de prestação de serviço público, sobre o qual a legislação consumerista exige eficiência, tal requisito seja dispensado no caso do esgoto, que envolve serviço essencial e que atinge diretamente a saúde e a dignidade das pessoas, bem como o direito a um meio ambiente equilibrado”, afirmou.
A decisão de Tavares, contudo, não se limitou apenas à questão consumerista. Ele também chamou a atenção para a inobservância da legislação ambiental — aspecto que não foi tratado pelo STJ e poderia levá-lo a reavaliar a validade da cobrança. A decisão é do fim do ano passado e ainda está sujeita a recursos.
O desembargador destacou que a “falta de tratamento do esgoto e seu lançamento in natura no corpo hídrico da região compromete todo o ecossistema da região, acarreta prejuízos à saúde dos munícipes e contraria a Constituição Federal, que dispõe sobre o direito dos cidadãos a um meio ambiente ecologicamente equilibrado”.
Por isso, na avaliação do desembargador, “a questão ultrapassa o necessário saneamento básico, alcançando o direito fundamental à saúde dos cidadãos e à garantia do mínimo existencial”.
“Ante a precariedade do serviço prestado pela concessionária de serviço público, que acarreta diversos transtornos ao autor como usuário do serviço e que compromete a saúde e o meio ambiente”, Tavares julgou “descabida a cobrança até que se torne efetivo o serviço de esgotamento” e “devida a devolução de forma simples dos valores indevidamente cobrados”. O voto foi seguido por todos os integrantes da 11ª Câmara Cível.
Questão econômica
Proferida em 2013, a decisão do STJ de autorizar a taxa de esgoto mesmo quando a concessionária não cumpre todas as etapas do saneamento básico levou em consideração uma questão econômica.
Na ocasião, o ministro Benedito Gonçalves defendeu que a legislação dá suporte à cobrança, já que a lei não deixa claro que o serviço de esgotamento sanitário deixou de existir porque a concessionária não entregou apenas uma etapa do tratamento.
Ainda de acordo com o ministro, a lei também não proíbe a cobrança da tarifa por causa da prestação de apenas uma ou algumas dessas atividades. Na avaliação de Gonçalves, o entendimento em contrário poderia inviabilizar a prestação do serviço pela concessionária, em prejuízo de toda a população.
Apesar do entendimento do STJ, que por ter sido firmado no julgamento de um recurso repetitivo deve ser aplicado pelas demais instâncias do Judiciário, o TJ-RJ tem acumulado decisões em sentido contrário. Uma delas é da 22ª Câmara Cível, que também proibiu a cobrança depois de apreciar a legalidade da taxa do ponto de vista da legislação ambiental.  
Clique aqui para ler a decisão. 
Processo 0173960-09.2011.8.19.0001

 é correspondente da ConJur no Rio de Janeiro.

Revista Consultor Jurídico, 23 de fevereiro de 2016, 14h23

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