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segunda-feira, 24 de junho de 2019

Dano moral - Moradores pagarão R$ 15 mil a síndica ofendida por ser homossexual


23 de junho de 2019, 15h40

Por Jomar Martins


A responsabilidade civil independe da criminal. Por isso, pode ser reconhecida mesmo que o alegado ato ilícito não tenha gerado condenação penal ao acusado. Com esse entendimento, a 10ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul reformou sentença que negou dano moral e o consequente pagamento de indenização a uma síndica hostilizada por sua orientação sexual.

Vítima de injúria, difamação e discriminação sexual, ela receberá R$ 15 mil, reparação a ser paga, solidariamente, por dois condôminos, que ligaram a suposta má administração do condomínio à homossexualidade da síndica. Segundo os autos, eles se referiam à autora como ‘‘machorra’’, ‘‘mulherzinha’’, ‘‘filha da puta’’, ‘‘bosta’’ e ‘‘ladrona’’, insinuando desvio de dinheiro.

Na ação indenizatória, a autora contou que, desde que se mudou para o condomínio, vem sofrendo com a conduta discriminatória de alguns moradores, embora de maneira velada. Disse que, depois que assumiu a função de síndica, a discriminação sexual passou a ser mais acentuada, especialmente por parte de três moradores, insatisfeitos com sua atuação. Afirmou que os boicotes, as ofensas e as atitudes discriminatórias não só a impediram de implementar algumas mudanças de gestão como ainda lhe causaram abalo psicológico, tanto que desenvolveu quadro depressivo.

No primeiro grau, a 1ª Vara Cível do Foro Central da Comarca de Porto Alegre julgou a indenizatória totalmente improcedente. O juiz Sylvio José Costa da Silva Tavares entendeu que os crimes contra a honra só têm repercussão na área cível, ressalvadas as excepcionalidades, se antes houver a responsabilização penal. Assim, no caso dos autos, se houvesse injúria, difamação e discriminação sexual, como afirmado na inicial, a autora deveria ter apresentado a respectiva queixa-crime na polícia.

‘‘Contudo, inexiste notícia de que a demandante [a autora] tenha promovido a ação penal privada. Desinteressando-se a parte autora pela repercussão principal que se daria na esfera criminal, tenho que não se legitima a reparação na esfera cível. Não fosse apenas isso, a prova produzida nos autos pela parte autora não foi suficiente à comprovação da versão inicial’’, definiu o julgador.

Esferas independentes
O relator da apelação na 10ª Câmara Cível do TJ-RS, desembargador Paulo Roberto Lessa Franz, reformou o julgado, por entender que a responsabilidade civil, nos termos do artigo 935 do Código Civil, independe da criminal. Além disso, ele considerou que a prova oral colhida na instrução processual corrobora a inicial, evidenciando a conduta preconceituosa de dois dos três réus arrolados na ação.

Conforme o voto de Franz, a autora deixou consignado em ata da assembleia geral do condomínio que estava se afastando do cargo de síndica por, nas palavras dela, não estar ‘‘mais conseguindo dar andamento ao [...] trabalho em função de comportamento hostil de um grupo de condôminos”, os quais tornaram inviável a administração ‘‘em função de homofobia, calúnias e difamação”.

Também ressaltou o teor dos depoimentos de funcionários, que confirmaram o uso de palavras agressivas e preconceituosas contra ela. Um dos réus, segundo testemunha, chegou a dizer que a autora, “por ser machorra, não estava fazendo um bom trabalho”.

Para o relator, a palavra ‘‘machorra’’ carrega preconceito e nítido conteúdo pejorativo, causando humilhação e ‘‘imensurável abalo’’ à honra e à imagem da autora, bens personalíssimos merecedores de proteção jurídica (artigo 5º, inciso X, da Constituição).

‘‘Ademais, eventuais divergências existentes entre os moradores quanto à administração do condomínio, e até mesmo eventual má gestão por parte da síndica — o que sequer está sendo discutido na presente demanda — não justificam, de modo algum, o comportamento preconceituoso dos réus’’, afirmou.

Processo 001/1.16.0011552-8 (Comarca de Porto Alegre)

 é correspondente da revista Consultor Jurídico no Rio Grande do Sul.
Revista Consultor Jurídico, 23 de junho de 2019, 15h40

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