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quarta-feira, 12 de abril de 2017

MP apura irregularidades de condomínios em zona rural de Rancho Queimado

Seis ações civis públicas foram instauradas e a cada depoimento um novo condomínio é denunciado em efeito cascata. A estimativa é de que o município tenha 40 condomínios, mas uma parcela está regular

MICHAEL GONÇALVES, FLORIANÓPOLIS 
11/04/2017 10H00 - ATUALIZADO EM 10/04/2017 ÀS 20H47


Estimativa é de que o município tenha 40 condomínios, mas uma parcela está regular - Flávio Tin/ND


O sonho da casa no campo com lago para passear de Jet Ski, clube gourmet, cinema e anfiteatro, entre outras promessas, virou um pesadelo para algumas famílias que compraram chácaras e sítios nos ditos condomínios rurais, em Rancho Queimado. À distância de 60 quilômetros de Florianópolis, a explosão imobiliária no município de 2.600 habitantes levou um morador a denunciar ao MP (Ministério Público), que encontrou irregularidades no parcelamento do solo em pelos menos seis empreendimentos, sendo que alguns também com o dano ambiental. A estimativa do MP é de que o município tenha 40 condomínios.

Ações civis públicas foram ajuizadas com o pedido de anulação dos registros imobiliários em alguns dos casos. A funcionária pública Vanúcia Balestra Gattiboni, 39, foi uma das vítimas que compraram um lote residencial em zona rural. Ela adquiriu um imóvel no empreendimento Village da Montanha Construções e Incorporações, que foi planejado para ter quatro condomínios, mas após o processo foram concluídas apenas duas vilas (“Villa do Prado” e a “Villa da Cachoeira”), com respectivamente 172 e 178 lotes residenciais vendidos como se fossem chácaras e sítios.

Segundo a promotora da comarca de Santo Amaro da Imperatriz, Cristina Thomé, o que acontece é a implantação de loteamentos com fins urbanos em zona rural. “Desde a Lei n.º 6.766/79, não pode mais ser autorizada a implantação de loteamento para sítios ou chácaras de recreio na zona rural. Os lotes contêm áreas entre 700m² a 2.000m², quando o módulo rural de Rancho Queimado é de três hectares (30.000m²). Além disso, a autoridade administrativa deixou de exigir o indispensável EIA/RIMA (Estudo de Impacto Ambiental) para a aprovação do projeto, afrontando as normas de proteção ambiental”, relatou em despacho na ação contra o Villa da Cachoeira.

A emissão dos alvarás de construção e as matrículas estavam bloqueadas por ordem judicial até o dia 3 de abril deste ano, quando o juiz Clóvis Marcelino dos Santos comunicou a prefeitura e o cartório de imóveis sobre a decisão do Tribunal de Justiça em liberar as permissões de construir e de vender os imóveis, com a devida anotação da Ação Civil Pública em curso. Mesmo assim, o magistrado determinou que o município continue fiscalizando e exercendo o poder de polícia.

Promotora aponta as manobras do empreendedor

A promotora da comarca de Santo Amaro da Imperatriz, Cristina Thomé, aponta na ação a manobra do empreendedor para burlar a exigência legal de elaboração do EIA/RIMA no caso do Village da Montanha. Isso porque terrenos com menos de 100 hectares não têm a necessidade de realizar o estudo de impacto ambiental. Assim, a promotora demonstra que uma parte do terreno de 6 milhões m² (matrícula n.º 18.047) foi fracionado em duas vilas sob as matrículas 18.994 e 18.676.

“O município de Rancho Queimado aprovou, de forma ilegal, o projeto de parcelamento do solo para fins urbanos, em zona rural, da gleba vizinha confrontante. Ocorre que o imóvel que deu origem ao Villa da Cachoeira e ao Villa do Prado são contíguos e originaram-se de processo de desmembramento do registrado sob matrícula nº 18.047, adquirido pela Quarter, o que evidencia que houve o fracionamento de um grande empreendimento com o nítido propósito de burlar a exigência de elaboração do EIA/RIMA prevista no Conama (Conselho Nacional de Meio Ambiente)”, esclarece.

A área de mais de 6 milhões m² foi comprada pela Quarter Empreendimentos Imobiliários, responsável pelo Village da Montanha, em 2007. O terreno era uma plantação de pinus.


Infraestrutura prometida não saiu do papel

A funcionária pública Vanúcia Balestra Gattiboni pagou a vista pelo lote de 700 m² e conseguiu construir a sua residência. A promessa é de que o condomínio tivesse toda a infraestrutura de lazer: com nascentes e açudes para a pesca amadora, espaços para cultura, lagos e piscinas térmicas. Atualmente, ela é síndica do Villa da Cachoeira e os proprietários também entraram com uma ação contra o empreendimento cobrando as promessas no momento da venda.

“Era o meu sonho morar em meio a natureza com toda a infraestrutura. Em determinado dia fomos surpreendidos com a ação e o bloqueio das matrículas. Durante um período ninguém pode vender. A prefeitura também não libera novas construções e alguns proprietários não querem se incomodar. Os moradores do Villa da Cachoeira cobram as infraestruturas prometidas e que nunca saíram do papel”, desabafa.

Vanúcia conta que algumas das obras não devem ser entregues. Isso porque elas estavam planejadas nos locais das vilas que não foram construídas, mas que a Quarter Empreendimentos começou a vender em lotes de 30 mil m² como prevê a legislação para área rural. Mesmo assim, o comprador deve ter a finalidade agrícola para ocupar o imóvel.


Prefeitura estuda reforma do plano diretor e código de obras e posturas

A assessora jurídica da prefeitura de Rancho Queimado, Natália Sens Diniz Sell, informou que a prefeitura trabalha na reforma do plano diretor e do código de obras e posturas. O município fica entre a situação de cumprir as leis e na expectativa de continuar ou ampliar a receita com o recebimento do IPTU.

“Estamos acompanhando os processos e todos os empreendimentos que estão com restrições, os proprietários não conseguem retirar o alvará para construir. A nossa prioridade neste ano é aprovar o projeto de reforma do plano diretor e o código de obras e posturas, que foi rejeitado na última sessão da câmara em 2016. Não são todos os condomínios de Rancho Queimado, mas a maioria. Com essas mudanças, uma grande parte estará regular”, explica Natália.

O município está trabalhando em porceria com a Fecam (Federação Catarinense dos Municípios) para solucionar os problemas.


Contrapontos da Fatma e do ex-oficial do cartório

Na época, a Fatma (Fundação do Meio Ambiente) emitiu uma simples certidão de conformidade ambiental, quando deveria proceder o licenciamento ambiental. A fundação alegou que “quando da expedição da certidão em agosto de 2007, a normativa do Consema (Conselho Estadual de Meio Ambiente), que orientava os licenciamentos ambientais no âmbito de Santa Catarina, não previa o licenciamento ambiental da atividade condomínio em área rural, portanto, de acordo com a normativa vigente a época a certidão emitida pela Fatma.”

O oficial do cartório de registro de imóveis a época, Sandro Vidal, ex-prefeito de Santo Amaro da Imperatriz, também é réu no processo por ter “efetuado o registro do empreendimento no foro imobiliário mesmo sabendo que tal registro era ilegal na forma requerida”, segundo o Ministério Público. “A instrução normativa 17b do Incra e as leis municipais permitiram os registros imobiliários e os desmembramentos”, justificou.


Contraponto oficial

O escritório do advogado Marcus Vinícius Motter Borges defende dois empreendimentos em Rancho Queimado: Village da Montanha e Santa Rita Golf Club. Cada um desses tem dois condomínios. O defensor afirma que boa parte das ações são iguais, com o núcleo comum sendo as supostas ilegalidades urbanísticas (prefeitura) e registrais (registro de imóveis). Em alguns casos, ele afirma que há o questionamento de suposto dano ambiental.

“Na época não tinha lei municipal para a implantação do condomínio, tanto que houve um parecer do procurador do município. O registrador também ficou em dúvida e mandou para o Ministério Público, que disse que não tinha nada a se opor. Todos os projetos foram aprovados e executados a partir de 2010 com base em leis federais, do parcelamento de solo e de condomínios. A instrução normativa 17b do Incra, de 1980, prevê que áreas em zona rural, mas que já perderam as características rurais, o proprietário pode requerer a declaração das perdas dessas características. Assim, essas declarações foram feitas no Incra em todas as áreas, porque não havia plantação ou criação de animais, e os terrenos começaram a recolher o IPTU”, justifica.

Marcus informa que a Fatma emitiu uma certidão, porque não existia uma previsão em legislação estadual a época. “Nossa preocupação é quanto a insegurança jurídica que o Ministério Público está causando. Empreendimentos com todos os documentos aprovados e anos depois são questionados. Além disso, temos manifestações do desembargador Sérgio Luz e do procurador Paulo Cezar de Oliveira que não encontraram ilegalidades ou dano ambiental nos autos do processo”.

O advogado informou que pela decisão judicial as construção estão liberadas. “O embargo do MP atrapalhou o fluxo de vendas e de recursos. Os empreendimentos estão consolidados e com a retomada das vendas as áreas comuns poderão ter a continuidade de suas construções. O empreendedor vai cumprir com todas as previsões do projeto”, encerra.

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